Em declarações à Lusa, Gonçalo Almeida abordou o imbróglio trazido pela pandemia de Covid-19 para o seio do futebol e do desporto, pelo que a possibilidade de a I e II Ligas portuguesas se estenderem pelo verão dentro, e para lá de 30 de junho, data em que terminam muitos contratos de jogadores e equipas técnicas, está cada vez mais em cima da mesa.

Com o adiamento do Euro2020 para o próximo ano, à semelhança da Copa América, as competições europeias e campeonatos nacionais terão de ser disputados depois de uma suspensão cuja extensão está ainda por determinar, e nesse caso qualquer alteração aos contratos teria de ser consensual entre as duas partes.

"[Qualquer adenda] depende, totalmente e sempre, da anuência expressa da parte de cada um dos atletas. Os contratos de trabalho desportivo não podem ser unilateralmente impostos aos jogadores, precisam da sua concordância", afirma o advogado.

Nesta situação, o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol terá "um papel bastante relevante como entidade representativa, mas não vincula os jogadores", numa situação que traria, também, várias implicações a nível financeiro para os clubes.

Gonçalo Almeida exemplifica com o caso de um jogador cujo contrato termine em junho de 2021, e que estaria "livre para assinar por outro clube em janeiro", deixando os clubes privados de, no verão, tentarem "a renovação do contrato ou um encaixe financeiro com a transferência".

Quanto a bónus e cláusulas relativas a títulos ou a conquista de determinados objetivos, fica claro que "são motivos de força maior que transcendem a vontade das partes", e por isso nenhuma tem culpa numa situação, pelo que "não sendo verificável", os objetivos não podem ser alcançados nem pagos.

Perante uma "situação completamente inovadora, cuja duração e consequências não há ainda a noção", avançar "com cenários é sempre precipitado", mas Gonçalo Almeida aponta para o 4.º artigo do Regulamento de Competições da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, que baliza "a extensão e adiamento" das competições profissionais.

Fora desse âmbito, como "um desfecho antecipado da competição", o regulamento "nada diz", pelo que na eventualidade de se tornar "impossível terminar as duas voltas dos campeonatos profissionais", há uma omissão regulamentar.

Nesse prisma, o especialista em direito do desporto alerta para o facto de não existir "necessidade de se atribuir título ou estabelecer classificação para esta época desportiva", alertando antes para "a realidade já estabelecida", ou seja, a temporada anterior, para efeitos de apuramento para competições europeias.

"O fim da época anterior é uma realidade que já está definida. Qualquer critério que venha a ser articulado para atribuição de título ou promoção será sempre um critério que não está previsto na lei, não está regulamento, e será sempre subjetivo. Haverá quem concorde e não concorde, porque cada um tem os seus interesses, e isso é perfeitamente legítimo", adiantou.

O especialista referiu ainda que num momento em que "toda a matéria é omissa", há situações anteriores, como as duas guerras mundiais, em que a atividade desportiva esteve suspensa, e em casos de interrupção não houve lugar a qualquer definição de classificação.

"Não estando nada previsto, estar ‘a posteriori' a definir critérios que podem favorecer uns e não outros parece-me desnecessário. Se os regulamentos são omissos, não há necessidade de atribuir", completou.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da Covid-19, infetou mais de 210 mil pessoas em todo o mundo, das quais mais de 8.750 morreram.

Das pessoas infetadas, mais de 84.000 recuperaram da doença.

Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde (DGS) elevou hoje o número de casos confirmados de infeção para 642, mais 194 do que na terça-feira. O número de mortos no país subiu para dois.

A Assembleia da República aprovou hoje o decreto de declaração do estado de emergência que lhe foi submetido pelo Presidente da República com o objetivo de combater a pandemia de Covid-19, após a proposta ter recebido pareceres favoráveis do Conselho de Estado e do Governo.

O surto começou na China, em dezembro, e espalhou-se já por 170 países e territórios, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

Os países mais afetados depois da China são a Itália, com 2.978 mortes para 35.713 casos, o Irão, com 1.135 mortes (17.350 casos), a Espanha, com 558 mortes (13.716 casos) e a França com 175 mortes (7.730 casos).