O primeiro capítulo desta história judicial tem como protagonista Robert Lloyd Schellenberg, que foi condenado em janeiro de 2019 à pena de morte, tendo sido acusado de introduzir, junto com outros acusados, mais de 220 quilos de metanfetaminas na China.
Considerado culpado no passado por tráfico de droga no Canadá, Schellenberg declarou-se inocente e afirmou que viajou à China por turismo, tendo apresentado recurso contra a condenação.
O Tribunal Popular Supremo da província de Liaoning, a província onde o canadiano foi julgado, "decidiu rejeitar o recurso e confirmar a decisão inicial", afirma um comunicado, considerando-se que "os factos constatados em primeira instância eram claros, as provas confiáveis e suficientes" e que a pena de morte é "apropriada", completa a nota.
"Condenamos o veredicto nos termos mais fortes e apelamos à clemência da China", declarou Dominic Barton, embaixador do Canadá no país. "Transmitimos em várias ocasiões à China a nossa firme oposição a esta pena cruel e desumana e continuaremos a fazê-lo", completou.
A decisão de condenar Schellenberg à morte, todavia, não é coincidência, já que ocorre ao mesmo tempo que Meng Wanzhou, executiva do grupo chinês de telecomunicações Huawei, foi convocada a um tribunal canadiano para a última série de audiências que devem definir sua eventual extradição aos Estados Unidos.
Meng Wanzhou, de 49 anos, foi detida em 1 de dezembro de 2018 no aeroporto de Vancouver a pedido da justiça dos Estados Unidos, que deseja julgá-la por fraude bancária.
Aliás, a cronologia bate certo com a crise diplomática entre os dois países. Detido em 2014, Schellenberg foi condenado a 15 anos de prisão em primeira instância. Mas pouco depois da detenção da executiva da Huawei, a justiça considerou o veredicto "muito indulgente" e anunciou a abertura de um novo processo.
Entretanto, o processo de recurso de Robert Lloyd Schellenberg foi movido em maio de 2019, o que significa que a justiça chinesa demorou mais de dois anos para pronunciar o seu veredicto.
Mas Schellenberg não foi o único canadiano a ser detido e condenado pela justiça chinesa, nem o seu caso foi o único a coincidir com a detenção de Wanzhou no Canadá, já que o caso de Michael Spavor inscreve-se na mesma cronologia.
Tanto este empresário como o ex-diplomata Michael Kovrig, também canadiano, foram detidos poucos dias depois de Wanzhou ser alvo da mesma ação no Canadá.
Três anos depois, Spavor foi "declarado culpado de espionagem e de roubar segredos de Estado", sendo "condenado a 11 anos de prisão", informou nesta quarta-feira um tribunal de Dandong , na fronteira norte-coreana, onde o canadiano foi julgado em março de 2021.
O processo foi realizado a portas fechadas, o que é habitual na China em casos de espionagem. Já Kovrig, foi também interrogado e posteriormente preso ao mesmo tempo que Spavor por motivos de espionagem semelhantes.
O primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, denunciou uma "detenção arbitrária" dos dois compatriotas e a "falta de transparência" das autoridades chinesas, acusando Pequim de represálias à ordem de prisão de Wanzhou.
Já para David Lametti, ministro canadiano da Justiça, as detenções e os processos judiciais contra Spavor e Kovrig baseiam-se em "falsas acusações para as quais não há absolutamente nenhum fundamento na lei", tendo também denunciado a condenação à morte de Schellenberg.
A China — que desde a detenção de Wanzhou tem denunciado uma manobra "política" de Washington e exigido a Ottawa a "libertação imediata" da chinesa — rejeita as acusações de estar a usar os cidadãos canadianos como moeda de troca.
Em 2015, a China reduziu de 55 para 46 o número de crimes que podem ser punidos com a pena de morte. O número de execuções no país é um segredo de Estado.
A mais recente de um ocidental foi a de Akmal Shaikh, um britânico executado em 2009 por tráfico de heroína, segundo a agência oficial Xinhua.
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