Um comunicado do TC adianta que esta decisão, tomada em acórdão de 27 de maio, surge após um recurso apresentado pelo Ministério Público contra uma sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte – Juízo Local de Pequena Criminalidade de Loures que recusou aplicar uma norma do decreto de 02 de abril de 2020 que veio regulamentar a prorrogação do estado de emergência decidida pelo Presidente da República e que agravou em um terço os limites mínimo e máximo da moldura penal do crime de desobediência previsto no Código Penal.

Em causa esteve a desobediência a uma ordem de “recolhimento domiciliário” numa altura em que vigorava o estado de emergência, devido à pandemia de covid-19, decretado pelo Presidente da República e regulamentado pelo Governo.

“A questão fundamental do recurso era a de saber se o Governo tem competência própria, no quadro da execução da declaração presidencial do estado de emergência, para decretar normas em matéria de crimes e penas — que integra a reserva de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos do artigo 165.º da Constituição -, designadamente agravando os limites mínimo e máximo da moldura penal do crime de desobediência”, refere o mesmo comunicado.

Segundo o acórdão, a maioria dos juízes do TC (houve dois votos vencidos) entendeu que “uma vez declarado um estado de emergência ou um estado de sítio, o executivo passa a atuar no quadro de uma organização excecional do poder público”.

Assim, para os juízes do TC, o executivo pode “não só estabelecer normas de conduta incompatíveis com exercício regular das liberdades fundamentais abrangidas pelo decreto presidencial — como ocorre com a imposição de um dever geral de recolhimento domiciliário -, como tomar providências em matéria de crimes e penas estreitamente relacionadas com a sua função de defesa da ordem constitucional”.

“Por outras palavras, as razões que justificam a autorização extraordinária para invadir a reserva parlamentar em matéria de direitos, liberdades e garantias — inerente ao poder de executar uma declaração que suspende parcialmente o exercício destes – estendem-se necessariamente ao domínio da definição dos crimes e das penas que participe da mesma finalidade e nela encontre justificação material suficiente”, indica o acórdão.

Os juízes conselheiros deixam claro que “este poder normativo é absolutamente excecional”, estando o seu exercício baseado “num título extraordinário”, que é a declaração do estado de emergência, e tem “caráter temporário”, ou seja, a vigência do decreto presidencial, estando ainda orientado para “uma finalidade específica”, neste caso a restauração da normalidade constitucional.

Para o TC, o Governo “pode decretar normas no âmbito específico da execução do decreto presidencial que declara o estado de emergência, estritamente pelo prazo de vigência daquele e com vista a garantir o cumprimento da legalidade excecional”.

“Trata-se, em suma, de uma competência normativa alargada, cujo âmbito material é definido em função do necessário e adequado ao ‘pronto restabelecimento da normalidade constitucional'” explica a nota informativa do TC.

Por isso, a maioria dos juízes decidiu “não julgar inconstitucional a norma do n.º 6 do artigo 43 do Decreto n.º 2-B/2020, de 2 de abril” e, assim, dar “provimento ao recurso”, ou seja, dar razão ao Ministério Público.

Em causa estava o artigo que determinava que “a desobediência e a resistência às ordens legítimas das entidades competentes, quando praticadas em violação do disposto no presente decreto, são sancionadas nos termos da lei penal e as respetivas penas são sempre agravadas em um terço, nos seus limites mínimo e máximo”, nos termos de uma norma da Lei de Bases da Proteção Civil.

O acórdão ordena assim a reforma ou revisão da sentença proferida pelo Juízo Local de Pequena Criminalidade de Loures, “em conformidade com o presente juízo [do TC] de não inconstitucionalidade”.

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