O antigo campeão da Europa e do Mundo, um dos jogadores daquela seleção francesa que fica para a história pela conquista de dois troféus em dois anos. Espere, não é assim. O atual diretor desportivo do Olympiacos, Também não está correto. O agora investidor em projetos que ligam marcas e empresas, na realidade, a a razão que trouxe Christian Karembeu  à Soccerex Europe.

Mas, pode lá ser possível separar o investidor do jogador, da estrela, do diretor desportivo, do eterno apaixonado por futebol.

Não pode e não foi, por isso, vamos lá de novo explicar a conversa que se segue.

Foi na Soccerex Europe, o evento que nos dias 5 e 6 de setembro reuniu a indústria de futebol em Oeiras, que o SAPO24 conheceu a nova vida de Christian Karembeu, presente como investidor da Sponsor.Online, uma empresa digital que, através de um algoritmo inovador, facilita o contacto entre as marcas e os clubes de futebol.

Mas um jogador que venceu um Campeonato do Mundo (1998) e um Campeonato da Europa (2000), que fez parte de um seleção que ficou para a história, que representou e venceu por clubes como Nantes, Sampdoria, Real Madrid e Olympiacos nunca pode passar a ser só um investidor. Ou pode?

Não é possível deixar-se assim o futebol. Apesar de Karembeu dizer que já não pisa o relvado. Que já não é jogador de futebol. Que tem de respeitar as suas novas funções de diretor desportivo no Olympiacos, onde trabalha com o treinador português Pedro Martins e desempenhas as funções de diretor desportivo. Apesar disso tudo, confessa que sempre que tem oportunidade vai jogar com os amigos. Ainda no passado sábado esteve no Restelo com mais veteranos do Real Madrid num jogo contra o Belenenses.

Diz também que Cristiano Ronaldo mudou a mentalidade da seleção portuguesa.

A conversa era sobre a nova vida de Christian Karembeu, o investidor mas, nem o entrevistador, nem o entrevistado resistiram em desviar o assunto para a ‘bola’ propriamente dita.

Portanto, e apresentação final, esta é uma entrevista a Christian Karembeu, o investidor, antiga lenda do futebol mundial e diretor desportivo do Olympiacos. É isto.

créditos: Joao Sa/Soccerex

Queria entrar no mundo dos negócios depois de ter pendurados as chuteiras?

Já tinha estado em vários negócios quando era jogador. Durante a minha carreira tive muitas oportunidades de negócio em empresas, criei algumas startups, fiz investimentos...

Durante a carreira?

Não era fácil, porque só tinha lido livros, nunca tinha estado numa empresa na altura. Não é fácil entrar e perceber. Agora tenho mais tempo para aprender, perceber as necessidades e estar mais por dentro da empresa, reunir-me com os clientes... Preciso de ser apaixonado pelo que faço, é assim que penso. Foi por isso que decidi investir nesta empresa não só porque é atual, uma empresa da era da digitalização e da globalização, mas porque precisava de fazer parte disto. É por isso que estou aqui com Sponsor.Online para ajudar a as pessoas a perceber quem somos, o que estamos a fazer e, claro, ajudar clubes e marcas a encontrar soluções. Nós facilitamos a ligação entre estes dois com o nosso algoritmo.

O que era enquanto jogador ajuda-o nisso?

Antes de ser jogador também estudei.

O que estudou?

Biotecnologia. Depois recebi uma bolsa de estudo no meu país, mudei-me para França. Continuei a estudar e comecei a jogar. Quando assinei o meu primeiro contrato profissional é que tive de meter um pouco de lado os meus estudos. Durante a minha carreira tirei o curso de treinador, agora, o trabalho no clube [Olympiacos], e a experiência em vários departamentos da indústria deram-me muito conhecimento. Temos de aprender todos os dias e é por isso que me sinto confiante para falar disto, para falar de qualquer coisa.

É tão apaixonado por este mundo como é pelo futebol?

Para continuar a tua carreira ajuda muito seres apaixonado, é isso que nos mantém vivos. E nós ajudamos a fazer o futebol crescer, a ser sustentável e claro ajudamos as equipas. Sempre disse, o que o futebol me deu, eu gostava de poder dar ao futebol.

Nunca pensou ser treinador?

Sou diretor desportivo do Olympiacos, tenho o primeiro nível de treinador, mas desde que deixei de jogar que não quero interferir no campo. O Pedro Martins pode dizer-te, nunca entro no relvado.

Porquê?

Tenho de respeitar os jogadores, preciso de me focar nas minhas funções e as minhas funções já não são no campo, são no escritório. Já não sou um jogador de futebol. Agora, claro que quando existe a possibilidade de ir jogar com os meus amigos, vou.

Ainda sente essa necessidade de jogar?

Claro. Sábado [07/09/19] vou jogar com os veteranos do Real Madrid contra o Belenenses.

É uma coisa que precisa de fazer de vez em quando?

Está no nosso ADN, não nos esqueçamos disso. Mas enquanto diretor de desportivo, respeito a minha função e a dos jogadores.

O Olympiacos, curiosamente, tem uma grande relação com Portugal. Atualmente têm um treinador português, vários jogadores portugueses. Vê alguma coisa de especial no futebol português?

Alguma coisa de especial? Não. É natural. Portugal sempre deu muito talento ao futebol, o que acontece é nunca tinham conseguido conquistar um troféu, excepto, agora, com a vitória em França. Conheço a geração do Luís Figo, do Rui Costa, Eusébio... Eram jogadores muito bons. Joguei contra alguns deles, mas no futebol os pequenos detalhes podem fazer pequenas diferenças... e não aconteceu.

Acha que é isso? A falta de troféus até 2016 foi por detalhes?

Depende sempre dos detalhes e da vontade com que uma equipa entra em campo. Acho que Cristiano Ronaldo mudou a mentalidade da seleção. Na seleção francesa, nós tínhamos o talento, mas tínhamos de trabalhar muito. Era mais do que ter talento. O Cristiano inspirou a seleção. Ele não jogou a final do Euro 2016, mas inspirou os colegas do banco.

créditos: MILOS BICANSKI/EPA

Estava aqui a ver, não se chegou a cruzar com Luís Figo no Real Madrid.

Não, nunca joguei com ele, foi sempre contra. [risos] Contra o Figo, contra o Rui Costa, contra o Paulo [Futre].

Qual é que lhe deu mais trabalho?

Todos davam trabalho, mas era fácil para mim porque ia para cima deles e esmagava-os [risos]. Não, nada disso, estou a brincar! Eles eram tão talentosos que sentiam que podiam ganhar a toda a gente. Quando falo de Deco, de Rui Costa, Luís Figo, Costinha, Nuno Gomes, tantos... Se recuar ainda mais, Eusébio, Chalana, Paulo Futre. Tiveram grandes nomes!

Só faltava ganhar.

É uma questão de filosofia. Vocês agora entendem que há um processo para jogar, talvez a Federação tenha decidido pensar num processo estruturado de formação para treinadores e para os miúdos. Foi o que nós fizemos em França. Desde os escalões mais baixos até Clairefontaine. Temos de pensar como ganhar, como ter a mentalidade vencedora.

E vocês tinham essa mentalidade quando venceram o Europeu e o Mundial?

Aprendemo-la com Michel Platini, Giresse, Tigana, com essa geração que venceu antes de nós. Eles inspiraram-nos.

Quem é que o inspirou?

Todos. Éramos um, éramos uma família. Ainda hoje temos um grupo, a associação de 98. No próximo mês vamos jantar todos, costumamos ir de férias juntos. Temos esta história em comum. É único, é um legado para a nova geração. Ficámos muito felizes por aquilo que eles conseguiram na Rússia.

Acha que esta geração pode conseguir o que vocês conseguiram? Vencer o Europeu e o Mundial?

Podem consegui-lo. Conheço o Didier Deschamps e sei que ele vai guiar a seleção a vencer mais troféus. Estivemos perto com Portugal, vai acontecer. Não aconteceu em casa, mas vai acontecer em 2020 numa fantástica celebração. Vão ser 12 cidades a receber este Campeonato e no final vamos estar em Wembley a jogar a final e espero que seja França contra Portugal [risos].

Outra vez? Para a vingança?

Não, nada isso. Agora é outro capítulo.

Agora que está a trabalhar com patrocinadores está perto de um mercado que está completamente diferente do tempo em que jogava. Como olha para estes números?

Depende do campeonato em que estás. Se estás na Premier League, estes números são normais, se fores à Bundesliga, La Liga ou Calcio, ainda são normais. Depois disso, temos de considerar as figuras, os salários e perceber que, ok não conseguimos competir com os outros, mas temos de nos fazer competitivos no nosso próprio campeonato. Temos de adaptar a nossa competitividade. É o que estamos a fazer no Olympiacos. Sabemos que não temos o mesmo orçamento que o Manchester United ou que o Bayern Munique ou, por exemplo, o Tottenham. Só no campo é que se torna possível. No campo, tudo é possível.

Mas não acha que há um grande desfasamento entre equipas?

Lá está, depende. As pessoas que estão em Inglaterra percebem, para elas, no final do dia é normal. Quando vais para outro país que não tem uma liga estruturada e organizada como a Premier League... Por isso é que digo que depende muito de onde estás.

Mas não acha que é praticamente impossível uma equipa como o SL Benfica, FC Porto, Sporting ou Olympiacos vencer a Liga dos Campeões nos dias de hoje?

Não. E por isso é que temos de respeitar o campo. Se compararmos alguns jogadores... Às vezes ouço comentários sobre os valores dos jogadores, dizem que ele vale isto ou aquilo porque joga na Premier League e que outro no Benfica ou no Olympiacos vale menos, mas o nosso jogador pode ser melhor. Há dois valores: o desportivo e o de mercado. Na Croácia há muito bons jogadores, mas o valor de mercado não é o mesmo.

(...) E é aqui que somos interrompidos. Faz sinal a assessora, a fila está grande, há fãs, possíveis parceiros de negócio e outros jornalistas. Mas Karembeu não consegue parar. Pede desculpa e levanta-se connosco e que nem um diretor desportivo continua a falar do mercado de como os valores muitas vezes não correspondem ao desempenho real de um jogador e como clubes como o Olympiacos têm muitas vezes jogadores melhores que outros clubes com maior cotação. Ele acredita realmente que só no campo é que se podem tirar as conclusões. É um sonhador, acredita que não é impossível o Olympiacos vencer a Champions. Pode ter saído do futebol, pode dizer que já não é jogador de futebol, mas o futebol nunca vai sair dele. Senhoras e senhores, em 16 minutos, esta é a nova vida de Christian Karembeu.