Fátima entrou no mapa da religião e da devoção com as aparições de Nossa Senhora aos três pastorinhos, entre maio e outubro de 1917. Desde aí, o Santuário, onde foi construída primeiramente uma pequena capela, atrai milhões de peregrinos todos os anos.
Se a Cova da Iria é conhecida como o Altar do Mundo, o facto é que há um bocadinho de Fátima noutras geografias. E, em breve, também em mais uma região do Brasil: está a ser construída uma réplica da Capelinha das Aparições em João Pessoa, no estado da Paraíba.
"O Nordeste do Brasil começou a conhecer mais sobre Fátima a partir da visita da Imagem Peregrina de Fátima na década de 50. Foi uma passagem rápida, porém muito significativa para o nosso povo nordestino", conta ao SAPO24 José Eudes Lima, diretor do movimento da Imaculada do Nordeste do Brasil e um dos responsáveis pelo processo de construção da Capelinha.
Assim, para o que agora se quer fazer é essencial esse marco no passado. "Essa época ficou marcada pela visita da Senhora vestida de branco. Passava somente nas cidades e quem morava no interior andava horas a pé para a ver e nela depositar a nossa espera por dias melhores", refere, lembrando principalmente pedidos devido "às dificuldades, como falta de água em algumas regiões, estradas de barro muito ruins, poucas escolas, etc."
"O tempo passou, templos foram erguidos em sua honra, tivemos mais chuvas e muitas coisas evoluíram. A devoção a Nossa Senhora de Fátima cresceu muito, não há casa cristã que não tenha 'um santinho' de Nossa Senhora de Fátima na parede ou numa mesa", recorda.
"Durante a oração do santo terço veio-me a frase 'se não podemos ir a Fátima, Fátima vem até nós'"
Por isso, não foi estranho quando, em 2013, se juntou "um pequeno grupo de pessoas para rezar o santo terço e também estudar a mensagem de Fátima". Mas José nunca pensou que o "grupo iria crescer e dar frutos". "Em dois anos, pessoas de paróquias diferentes também adotaram a mesma ideia. Então unimo-nos e criámos o grupo da Imaculada, conhecidos como servitas da Imaculada", recorda.
O tempo foi passando e a ideia de criar uma réplica da Capelinha das Aparições surgiu mais recentemente, em 2019. "Durante a oração do santo terço veio-me a frase 'se não podemos ir a Fátima, Fátima vem até nós'. Então começámos a rezar por esta intenção, construir uma réplica da Capelinha, local onde tudo começou", conta José.
Nessa altura, havia muitas dúvidas. Onde seria possível construir este espaço? Com que dinheiro? A tarefa começava a parecer hercúlea, mas era preciso não desistir logo no ponto de partida. O ano passado, a 13 de maio de 2023, as respostas começaram a desenhar-se depois de "uma conversa com alguns membros da comunidade Casa da Paz em João Pessoa, na Paraíba".
José dizia-se "movido por impulso e esperando um não", mas arriscou e falou sobre o seu "sonho". "Logo de caras a comunidade disse que cedia o terreno para a construção, que seria uma alegria acolher esta graça".
"O Santuário, a nosso pedido, ajudou-nos enviando a planta da capelinha original"
O passo seguinte seria falar com o Santuário de Fátima, para que em Portugal soubessem do que acontecia no Brasil. "Confesso que escrevi sem muita expectativa ao reitor do Santuário de Fátima, o Pe. Carlos Cabecinhas, relatando todo o nosso trajeto e o sonho de trazermos Fátima ao nosso povo nordestino. Na manhã do dia 22 de maio, dia de santa Rita de Cássia [padroeira das causas impossíveis], recebi uma resposta muito positiva do reitor, que acolheu a ideia e disse que contasse com as suas orações para este projeto".
"O Santuário, a nosso pedido, ajudou-nos enviando a planta da capelinha original e, com base na mesma, iremos construir tal qual esta lá na Cova da Iria. As mesmas medidas, o mesmo formato, tudo como esta lá. Afinal, não poderia ser diferente. Se não podermos ir a Fátima, Fátima vem até nós", conclui.
O que é preciso para construir uma réplica da capelinha?
Patrícia Duarte, diretora do gabinete de comunicação do Santuário, explica ao SAPO24 que é responsabilidade de Fátima "autorizar a construção de réplicas da Capelinha das Aparições, sem que isso signifique qualquer outro compromisso da parte deste Santuário".
"Temos clara consciência de que Brasil é o país com mais devotos de Nossa Senhora de Fátima e são sempre muitas as iniciativas dos seus devotos. O Santuário de Fátima acompanha com a sua oração aqueles que se dedicam à difusão da mensagem de Fátima, desde que isso seja feito na plena comunhão da Igreja, com o conhecimento e a concordância dos Bispos", refere.
No entanto, adianta que "o Santuário de Fátima nunca promoveu a construção de réplicas da Capelinha das Aparições. Sempre entendemos que o grande sinal da devoção a Nossa Senhora de Fátima e da sua mensagem é a sua imagem (escultura). Porém, quando é pedido ao Santuário a autorização para a construção de réplicas da Capelinha das Aparições, damos a necessária autorização, desde que o pedido seja formulado diretamente pelo Bispo da Diocese em causa. Sem o pedido do Bispo e a sua total concordância, não podemos autorizar. Quando damos autorização, facultamos também as dimensões da Capelinha original, para a construção da réplica".
Mas há um aspecto que será diferente no Brasil: o "alpendre", como chamado no país, "que guarda a Capelinha das chuvas e do sol que é muito quente", justifica José Eudes. Nesse sentido, "os arquitetos fizeram um projeto semelhante ao que esta em Fátima", para proteger o espaço onde "haverá missas, orações, palestras e muitas coisas, sempre em aprofundamento da mensagem de Fátima".
"Só se poderia replicar a cobertura com a autorização do arquiteto autor do projeto"
Segundo o Santuário de Fátima, esta mudança no projeto surge por uma questão de autorizações. "A autorização que damos é para a edificação de réplicas da Capelinha original, que tem mais de um século. A sua atual cobertura data dos anos oitenta do século XX. Antes, houve outro tipo de coberturas e, certamente, no futuro, outras haverá. Só se poderia replicar a cobertura com a autorização do arquiteto autor do projeto e do Santuário simultaneamente, mas não vemos nada que justifique que se façam réplicas dessa cobertura".
Reunir esforços para ajudar o Nordeste
Ultrapassadas as questões burocráticas, é agora tempo de arregaçar as mangas e colocar mãos à obra — e angariar dinheiro. Para isso, José Eudes explica que vai acontecer "a primeira Jornada Mariana pelo Nordeste" já este ano.
"Estamos numa grande batalha, mas confiantes na Providência"
"Da mesma forma que a Virgem Peregrina veio na década de 50, estamos trabalhando para levar uma Virgem Peregrina, parecida com a que veio visitar-nos, a todo o Nordeste, começando no dia 4 de maio aqui no Ceará, percorrendo os nove estados, e terminando esta visita com a benção e inauguração da Capelinha em 13 de outubro, aniversário da última aparição, com uma grande solenidade", frisa.
Mas não é fácil cumprir o calendário. "Estamos numa grande batalha, mas confiantes na Providência", relata. "De acordo com os arquitetos que estão de forma espontânea a trabalhar no projeto, só para a construção da Capelinha e cobertura iremos ter um gasto quase 200.000 reais em mão de obra e material de construção".
"Já recebemos doação de uma camioneta de areia e tijolos. E assim seguimos rezando, confiantes que a Providencia nos enviará ajuda", diz. "Se o projeto foi acolhido pelo Santuário de Fatima e pelo nosso clero local é porque o projeto não é nosso, e sim de Deus que chegou a nós pela Senhora mais brilhante que o sol".
Para que tudo isto se concretize, a comunidade está também a angariar dinheiro através de uma campanha de crowdfunding em Portugal, já que precisam de comprar uma imagem de Nossa Senhora de Fátima "que seja réplica da Imagem Peregrina que percorre o mundo a levar alento e esperança aos católicos devotos de Nossa Senhora". No total, são necessários 1250€ até dia 15 de abril.
Segundo informação disponibilizada na página das doações, quem pretender ajudar terá "a possibilidade de ter o seu nome inscrito num mural da Capelinha em João Pessoa".
"Em torno dessas réplicas os devotos sentem a espacialidade de Fátima e reúnem-se em oração"
Nestas iniciativas, o Santuário de Fátima já não tem qualquer intervenção. "Somos alheios às iniciativas que os promotores entendem adotar em cada lugar, para promover os seus projetos", justifica Patrícia Duarte. "A preocupação do Santuário de Fátima é a difusão da mensagem de Fátima e da devoção a Nossa Senhora de Fátima".
Apesar disso, estas iniciativas são reconhecidas pela sua importância para a transmissão da mensagem de Fátima. "O facto de as comunidades, um pouco por todo o mundo, pretenderem ter junto de si uma réplica da Capelinha das Aparições constitui uma das expressões mais claras da importância do fenómeno de Fátima no mundo".
"Em torno dessas réplicas os devotos sentem a espacialidade de Fátima e reúnem-se em oração, com práticas devocionais muito próximas das que são realizadas em Fátima. A Capelinha das Aparições, construída em Fátima na sequência de um pedido da Virgem Maria, é considerada o coração do Santuário de Fátima, motivo pelo qual é cada vez mais tomada como polo de devoção junto dos crentes nos diferentes lugares do mundo", remata.
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