“O resultado das negociações alcançado na madrugada de sábado é claro: a UE deixou escapar a oportunidade de reforçar a ambição climática, continuando, ao invés, a permitir a distribuição de milhões de licenças de poluição gratuitas à indústria”, criticam os ambientalistas, em comunicado.

No sábado, depois de 30 horas de negociações, os eurodeputados e Estados-membros da UE chegaram a acordo sobre uma vasta reforma do mercado de carbono europeu, fundamental no plano climático do bloco dos 27, que inclui a eliminação gradual dos "direitos de poluição" gratuitos atribuídos à indústria e prevê cobrar pelas emissões provenientes do aquecimento de edifícios e do transporte rodoviário, com um limite de preço para evitar sobrecarregar as famílias.

“Os negociadores não foram além do nível de ambição proposto pela Comissão e resignaram-se com uma redução de emissões na ordem dos 62% para os setores do Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) até 2030. Este valor fica claramente aquém da redução de 70% necessária para que a UE, um contribuidor histórico para a atual crise climática em que nos encontramos, cumprisse com a sua quota parte justa para limitar o aquecimento global a 1,5°C, tal como consagrado no Acordo de Paris”, aponta a Zero.

A associação salienta que “no contexto da guerra na Ucrânia, não restam dúvidas de que uma política climática forte é um pilar essencial para acelerar a transição energética da UE e para libertar a Europa da sua dependência dos combustíveis fósseis”.

Mas, explica, “os colegisladores optaram por continuar a alimentar a indústria com licenças de poluição gratuitas, que só serão completamente eliminadas em 2034”, uma decisão que, defende a Zero, “não só atrasa a redução de emissões nos setores altamente poluidores do CELE (cimentos, aço, alumínio, etc), como mancha a credibilidade de todo o mecanismo”.

Isto porque, prossegue o mesmo comunicado, “enquanto se espera que o cidadão comum pague pelas emissões nos edifícios e transporte rodoviário, os governos da UE continuam a distribuir centenas de milhares de milhões em licenças gratuitas para a indústria”.

Os ambientalistas defendem como sendo “absolutamente crucial” a aplicação do princípio do poluidor-pagador, “ao mesmo tempo que se direcionam apoios dedicados à transição das famílias de baixos rendimentos através do Fundo Social para a Ação Climática”.

No entanto, para a Zero, “não deixa de ser positivo que os colegisladores tenham determinado que o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM) seja aplicado a partir de 2026, com uma redução de quase metade das licenças gratuitas atribuídas aos setores CBAM até 2030”.

A associação defende ainda que “todas as receitas geradas pelo CELE e gastas quer diretamente pelos Estados-membros (…) não devem ser utilizadas para financiar quaisquer investimentos em combustíveis fósseis ou nucleares”.

Pelo que considera que “neste quadro, os negociadores deram um passo na direção certa, reforçando as regras sob as quais os Estados-membros devem gastar as receitas avultadas geradas pelo leiloamento de licenças CELE, tornando obrigatório o requisito de que os Estados-membros canalizem 100% das receitas para ação climática”.

No texto, os ambientalistas lamentam ainda que as instituições europeias tenham deixado “a porta aberta para investimentos em gás” que ascendem aos 4,8 mil milhões de euros para produção de energia de gás fóssil, e ainda mais em cogeração baseada em gás fóssil.

“Com este passo em falso, a UE arrisca-se a perpetuar a utilização de gás fóssil em investimentos irrecuperáveis, perdendo a oportunidade de canalizar todos os cêntimos para soluções verdadeiramente limpas e preparadas para o futuro: eficiência energética, modernização das redes energéticas e 100% renováveis”, conclui a associação.