"Só me sentaram à mesa quando foi para me tirar dinheiro", disse João Gama Leão na sua audição na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, acrescentando que tinha e tem "boas relações com a família Espírito Santo".

"Não fui eu que peguei num assalto do BES e o transformei num problema público", disse acerca das repercussões para os contribuintes da queda do BES e subsequentes injeções de dinheiro público.

O empresário da Prebuild, que deve mais de 300 milhões de euros ao Novo Banco, tinha sido questionado pela deputada Joana Sá Pereira (PS) sobre se era chamado a falar acerca da gestão do grupo Espírito Santo (GES).

"Com o doutor Ricardo Salgado não falava. Posso dizer que me encontrei duas ou três vezes com ele, para tristeza do meu passado", acrescentou o empresário.

No entanto, João Gama Leão descartou que tivesse investido "para ser beneficiado em financiamentos" pelo grupo.

"Lembro-me de um almoço que tive com o doutor Ricardo Salgado, e depois de eu já ter investido no grupo Espírito Santo - se não me falha na ESI [Espírito Santo International] - e sentou-me à cabeceira da mesa e disse-me que a família nunca esquece quem os ajuda", contou.

Admitindo que "hoje pode parecer ridículo", Gama Leão referiu que "ter o doutor Ricardo Salgado a agradecer" o investimento foi "dos momentos mais altos" da sua carreira.

"Quanto a isso resultar em benefícios no banco, acho que é fácil mostrar que se há coisa que não fui foi beneficiado", disse o líder da Prebuild.

João Gama Leão fez questão de separar a família Espírito Santo de Ricardo Salgado, considerando incorreto "resumir demasiado aquilo que é a história daquela família" ao antigo líder do BES.

O empresário considerou que "era absolutamente estratégico" para o ritmo de crescimento da Prebuild "ter uma posição no melhor banco" em Portugal.

Questionado pela deputada sobre se a atividade do seu grupo era de risco e baseada na aquisição de empresas em dificuldades, João Gama Leão respondeu que "quem não nasceu apelido Espírito Santo tem que ir à luta, porque senão não faz nada", considerando que "não há outra maneira de crescer sem risco".

"Quanto a considerar que eu fazia apostas de risco, é uma frase boa mas, de facto, não reflete a realidade dos factos", acrescentou, admitindo mais à frente que o seu grupo "tinha certamente uma posição bastante agressiva de crescimento, recuperação de empresas e expansão".

João Gama Leão considerou que se endividou "para expandir negócios" e para "internacionalizar empresas portuguesas".

"Aceito o rótulo de grande devedor. Eu não aceito é que me comparem com esta elite podre que tem vindo cá, isso é que eu não aceito. Essa gente endividou-se para comprar ações, para fazer tudo, para manipular o mercado, para servir o doutor Ricardo Salgado", referiu.

As tentativas que o banco fez de recuperar a minha dívida foram zero

No período de inquirição do deputado do PSD Hugo Carneiro, João Gama Leão foi questionado sobre o pedido que fizeram da sua insolvência pessoal.

“Depois de uma novela muito triste, cedemos as cerâmicas ao banco e foi aprovado o PER [Processo Especial de Revitalização]. À partida, quem aprova um PER está a pensar na recuperação de uma empresa. O que é que acontece a seguir? O Novo Banco pede a minha insolvência pessoal”, apontou.

O empresário da Prebuild, que deve mais de 300 milhões de euros ao Novo Banco, criticou este comportamento da instituição e considerou que se tratou de “um ato de má-fé”.

“Ao contrário do que o doutor Stock da Cunha [antigo presidente do Novo Banco] disse aqui, que eles fizeram várias tentativas de recuperar as grandes dívidas, as tentativas que o Novo Banco fez de recuperar a minha dívida foram zero”, condenou.

Para João Gama Leão, “mandar cartas para um grupo” como o seu, que é um grande devedor, e não haver a capacidade de se reunir “e tentar encontrar uma solução é no mínimo inédito”.

“O meu grupo consegue uma reunião com o Novo Banco em dezembro de 2014 e sou recebido por um administrador que era Vítor Fernandes e também por Daniel Santos. O Novo Banco em momento algum se mostrou interessado em conversar sobre a Prebuild”, acusou.

De acordo com o empresário, a única intenção do Novo Banco era retomar a Aleluia Cerâmicas.

“Essa reunião correu muito mal porque o doutor Vítor Fernandes teve uma postura muito agressiva, muito mal-educada, no sentido de ‘ou pagas ou vais para insolvência, mas tens aqui uma alternativa que é devolver-nos as cerâmicas’”, relatou.

O presidente da Prebuild garantiu que, nesse encontro, explicou a história das cerâmicas, a história do seu grupo e até convidou Vítor Fernandes a visitar o seu grupo, então com operações em três continentes.

“O doutor Stock da Cunha falou ontem que o Novo Banco tinha nove mil empregados. Eu tinha quase seis mil empregados. Não houve interesse nenhum em perceber o meu grupo. O único interesse era: queriam recuperar as cerâmicas”, insistiu.

O empresário afirmou ainda que quando se passou para as negociações do PER já “o seu grupo estava na UTI [Unidade de Terapia Intensiva, a designação usada no Brasil]”.