O Movimento Cultural Terra de Miranda (MCTM) — que alertou publicamente para o facto de o Governo estar a dar aquilo que a deputada Mariana Mortágua do Bloco de Esquerda veio a definir como "uma borla fiscal" à EDP, no negócio da venda das barragens transmontanas  de Miranda, Bemposta, Picote, Baixo Sabor e Foz-Tua à Engie — defendeu hoje que a sede social da MOVHERA, que comprou seis barragens por 2,2 mil milhões de euros na bacia hidrográfica do Douro, deve ficar no território onde estão instaladas estas estão instaladas e não no Porto.

"Foi anunciado, quer pelo ministro do Ambiente, quer pela própria empresa concessionária das seis barragens que a sede operacional da empresa ficaria na Terra de Miranda. Eu não sei o que é uma sede operacional. A sede administrativa é o referencial para o pagamento de impostos", disse hoje à Lusa Aníbal Fernandes, um dos membros do MCTM.

Em comunicado, o MCTM questiona se estamos perante "mais um embuste" e refere que "a Movhera 1 - Hidroelétricos do Norte é a empresa detida pelo consórcio francês liderado pela Engie que comprou seis barragens no rio Douro à EDP por 2,2 mil milhões de euros e tem a sede no Porto e não em Trás-os-Montes".

Para o MCTM, tal sugere que a Movhera 1 “só pretende tirar proveito da riqueza gerada na Terra de Miranda pelos nossos recursos naturais e não está interessada em comprometer-se com o desenvolvimento da região”, o que “é incompreensível".

O Movimento insta o Governo a que obrigue a Movhera 1 a cumprir a condição da qual o próprio Governo fez depender a sua autorização de venda das barragens, que é a instalação da sua sede na Terra de Miranda.

Aníbal Fernandes disse que se está a utilizar "a semântica para tirar o mais possível da Terra de Miranda desta três barragens que são muito rentáveis [Miranda do Douro, Picote e Bemposta].

"Querem levar todos os dividendos e apenas deixar os impactos ambientais negativos resultantes da construção deste três empreendimentos hidrelétricos", vincou.

Para o MCTM, a Terra de Miranda vai continuar a ser espoliada, não só da imensa riqueza produzida pelos seus recursos, como também de milhões de euros em receitas fiscais, incluindo as provenientes dos impostos municipais.

"É inaceitável, já que essas receitas resultam da riqueza gerada com a exploração dos aproveitamentos hidroelétricos do Douro", frisou.

Para o MCTM, o negócio devia ter-se traduzido em 110 milhões de euros em impostos, a entregar às regiões abrangidas pelas barragens na bacia hidrográfica do Douro.

"O Governo deve 110 milhões de euros à Terra de Miranda (Miranda do Douro, Mogadouro e Vimioso) provenientes do imposto de selo gerado pela transação", justificou Animal Fernandes.

O que está em causa

O negócio da venda de seis barragens da EDP, no Rio Douro, ao consórcio liderado pela Engie, por 2,2 mil milhões de euros, tem suscitado polémica, não ter pago Imposto do Selo (IS), avaliado em 110 milhões de euros.

Em 13 de novembro de 2020, foi anunciado que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) tinha aprovado a venda de barragens da EDP na bacia hidrográfica do Douro (Miranda, Bemposta, Picote, Baixo Sabor e Foz-Tua) à Engie.

Em 23 de novembro, o parlamento aprovou uma proposta do PSD de alteração ao Orçamento do Estado para 2021 (OE2021) para a criação de um fundo com as receitas do trespasse da concessão de seis barragens.

A venda — por 2,2 milhões de euros — foi concluída a 17 de dezembro e foi feita a um consórcio de investidores formados pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova, mas não terá sido pago o Imposto do Selo (IS), que reverteria para este fundo, o que foi contestado pelo Movimento Cultural da Terra de Miranda (MCTM) ainda no último mês de 2020.

O caso tem vindo a ganhar visibilidade pública e política desde então, com Bloco de Esquerda e PSD a questionarem o Executivo de António Costa sobre o papel do Governo — ou a escusa do governo em atuar —  no sentido de garantir que a empresa pagava todos os impostos devidos do negócio.

Já este ano, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) disse a 23 de março ter solicitado à Parpública a análise das condições contratuais, nomeadamente as de natureza financeira, sobre a venda de barragens pela EDP ao consórcio liderado pela Engie. A Parpública não se pronunciou sobre a operação de venda das barragens na bacia do Douro pela EDP à Engie, segundo mostra a documentação enviada pelo Ministério das Finanças ao parlamento em resposta a um requerimento do BE.

A 23 de março, o Grupo Parlamentar do PS disse que ia chamar ao parlamento a diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) a propósito da venda das seis barragens.

* Com Lusa