Um velejador, ou velejadora, num barco de 18 metros, dão a volta ao mundo em solitário, dobrando três Cabos - Boa Esperança, Leewin e Horn -, sem escalas e assistências, sejam elas técnicas ou médicas. É, desta forma, que se carateriza sumariamente a Vendée Globe, a mítica regata planetária em solitário a bordo de um veleiro da classe IMOCA, monocasco de 60 pés, com partida e chegada a Les Sables d'Olonne, França, percorrendo 40.075 quilómetros (21.638 milhas) num período de tempo que pode variar entre os 70 e os 100 dias. Ou menos.

A 9ª edição de uma das mais desafiantes aventuras náuticas regista um recorde de inscritos na largada, a 8 de novembro, no porto da cidade costeira no oeste da França. Ao todo, 33 velejadores solitários, número que bate os 30 barcos da edição de 2008-2009. Quase triplica os 13 velejadores presentes na 1ª edição, a 26 de novembro de 1989, na qual, três meses depois, apenas sete deles deram à costa francesa.
Titouan Lamzou foi o primeiro a escrever o final feliz de uma boa história, valendo-se da experiência tida com o Boc Challenge, viagem de circum-navegação criada por mentes britânicas que precedeu a aventura francesa.

Seis mulheres numa aventura essencialmente masculina

Os recordes de 2020-2021 não se ficam pelo número de inscritos. Depois da estreia das velejadoras francesas, em 1996 (3ª edição), e da ausência, na última, em 2016-2017, seis skippers do sexo feminino apresentam-se agora na linha de largada. Um número tanto ou quanto impressionante se olharmos para o total de sete mulheres que anteriormente se aventuraram a abraçar sozinhas o mundo a bordo de uma embarcação.

Samantha Davies, 4ª, em 2009, regressa para a quarta travessia planetária, é uma das figuras de proa em prova, participando, nesta edição, ao lado do companheiro, ultrapassando anteriores constrangimentos logísticos familiares. “Ir ao mesmo tempo que Romain, o meu parceiro, é um sonho. Nas três edições anteriores, tivemos que fazer escolhas e, da última vez, para ser honesta, fiquei frustrada”, confidenciou.

Entre os inscritos da Vendée Globe incluem-se os veteranos Alex Thomson (Grã-Bretanha), que soma dois pódios (2012-2013 e 2016-2017) e compete pela 5ª vez, ou o francês Jérémie Beyou, que regressa para a sua quarta tentativa. “Se tivesse de apostar quão rápido será o barco a dar a volta ao mundo, diria 67 dias”, sublinhou, Alex Thomson, da equipa Hugo Boss,. “Por vezes sinto que esta corrida é a única coisa na minha vida. Ganhar valida todo o trabalho árduo, todos os sacrifícios nos últimos 20 anos”, acrescentou.

18 velejadores estreiam-se no percurso que parte do Atlântico Norte, contorna, à ida e à volta, o Anticiclone dos Açores, mergulha nas calmarias dos Doldrums, dobra o Cabo da Boa Esperança, entra no Oceano Índico, percorre os Mares do Sul, passa ao largo do Cabo Leeuwinm, no extremo sudoeste do continente australiano, enfrenta o Cabo Horn, ponto mais meridional da América do Sul, palco de severas e duras travessias, e sobe o Atlântico, de sul para norte, de regresso à casa de partida, a Les Sables d'Olonne.

De entre os “rookies”, destaque para Damien Seguin, velejador paralímpico francês, medalha de ouro em Atenas2004 e Rio2016, Kévin Escoffier, vencedor da Volvo Ocean Race ao bordo da equipa sino-francesa, Dongfeng, e vários vencedores de outras regatas francesas, a solo, como o Solitaire du Figaro, Transat Jacques Vabre, conhecida como a Rota do Café e a Route du Rhum.

Ao dotarem as embarcações dos instrumentos necessários, mais de um terço dos skippers estará umbilicalmente ligado ao acordo assinado com a Comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO. O propósito passa pela recolha de informação sobre os Oceanos e a atmosfera.

A internacionalização da regata idealizada pelo francês Philippe Jeantot tem ganho espaço nos anos mais recentes. Este ano, 10 velejadores (quase 30 % da frota) representam as cores da Grã-Bretanha, Suíça, Alemanha, Espanha, Itália, Finlândia, Austrália e Japão. O suíço Alan Roura, 27 anos, é o mais novo e compete pela segunda vez. O mais velho é Jean Le Cam, 61, que parte para a sua quinta participação.

Até à data, 167 velejadores fizeram esta regata que desafia os limites da resistência humana. Só 89 chegaram ao fim. Michel Desjoyeaux, o “professor”, é o único a vencer, por duas vezes.
Armel Le Cléac’h (74 dias, 3 horas e 35 minutos) foi o último vencedor da prova que se realiza de quatro em quatro anos. Um tempo que pode facilmente ser batido pela tecnologia incorporada nas novas máquinas voadoras.

Em janeiro de 2021 saber-se-á o nome do vencedor da Vendée Globe que erguerá o troféu de prata desenhado por Philippe Macheret.