Rodrigo Londono Echeverri — ou Timochenko, nome de guerra — nasceu em 1959 e entrou nas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) aos 17 anos, acabando por ser líder da guerrilha mais antiga da América. Mas também soube terminar com isso: após quatro décadas de guerra contra o Estado, assinou os acordos de paz que encerraram o conflito armado e fica para a história como o último líder das FARC.
Hoje, é o principal líder da Força Alternativa Revolucionária do Comum, a formação política que é a herança das FARC, ou não partilhassem o acrónimo. Por isso, os amores e os ódios também ficam. Mas talvez não da forma que se pensa. Afinal, recentemente, os ex-amigos planearam assassiná-lo e foram os ex-inimigos que o salvaram. Confuso? Aqui fica a história.
Os ex-amigos que tentaram matar Londono
A 12 de janeiro, as autoridades colombianas anunciaram ter frustrado um atentado contra o antigo líder da ex-guerrilha FARC, Rodrigo Londono, promovido por rebeldes que não reconhecem o acordo de paz, de 2016, para terminar com meio século de conflito armado.
Tudo foi possível graças a um informador que alertou as autoridades sobre um “ataque iminente” a Londono, de 60 anos, no departamento de Quindio, no centro na Colômbia. Sabida a informação, a polícia — os "ex-inimigos" — reforçou imediatamente a segurança de Rodrigo Londono e, durante uma ‘operação stop’ numa região vizinha, localizou dois motociclistas cuja fisionomia correspondia à descrição fornecida pelo informador.
Vendo-se descobertos, os suspeitos armados com pistolas abriram fogo e foram mortos numa troca de tiros. Naquele momento estavam, segundo o diretor da polícia, "a pouco mais de um quilómetro da propriedade” de Timochenko.
A grande questão: quem eram os homens? A polícia, que ainda se encontra a investigar, identificou um deles como sendo um guerrilheiro que lutou durante 17 anos nas FARC, ou seja, um "ex-amigo" de Rodrigo Londono.
Segundo o chefe da polícia, os agressores eram membros de um grupo dissidente das FARC liderado por Hernan Dario Saldarriaga, apelidado de El Paisa, que durante anos liderou o comando de elite dos ex-guerrilheiros.
Saldarriaga é um dos três líderes de um grupo rebelde comunista que anunciou uma nova rebelião armada na Colômbia em agosto de 2019, liderada pelo ex-‘número dois’ e antigo mediador durante as negociações de paz, Ivan Marquez.
A Colômbia das FARC e a Colômbia de hoje
Embora não tenham conseguido atingir o objetivo, muitos dos ataques chegaram ao fim. Mas a violência continua a marcar a Colômbia. Segundo as autoridades, os ataques são executados por grupos de traficantes de drogas e até por grupos dissidentes das FARC ou membros do Exército de Libertação Nacional (ELN). Em 2019, 77 ex-combatentes foram mortos, o número mais alto desde a assinatura do acordo de paz, segundo a organização das Nações Unidas.
Dado o cenário de violência, os ex-rebeldes que assinaram o acordo de paz pedem repetidamente garantias de segurança após a morte de dezenas de ex-combatentes desde 2016. "Há um sentimento generalizado de que os notórios paramilitares voltaram ou nunca foram embora", referiu Oscar Guardiola-Rivera, professor no Birkbeck College em London, citado pela Monocle.
Em entrevista ao El País, Londono refere que "mais pessoas estão a acompanhar [a Força Alternativa Revolucionária do Comum] nesse propósito de acabar com o conflito que estava a fazer os colombianos matarem-se uns aos outros". Neste sentido, o que procuram é "uma sociedade que tenha diferenças ideológicas, políticas, culturais e que isso não resulte em formas de violência", o que "não muda de um dia para o outro, mas precisa de ser trabalhado com muita paciência".
O acrónimo FARC — que pode causar confusão — pode ser uma das causas de insegurança, neste momento. Londono admite alguma responsabilidade, mas também diz que se apercebeu do problema. "Fui eu quem no congresso de fundação propus desde o início que mudássemos o nome. Inicialmente, também achava que devíamos manter o nome FARC, por toda a conotação histórica, sentimental, mas os argumentos das pessoas convenceram-me de que não devíamos fazê-lo e levantei a questão no congresso", explica. Contudo, o nome já se impôs — mas é um elemento que ainda se tem de reconsiderar.
Sobre o tratado de paz, o ex-líder das FARC refere que o partido é apoiado "por mais de 95% dos que aceitaram o acordo. Apesar da situação vivida, há um compromisso: "este é o caminho a que nos comprometemos, apesar dos obstáculos que se apresentarem", afirma, reforçando que o apelo à comunidade internacional e nacional para que não se deixe "que os clarins que chamam para a guerra não deixem ouvir os cânticos de paz, aos quais se somam mais e mais vozes".
Os descendentes das FARC e os ataques na Colômbia
Pelo menos 107 defensores dos direitos humanos foram mortos na Colômbia em 2019 e outros 10 já morreram desde o início de 2020, segundo informações do Escritório das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Além destes, estão ainda a ser verificados outros 13 casos possíveis de assassínios de ativistas no ano passado que, se confirmados, elevariam o número total de casos para 120, acima dos 115 registados em 2018.
"Reiteramos o nosso apelo ao Governo colombiano para aumentar os esforços e impedir ataques a pessoas que defendem os direitos fundamentais, investigar todos os casos e julgar os responsáveis pela violência e os seus instigadores", disse a porta-voz do Escritório, Marta Hurtado.
Embora os números não sejam comparáveis aos que havia antes da assinatura dos acordos de paz em Havana, há um aumento preocupante no número de assassínios de ativistas nos últimos quatro anos, com 61 casos em 2016, 84 em 2017 e mais de cem em 2018 e em 2019.
Os autores desses ataques são de origens diversas, disse Hurtado, embora tenha enfatizado que muitos deles são grupos armados e grupos criminosos, algumas deles ligados ao narcotráfico, que ocuparam territórios onde guerrilheiros das FARC operavam anteriormente.
"A grande maioria dos assassínios ocorreu em áreas rurais, quase todas em cidades onde são realizadas atividades económicas ilegais e gangues criminosos ou grupos armados operam", disse, acrescentando que é comum estar em áreas com níveis de pobreza acima da média nacional.
Entre os fatores que levaram à violência, Hurtado citou "as dificuldades contínuas na aplicação dos Acordos de Paz, especialmente o desmantelamento de grupos paramilitares", bem como os conflitos quando há restituição de terras ou na execução de programas para substituir culturas ilegais.
*Com Agências
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