Mais de 300 adeptos não faltam à chamada de um jogo histórico – a primeira meia-final na mais importante competição sul-americana de clubes em 35 anos. Nas Docas de Alcântara, a delegação do Flamengo começa a encher quase duas horas antes do desafio. Os corpos carregam as camisolas vermelhas e negras, as caras exibem sorrisos e otimismo.

A ideia de uma representação do clube ‘carioca’ em Lisboa surge em 12 de fevereiro de 2017, com cinco adeptos que queriam disfarçar as saudades daquilo a que chamam ‘casa’: o Estádio Maracanã. Nicholas Reis, Thiago Fragoso, Leonardo Mesquita, Felipe Dobbin e Felipe Faria juntaram-se nesse sonho e a obra nasceu. “Foi precisamente por este ambiente de festa que montámos a Embaixada. Tínhamos saudades disto”, conta à Lusa Nicholas Reis, de 33 anos.

Não tardou a que muitos outros se juntassem ao grupo inicial. Foram os casos de Patrick Raposo, 34 anos, e Nelson Tavares, 37, com este último a formar a ‘Charanga Imperial’, a claque responsável por dar ritmo aos outros adeptos. O nome é uma homenagem à primeira claque do Flamengo, a ‘Charanga Rubronegra’, e integra hoje nove elementos que ensaiam e tocam por amor ao clube.

O apito para o pontapé de saída, marcado para as 01:30 (hora de Lisboa), ainda não havia soado, mas as bandeiras gigantes vermelhas e negras já ondulam junto ao Tejo. “Mengo, estou sempre contigo / Somos uma nação / Não importa onde estejas / Sempre estarei contigo”, cantam centenas, a plenos pulmões, indiferentes ao relógio, enquanto outros ficam de costas voltadas para o jogo. A prioridade destes é manter o ritmo da ‘torcida’.

“Os ‘flamenguistas’ são muito supersticiosos. Na última vez que o Flamengo disputou uma meia-final da Libertadores, a primeira mão foi em 02 de outubro, a segunda mão foi no dia 23, e a final a 23 de novembro. É exatamente como neste ano”, assinala Patrick, com uma esperança incontida nos olhos.

Aos 20 minutos, há a primeira explosão de euforia, com o golo de Éverton Ribeiro, logo seguida de alguma contestação pela anulação pelo videoárbitro (VAR). A história repete-se quatro minutos depois, com o golo anulado a Gabigol, devido a fora de jogo. No entanto, nem na frustração momentânea a música deixa de se ouvir.

O 0-0 resiste até ao intervalo, mas nas Docas respira-se confiança com a exibição da equipa e reina a esperança num português: Jorge Jesus.

“Uma das grandes virtudes do Jesus é essa: puxar o melhor de dentro dos jogadores. O Gabigol começou a marcar golos em todos os jogos com ele. Sempre soube que era grande treinador. Fez um grande trabalho no Benfica e no Sporting só não foi campeão por um detalhe”, nota Felipe Dobbin, enquanto Leonardo não hesita em considerar que “o Flamengo tem agora o melhor ‘time’ do Brasil e talvez o melhor da América do Sul”.

No entanto, o sentimento de hoje não é o mesmo que este grupo de adeptos teve quando soube da escolha. Aliás, a “apreensão e desconfiança eram unânimes”, segundo Thiago Fragoso, que hoje reconhece que o treinador português e o argentino Jorge Sampaoli, do Santos, “estão a revolucionar” o futebol brasileiro.

Nelson resume o estado de espírito: “Se ele conquistar a Libertadores e o Mundial [de clubes], ‘vira’ Deus”.

A bola volta a rolar, saem mais cervejas do bar e acendem-se mais cigarros. O Grêmio equilibra o jogo, mas sem anular o Flamengo e a prova disso chega aos 69 minutos, com o ansiado golo de Bruno Henrique.

Desta feita, não há VAR a estragar a festa e a loucura é total. Até as traves de madeira nas quais assenta a esplanada dos bares abanam perigosamente. Grita-se entre a multidão "Olé, mister” e “Jesus, Jesus, Jesus”.

A vitória parece iminente, mas o golo de Pepe, aos 88, dá o empate 1-1 ao Grêmio e relança a discussão da eliminatória. O apito final vem quase a seguir, com um sentimento agridoce, mas sem tristezas.

É hora de arrumar as bandeiras e os tambores na Embaixada, porque hoje é dia de trabalho para a maioria destes adeptos. A segunda mão é só daqui a três semanas, mas a festa ‘rubronegra’ segue dentro de momentos.

Por: João Paulo Godinho da Agência Lusa

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