Desde a crise financeira que a consolidação bancária (incluindo transfronteiriça) vem sendo um tema recorrente na União Europeia, com os argumentos favoráveis de que os bancos se tornam mais rentáveis, mais sólidos, com mais escala para competir internacionalmente e que reforça a estabilidade do setor.

O Banco Central Europeu (BCE) tem mostrado abertura pela consolidação bancária. No seu ‘site’, o Mecanismo Único de Supervisão diz que tem uma “posição neutral” sobre casos concretos, mas que a consolidação “pode desempenhar um papel importante na eliminação do excesso de capacidade, no aumento da eficiência de custos e na promoção de modelos de negócio mais focados e credíveis” e contribuir para a integração dos mercados financeiros (um dos objetivos da União Bancária).

Para o economista António Nogueira Leite é preciso um equilíbrio entre, por um lado, uma supervisão adequada das atividades bancárias (provavelmente facilitada quando há menos entidades) e diminuição de risco sistémico e, por outro lado, a importância de manter a concorrência.

O antigo vice-presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) defende que não se deve esquecer que a razão da banca é financiar empresas e famílias e que a relação bancária tem uma componente regional/nacional muito forte.

“Para haver uma boa repartição da atividade bancária entre banqueiros e clientes é bom que haja escolha. Se continuarmos a ter um mercado mais concentrado quem ganha com isso são os banqueiros”, disse à Lusa o ex-secretário de Estado de Governo PS de António Guterres e que tem aconselhado o PSD.

Já sobre a necessidade de haver grandes bancos pan-europeus para concorrer a nível internacional (sobretudo com norte-americanos), Nogueira Leite considerou que não é com a concentração de bancos e de retalho que permitirá esse salto.

Para o professor de economia do ISCTE Sandro Mendonça, a União Europeia (UE) tentar ganhar escala pela flexibilização da política da concorrência e por concentrações de empresas é um risco e sobretudo para países mais pequenos, como Portugal.

“Significa um grande risco de subalternização de interesses do país perante esta visão central de consolidação pois os nossos operadores não têm escala para absorver os outros”, afirmou à Lusa.

Sandro Mendonça considerou que na UE há uma “dissonância cognitiva” quanto às ideias sobre o setor bancário e financeiro. Em Bruxelas/Frankfurt consideram que é necessário mais mercado pois traz mais concorrência e é benéfico e, por outro lado, há “abertura de espaço a uma certa monopolização” por poucas empresas.

“Há esta ideia de política de concorrência versus política de competitividade e há grande tensão neste sentido”, avaliou.

Da parte das associações de consumidores, também há receios de excessiva concentração do setor bancário.

O economista da Deco Vinay Pranjivan recordou que a teoria económica relaciona mais poder de mercado com menos concorrência. Em Portugal, mais de 70% do mercado bancário está em mãos de cinco entidades pelo que, caso o Novo Banco (é conhecido que o acionista Lone Star quer vender) vier a ser adquirido por um banco forte já presente, isso significaria que o mercado ficaria dominado por quatro bancos, o que considerou preocupante.

O economista da Deco disse que o poder de mercado atualmente existente se notou recentemente na transmissão da política monetária, com rápida subida das taxas de juro do crédito e lentidão nas taxas de juro dos depósitos.

Recordou ainda as multas de 225 milhões de euros que a Autoridade da Concorrência aplicou a 11 bancos por prática concertada de informação sobre créditos entre 2002 e 2013.

“O grande risco da concentração bancária é a menor capacidade negocial dos clientes de retalho [particulares e empresas mais pequenas] e menor incentivo à inovação tecnológica”, disse, acrescentando que no mercado de pagamentos a legislação europeia e o surgimento de novos operadores (como Revolut) têm tornado o mercado mais concorrencial.

Além disso, a concentração também acarreta riscos de cortes de agências e de empregos.

A associação europeia de defesa do consumidor Ius, que tem um processo em Portugal contra os bancos acusados pela Autoridade da Concorrência (o caso conhecido como ‘cartel da banca’ ainda está em julgamento dos recursos apresentados pelos bancos), considera que o “o mercado bancário já é muito concentrado e tem um historial de concertação” pelo que “qualquer concentração adicional tem o potencial de ser negativa para os consumidores” e deve ser analisada cuidadosamente.

Também em Espanha as associações de consumidores têm manifestado muitas preocupações pela Oferta Pública de Aquisição (OPA) do BBVA ao Sabadell, alertando que a concentração do mercado bancário tende a resultar em menores juros nos produtos de aforro, mais comissões e mais dificuldade em que pequenos negócios se financiem. Falam ainda em cada vez mais gente em exclusão financeira devido ao perspetivado fecho de agências e despedimento de trabalhadores.

A concentração no sistema bancário português tem aumentado desde os anos de 1990. Dados do BCE relativos à proporção de ativos bancários detidos pelos cinco maiores bancos de cada país, indicam que em Portugal esse valor era de 72% em 2022. Em Espanha, essa concentração era de 70%.