Tudo começou no Desporto Escolar, e não é a única atleta nestas olimpíadas cuja história se conta desta forma. Também Jorge Fonseca (judo), Marta Pen (atletismo), Teresa Bonvalot (surf) ou José Paulo Lopes (natação) partilham esse início no seu currículo desportivo. De lá 'saltou' para a JOMA (Juventude Operária de Monte Abraão), depois de vencer uma prova de corta-mato e de despertar a atenção de José Uva, treinador que a acompanha até aos dias de hoje.

Com 12 anos ia para os treinos de comboio, sem bilhete e sem os seus pais saberem. Dizia-lhes que ia estudar para casa de uma amiga. "Os meus pais não tinham dado autorização, e eu arranjei a minha própria maneira de conseguir ir treinar porque era algo que eu queria muito. E ao mesmo tempo sabia que tinha de manter as notas na escola, e portanto nunca haveria problema, os meus pais nunca iriam descobrir que eu andava a treinar às escondidas", contou à Sábado.

Diz que sabia os truques para escapar ao 'pica' até ao dia que não o conseguiu e foi apanhada. Foi parar à esquadra de Massamá, onde os pais a tiveram de ir buscar, mas quem a 'salvou' foi o seu treinador. "Eu já na altura tinha muito talento, o meu treinador, coitado, também não sabia de nada, e então fez um pedido especial aos meus pais para que me deixassem continuar a treinar", recordou à publicação.

Patrícia Mbengani Bravo Mamona. Filha de angolanos, o apelido Mamona deve-o ao avô paterno e significa "visionário" (em quicongo, língua falada em várias províncias angolanas, como a de Uíge, de onde era natural o avô). Quando tinha 13 anos, o pai emigrou para Inglaterra e o resto da família juntou-se mais tarde. Patrícia ficou em Portugal por causa do atletismo e para terminar os estudos.

"O plano era acabar o 12º ano, eu ficava na casa dos meus tios e depois iria juntar-me a eles em Inglaterra. Entrei para Medicina, mas não conseguia conciliar o curso com o atletismo" (Expresso, 2021). Em 2008, com 17 anos, recebeu uma bolsa para ir para a Clemson University, na Carolina do Sul, e lá competiu no circuito universitário norte-americano.

Desde 2010 que representa as cores dos leões. "No Sporting, encontrei o sonho ou a ambição de me tornar uma grande atleta que representa o país", disse jornal i. Um ano depois regressa a Portugal. Deixou a Medicina e inscreveu-se em Engenharia Biomédica (no terceiro ano, a pandemia e o ciclo olímpico obrigaram-na a fazer uma pausa nos estudos).

"Queria ser veterinária e, depois, médica. Era uma criança extremamente ativa, mas nunca pensei em atletismo como profissão. A minha mãe é enfermeira e já me incutia o objetivo de salvar o próximo, até porque os meus pais não viam o atletismo como profissão" (jornal i, 2021).

O que ela saltou para a Tóquio chegar

Depois de ter estado infetada com Covid-19 durante quatro semanas, onde se questionou acerca de "coisas aparentemente simples" como se voltaria a correr ou saltar, sagrou-se campeã de Portugal no triplo salto em pista coberta pela oitava vez e conquistou a medalha de ouro na modalidade nos Europeus de Pista Coberta (Torun), fixando o recorde nacional desta variante em 14,53 metros.

Quatro meses depois, no triunfo na etapa da Liga de Diamante do Mónaco, aumentou em um centímetro o recorde que lhe tinha valido o sexto lugar no Rio2016, fixando a melhor marca nacional em 14,66.

Mamona conquistou assim a sua quarta medalha em grandes campeonatos, sempre no triplo: em 2016 foi campeã da Europa absoluta, depois de ter sido ‘prata’ em 2012, e em 2017 foi vice-campeã em pista coberta. Sem contar com quase duas dezenas de títulos nacionais absolutos.

Mas esteve perto de nem ir ao Campeonato da Europa. Uma série de testes à Covid-19 com resultados inconclusivos ia pondo em causa a qualificação para Torun, o último impedindo o voo para Madrid, para o meeting na capital espanhola. A solução? “Os treinadores são teimosos, então fomos de carro para Madrid”, contou Gonçalo Uva durante uma sessão organizada pelo Comité Olímpico de Portugal (COP) com vários treinadores de seleções nacionais.

Tem o hino nacional na sua playlist do Spotify. Nos EUA ganhou o hábito de o ouvir antes das competições, e assume que esse ritual mexe consigo. "Inspira-me, dá-me um sentido de responsabilidade, sinto que estou a fazer algo que vai para lá da minha pessoa. O hino tem de ser ouvido num momento especial, que nos dá arrepios", explicou ao Expresso.

Aos 32 anos cumpriu a terceira presença olímpica, depois do sexto lugar no Rio2016 e do 13.º em Londres2012. Em Inglaterra teve um apoio especial, a irmã, que se tinha inscrito como voluntária, e estava na câmara de chamada quando competiu. Ela e um velocista que alguns devem reconhecer o nome.

"Estava a meter o dorsal ao Bolt e disse-lhe para me dizer adeus. Tive a minha irmã e o Bolt a dizerem-me adeus e eu toda contente a entrar para a prova", recordou ao podcast do Sporting "ADN de Leão".

De Tóquio despede-se com uma medalha de prata e novo recorde nacional. Com a certeza de que é um até já. E salta Mamona, olé, olé!

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