Com a excitação - justificada! - em volta do futebol praticado pelo Manchester City de Pep Guardiola e com a falta de competitividade demonstrada neste início de época por parte de Chelsea, Tottenham, Arsenal e Liverpool, o foco da imprensa inglesa nos últimos dias parece ir todo para o alvo mais fácil: José Mourinho.

Ao invés de saudar a proximidade pontual e a distância de estilos de ambas as equipas de Manchester, os media britânicos parecem querer ignorar a primeira e focar-se apenas no lado ‘negativo’ da segunda. Assim sendo, não me resta outra alternativa senão fazer de advogado do diabo (neste caso, personificado pela imprensa na pessoa de José Mourinho) do treinador português.

E a verdade é que a imprensa inglesa não tem dado tréguas. Olhemos para alguns dos títulos dos últimos dias:

“SCORING, BORING” - MARCANDO, ABORRECENDO

Título no Sunday Mirror Sport com alusão à capacidade de marcar golos do Manchester City e ao futebol aborrecido do United.

“WHAT A SCORE! WHAT A BORE!” - QUE RESULTADO! QUE TÉDIO!

No Sunday People Sport, o destaque vai uma vez mais para a capacidade de concretização dos Citizens e o futebol monótono da equipa de José Mourinho.

“MOUR BORE” - MOUR (fazendo alusão ao nome Mourinho e à palavra MAIS) TÉDIO.

No Sunday Express é mais do mesmo: mais Mourinho, mais tédio.

“Welcome back, José… enemy of football” - Bem vindo de volta José, inimigo do futebol.

No Daily Mail a campanha chega ao ponto de dizer que o treinador português é um inimigo do futebol.

Esta é uma batalha que vem de há muito, mas que é agora extrapolada pela ‘chegada’ de Pep Guardiola. Se no ano passado ficámos desiludidos com a ausência de ambos os treinadores nos lugares de disputa pelo título, este ano as coisas estão diferentes. Podemos esperar uma autêntica guerra, ainda mais quando alimentada, a cada semana que passa, pela imprensa que parece já ter tomado partido a favor dos Citizens e do seu futebol espectáculo.

Uma lição

Na verdade, o jogo (e resultado) da passada semana frente ao Liverpool foi mais uma lição para a restante concorrência e, neste caso, para a imprensa. Quem vem dizer que José Mourinho "estacionou o autocarro" terá uma interpretação dessa mesma expressão diferente da minha. "Estacionar o autocarro" implica ser massacrado, não conseguir sair da sua própria área, sentir a aflição de sofrer um golo a qualquer instante. O que se passou no sábado passado foi bem diferente. José Mourinho não só analisou bem o adversário, como conhece a sua equipa como ninguém. Este United é uma equipa que, em sete jogos (agora oito) sofreu apenas dois golos e manteve a sua baliza inviolável por sete ocasiões.

Jogar em Anfield não é fácil para nenhuma equipa, independentemente da sua qualidade. Para contextualizarmos, o United de Sir Alex Ferguson, nas últimas seis ocasiões em que visitou os Reds saiu de Anfield com um saldo de uma vitória, um empate e quatro derrotas.

Este United não foi um United desesperado. Foi um United confortável no seu papel mais defensivo, que dominou, não o jogo, mas os acontecimentos, como nos habituou o estratega José Mourinho ao longo dos anos.

Num jogo com quatro oportunidades, duas para cada lado, é mais fácil para Jürgen Klopp colocar a culpa na passividade do adversário e não na sua falta de assertividade no que a substituições diz respeito. Afirmando que todas as suas substituições foram positivas, Klopp não quer encarar a realidade. Todas as suas substituições foram posição por posição, uma vez que o técnico alemão retirou o trio atacante (Coutinho, Salah e Firmino) e colocou homens mais frescos (Chamberlain, Sturridge e Solanke). Contudo, Klopp esperou até ao minuto setenta e oito - repito, setenta e oito - para tentar dar algo de novo ao jogo. Porque não mexeu antes e de forma diferente na equipa? Por falta de confiança.

Já aqui o disse por diversas ocasiões: jogando com quatro jogadores de pendor ofensivo, o Liverpool expõe a sua defesa a inúmeros riscos, com os quais não consegue lidar (acabando, normalmente, por sofrer golos). Não tendo qualquer golo marcado após o minuto setenta e sete nesta edição da Premier League, e sabendo de antemão que o United fez dez dos seus vinte e um golos depois dos oitenta minutos de jogo, o Liverpool poder-se-ia dar por satisfeito com o empate. Klopp foi astuto e cauteloso, mexeu como podia e não entrou em loucuras. É o seu papel criticar e sacudir a pressão para o adversário, mas este não deveria ser o papel da imprensa.

Superioridade ou ilusão?

De lembrar que este é um Liverpool com treze golos marcados e doze sofridos, enquanto que do outro lado está um United focado no título, com vinte e um golos marcados e apenas dois sofridos. Jürgen Klopp está, a meu ver, a mostrar uma falta de ambição enorme, e com o passar do tempo parece não ser a opção ideal para reavivar o monstro adormecido que é o Liverpool. “Hoje recebemos um candidato ao título e não estamos a milhas deles, conseguimos jogar e ser superiores” disse o técnico alemão, deixando escapar que o Liverpool não tem capacidade para lutar pelo título e, pior que isso, pensando que jogou de igual para igual quando conseguiu ‘apenas’, na minha opinião, não cair na ratoeira que José Mourinho lhe colocou à frente.

A equipa não tem rendido o suficiente, o mercado de transferências mostrou-se ineficaz e Klopp, que “se não ganhasse o campeonato durante 125 anos, nunca jogaria assim”, está a entrar num beco sem saída. Ainda para mais, do outro lado teve pela frente um United sem soluções para o meio campo. "Com Carrick, Pogba e Fellaini lesionados, o meio campo do Liverpool foi superior”, disse Mourinho.

O treinador português disse ainda que no jogo de xadrez da segunda parte esperava que o Liverpool, jogando em casa, arriscasse mais, retirasse um dos jogadores fortes (fisicamente) de meio campo e com isso, conseguir contra-atacar, ‘partir’ o jogo e esperar que Lingaard e Rashford decidissem. José Mourinho sabe igualmente que sem o trio ‘todo o terreno’ (Wijnaldum, Henderson e Can), o Liverpool acabaria por ceder.

A moral da história é que os Reds, sendo uma equipa perigosa quando motivada e com espaço, tinha apenas uma vitória nos últimos sete jogos oficiais antes de defrontar o United, pelo que a estratégia apresentada por José Mourinho foi perfeita. O Liverpool deveria ter ido em busca da vitória e, com o decorrer do jogo, nunca desequilibrou o seu esquema táctico. Sem muito mais soluções, e sem que Lukaku e Mkhitaryan se exibissem ao nível habitual, o United fez um excelente jogo e conseguiu um precioso ponto num terreno difícil. Com um pouco mais de "loucura" por parte do alemão, e os Red Devils teriam tido mais oportunidades, o jogo ter-se-ia partido e o resultado poderia muito bem ser favorável à equipa forasteira.

O futebol do United

Durante toda a semana foram muitos os orgãos de comunicação que fizeram questão de sublinhar a falta de pontos que Mourinho conseguiu nos últimos dez jogos fora de casa contra as equipas do Top-6. Na verdade, este é o melhor United desde a era Ferguson e estará, muito provavelmente, na corrida pelo título até ao fim.

A tentativa de desestabilização do técnico é constante e não terá tendência a abrandar. Contudo, o facto de a imprensa estar contra José Mourinho é normalmente utilizado pelo técnico como um estimulante para unir ainda mais a equipa em seu redor.

Em breve, e com a pressão a acumular, esperar-se-ão movimentações de bastidores por parte do técnico. Um deles teve lugar na última terça-feira, aquando de uma entrevista dada a um órgão de comunicação social francês. Mourinho, expressando-se em francês, disse com todas as letras que não acabaria a sua carreira no Manchester United - aludindo a uma eventual ida para o PSG -, desde logo colocando pressão no clube, nos media, e na própria Premier League.

O treinador português poderá não ser insubstituível no futebol inglês. Mas sem ele, esse mesmo futebol tem muito menos interesse e todos, principalmente a imprensa, perdem com isso.

Esta semana na Premier League 

Aproximamo-nos em passo acelerado para o primeiro quarto do campeonato e a 9.ª da Premier League tem vários motivos de interesse. Com os rivais de Manchester a repetirem a dose, isto é, o City a jogar em casa (frente ao Burnley) e o United fora (desloca-se ao terreno do Huddersfield), o maior interesse vai mesmo para a visita do Watford de Marco Silva ao terreno do campeão Chelsea no sábado, e para os jogos de domingo com escaldantes Everton vs. Arsenal e Tottenham vs. Liverpool.

Pedro Carreira é um jovem treinador de futebol que escolheu a terra de sua majestade, Sir. Bobby Robson, para desenvolver as suas qualidades como treinador. Tendo feito toda a sua formação em Inglaterra, passou por clubes como o MK Dons e o Luton Town, e também pela Federação Inglesa, o seu sonho é um dia poder vir a treinar na melhor liga do mundo, a Premier League. Até lá, pode sempre acompanhar as suas crónicas, todas as sextas, aqui, no SAPO 24. E não se esqueça que poderá sempre juntar-se à nossa liga SAPO 24 na Fantasy Premier League. O código de acesso é o 3046190-707247.