A posição consta de um relatório sobre o futuro do mercado interno da UE, ao qual a agência Lusa teve acesso e que será apresentado aos líderes europeus no Conselho Europeu que decorre entre hoje e quinta-feira em Bruxelas, no qual Enrico Letta sugere “um mercado comum da indústria da defesa” para “promover a paz e reforçar a segurança”.
No documento, o também presidente do Instituto Jacques Delors salienta que, no espaço comunitário, “está a ganhar terreno um intenso debate sobre a questão das euro-obrigações de defesa”, que a seu ver pode servir para “mobilizar rapidamente recursos significativos, por um lado, e promover o desenvolvimento de projetos de colaboração, por outro, facilitando assim uma transição gradual para um mercado unificado”.
Ainda assim, devem existir “determinadas condições para atenuar as preocupações legítimas quanto à adoção desta obrigação financeira partilhada”, argumenta Enrico Letta, pedindo por exemplo “planos de reembolso claros” e “estratégias viáveis para aumentar os recursos financeiros próprios da UE”.
O relatório surge numa altura em que se estima que os Estados-membros necessitem de 100 mil milhões de euros para responder às lacunas de investimento em defesa e segurança e para reforçar a capacidade e apoiar a Ucrânia devido à invasão russa, iniciada em fevereiro de 2022.
Depois de uma emissão de dívida conjunta bem-sucedida aquando da covid-19, que permitiu suportar os Planos de Recuperação e Resiliência (PRR), discute-se agora repetir essa iniciativa na UE para obter os recursos orçamentais necessários para reforçar a indústria de defesa, algo que era impensável antes da invasão russa da Ucrânia.
Outra das medidas sugeridas por Enrico Letta é a utilização do Mecanismo Europeu de Estabilidade para um “uma linha de crédito especializada para as despesas de defesa nacional”, semelhante ao instrumento de crédito em condições favoráveis destinado a ajudar os países do euro a cobrir as despesas de saúde relacionadas com a crise pandémica.
“À semelhança do quadro de apoio à crise pandémica, esta linha de apoio à defesa poderia conceder empréstimos até 2% do PIB [Produto Interno Bruto] de um país a taxas de juro excecionalmente favoráveis, especificamente destinados a despesas de defesa e segurança”, propõe o antigo primeiro-ministro italiano, sugerindo que “o único critério para aceder a esta facilidade de crédito seja um compromisso formal do Estado-membro requerente de afetar os fundos exclusivamente aos esforços de defesa nacional”.
Além desta instituição financeira, Enrico Letta recomenda uma “capacitação do BEI” para colmatar o défice de investimento na defesa e reforçar as capacidades militares comuns da UE, quando este banco da União está impedido de apoiar diretamente atividades de defesa, podendo apenas fazê-lo com bens de dupla utilização (como ‘drones’).
Para o responsável, urge também promover o investimento privado e público em defesa.
“Na nova desordem mundial, caracterizada por uma instabilidade profunda e sistémica, o futuro da UE não pode ignorar a necessidade de garantir a segurança dos cidadãos europeus e isso implicará posições e decisões mais exigentes no domínio da defesa”, adianta Enrico Letta.
Precisamente depois da covid-19, a UE dispõe hoje de 33 biliões de euros em poupanças privadas, predominantemente detidas em moeda e depósitos, pelo que o especialista aconselha ainda à “criação de uma União da Poupança e do Investimento, desenvolvida a partir da incompleta União dos Mercados de Capitais”.
O objetivo seria “não só manter as poupanças privadas europeias na UE, mas também atrair recursos adicionais do estrangeiro”, adianta Enrico Letta, concluindo que poderia haver “uma ligação direta entre o financiamento das transições justa, ecológica e digital”.
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