O investigador e membro da direção do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) salientou, em entrevista à Lusa, que além da elite militar que está no poder e quer preservá-lo, há atores externos que podem vir a apoiar posições mais extremadas do que resta do regime de Hugo Chavéz, o anterior Presidente venezuelano, aumentando assim os riscos de violência.

“Há atores no terreno que provavelmente preferem um confronto violento do que uma fórmula negociada de transição para ultrapassar este impasse”, destacou.

A Venezuela enfrenta uma crise política desde 23 de janeiro, altura em que Juan Guaidó, o presidente do parlamento, se autoproclamou Presidente interino da Venezuela perante uma multidão de opositores de Nicolás Maduro, prometendo um "governo de transição" e "eleições livres".

Maduro foi investido, a 10 de janeiro, para um segundo mandato como chefe de Estado e de Governo, cuja legitimidade não foi reconhecida por grande parte da comunidade internacional após eleições, em maio de 2018, em que estiveram ausentes as principais forças da oposição.

O Presidente Maduro continua, no entanto, a ser apoiado por países como a China, a Rússia, a Turquia e, sobretudo, Cuba “que tem um grande empenho no regime da Venezuela”.

Para Carlos Gaspar, este é “um fator de resistência e um risco de violência acrescido”, já que a queda do regime 'chavista' significa que Cuba volta a ficar isolada, reforçando “a vontade de sustentar o regime militar para lá do que é razoável”.

O responsável do IPRI realçou que “aparentemente, há 15 mil conselheiros cubanos” no terreno, que fazem parte das condições de sustentação do regime militar, e admitiu “uma escalada no curto prazo”.

O investigador frisou que esta situação de grande tensão “vai ter de ser resolvida rapidamente” e afirmou que, neste momento, “a legitimidade na Venezuela está num sítio diferente de onde está o poder”.

O ultimato da União Europeia a Maduro, que disse ser “inédito”, sublinha “a gravidade” deste situação que foi reconhecida por Portugal e pelos restantes países, perante a degradação das condições de vida na Venezuela, vincou o académico e docente da Universidade Nova de Lisboa.

O regime militar venezuelano provocou uma situação “caótica e catastrófica” que não pode continuar e foi esta “situação limite” que justificou uma “tomada de posição tão firme” e sem precedentes do lado da União Europeia (UE), declarou.

Carlos Gaspar considerou que está em causa uma questão “humanitária e de segurança” que afeta a população da Venezuela, onde reside uma comunidade de cerca de 300 mil portugueses e lusodescendentes.

Se o ultimato falhar, a UE irá reconhecer a Assembleia Nacional como única instância legítima, procurando “isolar o presidente Nicolas Maduro e o regime militar” na expetativa de que esta pressão europeia e americana, à qual se juntam vários países da América Latina, incluindo o Brasil, “provoque junto das elites militares uma reavaliação das circunstâncias” que levaram ao impasse.

A mudança política no Brasil foi, aliás, determinante para a nova conjuntura: “Era difícil imaginar que seria possível isolar o regime chavista da Venezuela antes das eleições presidenciais no Brasil”, comentou.

A repressão dos protestos antigovernamentais da última semana na Venezuela já provocou 35 mortos e 850 detidos, de acordo com o mais recente balanço divulgado por diversas organizações não-governamentais.

Esta crise política soma-se a uma grave crise económica e social que levou 2,3 milhões de pessoas a fugirem do país desde 2015, segundo dados da ONU.