“A FIFA entendeu por bem suspender esse regulamento até que o Tribunal de Justiça da União Europeia se pronuncie sobre a validade de algumas das suas normas. Mediante a decisão que for proferida, haverá ou não necessidade de o adaptar. Nesse contexto, em dezembro passado, a expectativa da FIFA era de, num prazo de aproximadamente meio ano, ter uma decisão”, enquadrou à agência Lusa Gonçalo Almeida, advogado e juiz da Câmara de Agentes do Tribunal de Futebol do organismo regulador do futebol mundial.
Aprovado em dezembro de 2022 pelo Conselho da FIFA, no Qatar, o documento entrou parcialmente em vigor em janeiro de 2023 e, na íntegra, desde outubro, com a entidade comandada por Gianni Infantino a promover um “instrumento equilibrado e razoável para proteger a integridade do futebol e o bom funcionamento do sistema de transferências”.
A diminuição da comissão máxima recebida pelos agentes com transferências e salários dos clientes, a proibição da representação múltipla ou a obrigatoriedade de licenciamento são algumas das novas medidas impactantes, cuja legalidade foi contestada pelo setor.
Em maio, numa das diversas ações judiciais apresentadas por agentes e associações de classe em toda a Europa, um tribunal de Dortmund, na Alemanha, deu provimento a uma providência cautelar e instou a FIFA a quebrar a execução de determinadas disposições.
“A FIFA faz referência a essa decisão preliminar através de uma circular publicada em 30 dezembro de 2023, tendo optado por suspender o novo regulamento em alguns pontos, nomeadamente em relação ao teto remuneratório e às regras de pagamento, tal como à proibição da dupla representação e à obrigação de reportar determinadas informações e operações à FIFA ou de se pagar as comissões via Câmara de Compensação, que, na realidade, ainda não está sequer operacional para esse efeito”, vincou Gonçalo Almeida.
O organismo sediado em Zurique, na Suíça, recorreu para o Tribunal de Justiça da União Europeia, mas manteve em vigor outras medidas, entre as quais a necessidade de cada candidato a agente cumprir uma prova de conhecimentos para poder obter uma licença.
“O objetivo da circular é evitar que haja mercados com regras diferentes para o exercício da profissão. As regras necessitam de ser transversais a nível mundial, de forma a evitar desigualdades e a consequente vantagem de alguns mercados sobre outros. Imagine-se que um agente não estaria sujeito a tetos remuneratórios num mercado específico. Iria, provavelmente, preferir concretizar um negócio com um clube dessa federação, na qual pode cobrar 10%, 15% ou mais [em comissões], em detrimento de uma outra jurisdição, onde o teto remuneratório e outras regras mais limitativas estejam em vigor”, comparou.
A “esmagadora maioria” das 211 federações-membro seguiu a recomendação da FIFA e suspendeu os artigos equivalentes aos seus regulamentos internos de agentes, salvo se entrassem em conflito com disposições imperativas decorrentes da legislação nacional.
O novo regulamento resultou de um processo de consulta complexo, que envolveu todas as principais partes interessadas do futebol mundial desde 2018, tendo sido ratificado em território luso pela direção da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) em junho do ano passado, apesar da divergência da Associação Nacional de Agentes de Futebol (ANAF).
“Houve sempre abertura e flexibilidade [da parte da FIFA]. Agora, ao não se chegar a um acordo, havia a necessidade de se avançar [com mudanças], sob pena de esta atividade, que é de importância vital para a indústria do futebol, manter-se desregulada”, recordou.
No verão de 2023, Gonçalo Almeida foi nomeado juiz da Câmara de Agentes do Tribunal de Futebol da FIFA e assumiu funções por um período de quatro anos nessa plataforma instituída pelo novo regulamento dos agentes para resolver litígios de cariz internacional.
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