Contactada pela Lusa, a Associação Portuguesa das Empresas dos Setores Térmico, Energético, Eletrónico e do Ambiente (APIRAC) considera que foi um passo atrás, alegando que, “ao acabar com as auditorias obrigatórias e com a figura do técnico responsável que garantia manutenção periódica dos sistemas”, perde-se a garantia de qualidade para quem usa esses espaços.

“Os técnicos que faziam esta verificação encontravam, além de’ legionella’, outros poluentes como o radão. E na altura de revalidar o certificado energético dos edifícios havia inclusive irregularidades que podiam ser corrigidas”, reconhece o secretário-geral da APIRAC, Nuno Roque.

Até dezembro de 2013, quando a nova legislação entrou em vigor, edifícios como escolas, centros desportivos, lares, hospitais e clínicas eram alvo de auditorias obrigatórias de dois em dois anos, enquanto em centros comerciais ou edifícios de escritórios a periodicidade era de três em três.

Estas fiscalizações eram garantidas por técnicos certificados pela Agência para a Energia (ADENE), que viu a nova legislação centrar as suas competências apenas na eficiência energética dos edifícios.

Daí para a frente, as auditorias obrigatórias deixaram de existir, a responsabilidade de controlar a qualidade do ar interior passou para os proprietários dos edifícios e a Inspeção-Geral da Agricultura, do Ambiente, do Mar e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) ficou com a responsabilidade de verificar se todos cumprem as regras.

Questionada sobre quantas fiscalizações foram feitas desde a entrada em vigor da nova lei e quantas multas foram aplicadas, a IGAMAOT não respondeu.

Em declarações à Lusa, o secretário-geral da APIRAC, Nuno Roque, considera que não só as auditorias obrigatórias devem regressar, para melhorar a lei atual, como deveria igualmente regressar a figura “dos técnicos responsáveis pelo funcionamento dos sistemas e pela monitorização periódica”.

“Este técnico respondia diretamente ao dono do edifício e tinha de implementar o plano de manutenção e acompanhar as ações de manutenção periódicas definidas na lei. Isto além das auditorias obrigatórias”, afirmou.

“Deveriam manter-se os índices [de poluentes] que estão estabelecidos na nova lei, que é agora mais forte a esse nível, mas recuperar os técnicos responsáveis pelo funcionamento [dos sistemas], tal como as auditorias obrigatórias”, defende Nuno Roque.

Para o responsável, “ao ter-se aligeirado [a lei] nas auditorias e inspeções é como se o que foi ganho no rigor da definição destes parâmetros não existisse. Este acréscimo de exigência perde-se do ponto de vista real porque deixou de haver um real apuramento de responsabilidade”.

Nuno Roque critica igualmente o facto de a lei ter deixado a responsabilidade sobre os proprietários dos edifícios.

“Agora não há pressão, não havendo pressão — é natural e nós somos humanos -, como temos de gerir orçamentos, há uma afetação [destas verbas] a outras áreas que importa resolver”, acrescentou.

Governo só reconheceu necessidade de voltar às auditorias obrigatórias após surto de legionella

O Ministério do Ambiente só depois do surto de 'legionella' no Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, é que reconheceu a necessidade de fazer regressar as auditorias ao ar interior dos edifícios, que acabaram há quatro anos.

Após o surto de 'legionella', que matou cinco pessoas e infetou no total 56, o ministro do Ambiente anunciou que o Governo prepara, entre outras matérias, o regresso das autorias obrigatórias, reconhecendo lacunas na lei, uma posição diversa daquela que tinha manifestado em agosto, numa resposta enviada ao parlamento.

Na missiva, o Ministério do Ambiente considerava que a legislação atual era suficiente para garantir a qualidade do ar interior dos edifícios, afastando a hipótese de retomar das auditorias obrigatórias, cuja importância acabou agora por reconhecer.

A comunicação do Ministério foi enviada ao grupo parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), que tinha questionado em fevereiro o Governo sobre os passos que tinham sido dados após a aprovação, pela Assembleia da República, em 2016, do regresso das auditorias obrigatórias.

Na resposta, o gabinete do ministro João Matos Fernandes afirmava: "o atual quadro legal enquadra-se nos requisitos para a fiscalização e prevenção da qualidade do ar interior".

O gabinete do ministro do Ambiente recordava ainda na resposta enviada ao BE todos os parâmetros introduzidos com a nova legislação, dizendo que, tal como está, a lei é suficiente para garantir a qualidade do ar interior dos edifícios.

Dois meses mais tarde, depois do surto de doença dos legionários no Hospital São Francisco Xavier, o ministro João Matos Fernandes acabou por reconhecer a importância destas auditorias, ao anunciar que o Governo pretende criar sanções e regras mais apertadas no controlo da qualidade do ar interior e nas torres de refrigeração.

João Matos Fernandes disse ainda que pretende auditorias com prazos mais curtos, relativamente à qualidade do ar interior, e sanções para "entidades públicas ou privadas" que não cumpram com normas nos edifícios ao seu cargo.

Questionado pela Lusa sobre esta mudança de posição, o Ministério não respondeu.

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