"Depois disto [pandemia], o que é que vai acontecer com a economia? Tragédia”, afirmou numa entrevista à Lusa o antigo Presidente do Brasil, considerando que “nessas horas é preciso que haja políticas anticíclicas" de incentivo a procura interna e externa para relançar o crescimento da economia.

Um cenário que na sua opinião vai exigir dos que comandam os destinos do país “coordenação, sobretudo para pensar no já e no depois. E o depois começa já. E preparar o momento da retomada”. Além disso, é preciso "sangue frio" de Presidente e ministros, sublinhou.

Porque, "nestas horas, todo o mundo tem de usar o dinheiro. Não tem dinheiro, aumenta a dívida, e o endividamento vai crescer", acrescentou.

"O Congresso já aprovou uma medida que achei positiva, para dar recurso a quem não tem recursos. Pega milhões de pessoas e dá um mínimo por mês. Qual é a dificuldade? É a operacionalização", explicou, referindo-se a um subsídio de 600 reais (cerca de 120 dólares), que abrange cerca de 38 milhões de brasileiros, que ainda não foi pago

“Isso já está a aumentar a dívida pública. Então nós vamos ter uma dificuldade grande de retomar o crescimento, num momento em que se tem um endividamento alto. Estava baixando, mas agora vai subir", lamentou.

Para o antigo presidente do Brasil vai ser "difícil" o atual governo dar a volta a esta situação económica, até porque a pasta da economia está nas mãos de um ministro formado pela universidade de Chicago, “ou seja, que acredita no mercado".

"Ele [ministro] tinha um programa de austeridade e com boas reformas. Mas neste momento não se pode falar mais em austeridade. Tem de ser o governo a atender, tenha ou não tenha recursos (…). As reformas agora vão ficando à margem”, disse.

Para o antigo Presidente do Brasil, a economia brasileira assenta basicamente em matérias-primas - "agricultura e mineração" exportadas “especialmente para a China, mas não só".

A existência de um setor financeiro forte também ajuda: “A dívida pública do Brasil não depende de estrangeiros (...). Os nossos bancos são fortes, temos capacidade de financiamento".

Mas agora é o momento de injetar o dinheiro na economia.

É preciso “dar dinheiro para as pessoas que não tem emprego, porque elas vão ter de comer, vão ter de viver. Mas tem também de fazer prorrogar a dívida das empresas, porque não vão ter condições de pagar".

Neste contexto, "é importante ter o Bolsa Família [programa criado por Lula da Silva, seu sucessor na presidência do Brasil] e tem de se expandir, quer queiramos ou não, porque as pessoas vão perder emprego”.

Além desta política, o país vai precisar "mais do que nunca de uma bolsa universal", conhecido como rendimento básico universal.

Até porque a queda do emprego vai resultar da automatização do trabalho e não apenas por causa da crise. A bolsa universal vai ser importante (…) e não é só agora, por causa da crise no Brasil. O mundo todo está a passar por uma transformação muito grande” e as pessoas “não vão ter como viver sem uma muleta financeira” que venha dos governos.

A crise financeira que se avizinha no Brasil poderá ser ultrapassada com as reservas nacionais de moeda.

“Temos 380 mil milhões de dólares de reserva é mais do que necessário. Por isso, por enquanto não iremos precisar de apoios do FMI. Mas para ativação da economia vamos precisar de capital, o capital pode ser local, mas muito vem do estrangeiro também", disse.

Nos próximos meses, o FMI vai ter de despejar dinheiro e o banco mundial também, acrescentou. Mas sobretudo "vai ter de haver um plano de reativação da economia, não é para já, mas é para daqui a pouco", sublinhou.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) antecipou na última semana que a pandemia da covid-19 fará o Brasil ter uma recessão económica de 5,3% este ano, recuperando em 2021 para um crescimento de 2,9% do PIB.