Entre as propostas, identificam-se convergências na necessidade de a opção pelo teletrabalho depender de acordo com o trabalhador, de acautelar as questões de privacidade, de prever que os acidentes que aconteçam em casa, quando em teletrabalho, possam ser considerados acidentes de trabalho e na garantia da igualdade de tratamento entre os trabalhadores “à distância” e aqueles que estão presencialmente.

Contudo, há ainda muitos pontos divergentes entre as propostas dos partidos, destacando-se o pagamento das despesas dos trabalhadores em teletrabalho com a eletricidade, a água ou as telecomunicações.

Se todos os proponentes concordam com o princípio geral da necessidade de compensar estas despesas, há diferenças claras quer na fórmula de cálculo quer na garantia que a lei dará na obrigatoriedade do pagamento.

BE

  • Altera o regime jurídico-laboral de teletrabalho, garantindo maior proteção do trabalhador

À Lusa, o deputado bloquista José Soeiro explicou que o essencial é “tornar obrigatória a compensação do acréscimo de despesas dos trabalhadores que estão em teletrabalho”.

“Em segundo lugar, ter uma regulação muito mais forte da questão dos horários de trabalho porque não podemos aceitar que à boleia do teletrabalho se generalize a ideia que quem trabalha em casa não tenha um horário de trabalho”, acrescentou, pretendendo eliminar o vínculo atualmente existente entre teletrabalho e isenção de horário.

O BE quer ainda que tenha direito a estar em teletrabalho quem tenha filhos ou outros dependentes a cargo menores de 12 anos e ainda, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica ou também no caso de trabalhador que seja cuidador não principal de pessoa dependente.

Os bloquistas defendem que todas as normas relativas ao teletrabalho sejam imperativas e quer ainda consagrar o dever de a entidade empregadora respeitar o “tempo de desconexão profissional”, prevendo que a violação reiterada desse dever constitua indício de assédio.

PCP

  • Regula o regime de trabalho em teletrabalho

Entre as propostas dos comunistas está um valor fixo de ajudas de custo no valor de 2,5% do Indexante de Apoios Sociais (IAS) por dia em teletrabalho, ou seja, cerca de 11 euros diários atualmente, “para compensar o trabalhador pelos gastos acrescidos, nomeadamente com comunicações, eletricidade, água, entre outros”, defendendo ainda que responsabilidade de disponibilizar e instalar instrumento de trabalho é da entidade patronal.

À Lusa, o PCP explicou que pretende que, “a qualquer momento, o trabalhador possa regressar ao posto de trabalho na empresa” ou mesmo rejeitar laborar à distância sempre que considere não ter condições para o fazer.

Entre as propostas dos comunistas está ainda que “o horário de trabalho, em regime de teletrabalho, não se inicie antes das 8 horas e não termine depois das 19 horas” e que “qualquer trabalho suplementar a realizar pelo trabalhador em teletrabalho seja solicitado por escrito pela entidade patronal”.

Não inscrita Cristina Rodrigues

  • Garante o direito dos trabalhadores à desconexão profissional e reforça os direitos dos trabalhadores em regime de teletrabalho

A deputada não inscrita Cristina Rodrigues decidiu avançar com dois projetos de lei distintos e, em matéria de teletrabalho, a deputada prevê um acréscimo remuneratório para pagamento do aumento das despesas do trabalhador, nomeadamente as relacionadas com o consumo de água, eletricidade, internet e telefone.

A proposta é que o valor seja mensal e acordado com o empregador, “não podendo ser inferior a 10% do valor do IAS”, ou seja, quase 44 euros por mês.

A deputada quer ainda dar ao trabalhador direito de preferência para optar por este regime quando tenha deficiência ou doença crónica, filhos de idade igual ou inferior a 12 anos ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica.

PEV

  • Altera o código do trabalho com vista a regular o teletrabalho

O pagamento ao trabalhador, por parte da empresa, de custos acrescidos relacionados com o teletrabalho é uma das prioridades de “Os Verdes”, que sugerem o pagamento de “1,5% do salário mínimo nacional, por cada dia de trabalho prestado”, ou seja, quase 10 euros diários.

O PEV também quer que os trabalhadores com filhos, ou outros dependentes a cargo até aos doze anos, com deficiência ou com doença crónica, bem como os cuidadores, os cidadãos portadores de deficiência ou de doença crónica, ou os trabalhadores-estudantes tenham o direito de solicitar, por iniciativa própria, a prestação de trabalho em regime de teletrabalho;

Os Verdes querem ainda que “o trabalhador não veja desregulado o seu horário de trabalho e que seja assegurado o seu tempo livre e o direito ao desligamento do trabalho”.

PS

  • Procede à regulação do teletrabalho 

Na apresentação do projeto de lei, a líder parlamentar socialista, Ana Catarina Mendes, explicou que este diploma "não acrescenta nem densifica no Código de Trabalho os sete artigos que estão desde 2013 inscritos para definir o regime do teletrabalho".

O PS optou assim por um diploma complementar para “responder à necessidade de igualdade de tratamento”, baseando-se “essencialmente no acordo entre as partes, o empregador e o trabalhador", tendo em vista a opção pelo teletrabalho.

O acordo deve definir claramente que “o empregador assegura os equipamentos e sistemas necessários à realização do trabalho”, defende o PS.

Em termos de despesas adicionais que, “comprovadamente, o trabalhador suporte em direta consequência da aquisição e do uso de equipamentos na realização do trabalho”, estas devem ser compensadas pelo empregador.

O acordo deve fixar “o horário dentro do qual o trabalhador terá o direito de desligar todos os sistemas de comunicação com o empregador”, debruçando-se ainda na igualdade de tratamento em relação aos outros trabalhadores, ou seja, os mesmos direitos e deveres para os trabalhadores que esteja em teletrabalho.

PAN

  • Regulamenta o teletrabalho no setor público e privado, cria o regime de trabalho flexível e reforça os direitos dos trabalhadores em regime de trabalho à distância e consagra o direito de desconexão profissional

O PAN terá em discussão dois projetos lei distintos, um sobre direito a desligar e outro sobre teletrabalho.

No caso do teletrabalho, o PAN prevê um abono de ajudas de custo, a pagar mensalmente, de pelo menos 2,5% do valor do IAS por cada dia de trabalho prestado à distância, ou seja, o valor o pagar por dia não poderá ser inferior a 10,97 euros.

O PAN quer ainda um reembolso das despesas de aquisição e de instalação dos instrumentos de trabalho mediante compensação pecuniária de valor não superior a três vezes o valor do IAS”, ou seja, não poderá ultrapassar os 1316,43 euros.

O partido quer ainda que o regime de teletrabalho seja alargado aos “trabalhadores com filho ou dependente menor de 12 anos, menor de idade com doença oncológica ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica”, propondo que os trabalhadores que morem a mais de 50 quilómetros do local de trabalho possam também ficar a laborar à distância.

PSD

  • Altera o regime jurídico-laboral do teletrabalho

O PSD defende que “as despesas acrescidas relativas ao teletrabalho serão pagas conforme estabelecido no contrato de trabalho ou em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho”, abrindo a porta à definição de critérios e montantes a pagar, “designadamente através de um valor certo pecuniário, a entregar ao trabalhador em regime de teletrabalho”.

No entanto, na proposta dos sociais-democratas, estas despesas pagas pela entidade patronal devem ser consideradas, para efeitos fiscais, custos para as empresas e não rendimentos para o trabalhador.

A reserva da vida privada do trabalhador e acautelar situações de acidentes de trabalho, introduzindo a flexibilização do conceito de local de prestação de trabalho, são outras das propostas do PSD.

CDS-PP

  • Consagra o Direito ao Desligamento

Os centristas optaram por se focar num direito “fundamental do trabalhador que não está consagrado no Código do Trabalho de forma explícita e que se prende com o direito ao desligamento”.

“Qualquer trabalhador tem que ter direito a poder dispor de períodos do dia em que não tenha de estar disponível para a entidade empregadora e em que pode utilizar o tempo apenas para seu bem pessoal”, defende.

Assim, para os centristas “deve ficar explicitamente consagrado no Código do Trabalho o direito de o trabalhador dispor de ‘tempos mortos’, nos quais poderá desconectar-se”, recordando que em 2017 inovou com uma iniciativa legislativa que falava “pela primeira vez, do direito ao desligamento”, mas que foi rejeitada com o voto de toda a esquerda.

Propostas com olhos postos em avanços na especialidade

O agendamento deste tema partiu do BE, tendo PS, PSD, PCP, CDS-PP, PAN, PEV e a deputada não inscrita Cristina Rodrigues arrastado as suas iniciativas sobre teletrabalho e direito a desligar para o debate, podendo os projetos ser votados ou haver o pedido dos partidos para baixar, sem votação, à comissão, prosseguindo depois o trabalho legislativo na especialidade com todas as iniciativas em “cima da mesa”.

Fonte oficial do Governo adiantou à agência Lusa que, da parte do executivo socialista, estarão no debate na Assembleia da República os secretários de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita, e da Administração Pública, José Couto.

À Lusa, apenas o PSD, através da deputada Clara Marques Mendes, confirmou já que o partido vai pedir a baixa à comissão sem votação, uma vez que não “decorreu ainda o prazo de apreciação pública”, concordando que terá sentido, “havendo várias iniciativas sobre a mesma matéria, fazer aquilo que já tem acontecido no passado, que é as iniciativas serem discutidas, na especialidade, no seu conjunto”.

A líder parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, assegurou à Lusa que o partido está disponível para melhorar o documento em sede de especialidade, num trabalho “conjunto para encontrar uma solução equilibrada da regulamentação do teletrabalho”, rejeitando que esta seja “uma discussão sectária”, mas sim “abrangente e realista”.

“No parlamento, cada vez mais, devemos ser capazes de fazer as pontes necessárias. É uma legislação muito importante, que interfere diretamente na vida das empresas e das pessoas e por isso todos os consensos e o máximo de consenso possível é absolutamente necessário”, defendeu a socialista.

Já o BE, pelo deputado José Soeiro, aponta que o agendamento do partido “já teve o efeito de fazer com que os vários partidos venham a jogo”, esperando que “possa haver uma alteração à lei do trabalho para dar maior proteção aos trabalhadores que optem pelo teletrabalho” e que o debate de quarta-feira “seja o início de processo de especialidade que possa dar frutos”.

“Apesar de haver algumas zonas de convergência, existe uma grande clivagem entre os projetos. Por um lado, entre o projeto do PS e do PSD que não preveem a obrigatoriedade da compensação aos trabalhadores e fazem com que as normas que propõem não sejam imperativas e depois há um conjunto de outros projetos, do BE - o primeiro a apresentar - mas também do PCP, PAN e do PEV que preveem um conjunto de normas que são obrigatórias, que são imperativas, que a lei passa a definir como sendo direitos do teletrabalhador”, comparou.

Já o PCP, pela voz de Diana Ferreira, rejeita o "endeusamento" do teletrabalho e “não abdica de intervir para salvaguardar os direitos dos trabalhadores” nesta situação.

“Quanto à questão do debate na especialidade, este terá sempre lugar quer seja com iniciativas aprovadas na generalidade, quer seja com a baixa das iniciativas sem votação. Da parte do PCP não excluímos nenhuma possibilidade e estamos disponíveis para o debate na especialidade que aprofunde a discussão sobre a matéria", adiantou a comunista.

O CDS-PP, pelo deputado Pedro Morais Soares, lamenta que as propostas que apresentou em 2017 para regulamentar o teletrabalho tenham sido chumbadas, explicando que a proposta agora apresentada “do direito ao desligamento também surge no seguimento de recomendações do Parlamento Europeu à Comissão Europeia no sentido de legislar sobre esta matéria”.

“Se os partidos entenderem baixar à comissão no sentido de tentar encontrar um texto conjunto, o CDS está cá porque urgente é regulamentar o teletrabalho”, assegurou.

À Lusa, o PEV “põe a hipótese do seu projeto baixar sem votação, caso esteja em risco de ser rejeitado, por forma a possibilitar ser trabalhado em conjunto com outros projetos”.

Já Cristina Rodrigues assegura que, em caso de votação, viabilizará as restantes iniciativas, apesar de terem soluções diferentes, para que, “em sede de especialidade, se possa fazer um debate aprofundado” que “reforce os direitos dos trabalhadores em teletrabalho e que garanta o direito de todos os trabalhadores à desconexão profissional”.

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