“Apesar de o número de colocações profissionais de pessoas com deficiência registadas pelo IEFP [Instituto do Emprego e Formação Profissional] se manter bastante reduzido (10% do número total de pessoas com deficiência desempregadas registadas em 2016), assinala-se a progressão positiva deste indicador, com um aumento de 138% no número de colocações entre 2011 e 2016″, refere o relatório do Observatório da Deficiência e dos Direitos Humanos (ODDH).

O relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal — Indicadores de Direitos Humanos 2017″ assinala uma redução de 6,7% no desemprego de curta duração, mas salienta que o desemprego de longa duração (mais de 12 meses) registou um agravamento na ordem dos 60% entre 2011 e 2016.

“Apesar de se verificar uma redução global do desemprego” registado entre 2011 e 2016 (18,8%), essa melhoria não se alargou às pessoas com deficiência, registando-se inclusivamente um agravamento de 26,7% no número de pessoas registadas nos centros de emprego”, refere o documento.

Esse agravamento do desemprego foi mais elevado entre as mulheres com deficiência (37,2%) do que entre os homens com deficiência (20,0%), embora no final de 2016 houvesse mais homens desempregados (7.645) do que mulheres (5.538).

O observatório destaca o aumento que tem vindo a acontecer do rácio de trabalhadores com deficiência na administração pública, atingindo os 2,30% em 2016.

Já no setor privado (empresas com mais de 10 trabalhadores), apesar de ter registado um aumento no número de trabalhadores com deficiência, a taxa de emprego era inferior a 1% em 2015.

A maioria dos trabalhadores com deficiência no setor privado possui qualificações ao nível do ensino secundário (29%) ou superior (25%), “o que sugere um impacto da escolaridade no emprego, que se regista também na população portuguesa em geral”, refere o documento que sistematiza informação, atualmente dispersa, sobre a situação das pessoas com deficiência em Portugal, a partir de fontes secundárias, nacionais e internacionais

O relatório conclui que, tendo em conta que persistem múltiplas barreiras ao exercício de direitos humanos dos cidadãos portugueses com deficiência, “importa acompanhar e avaliar as mudanças que vão sendo introduzidas, quer no plano legislativo, quer no plano social, para que se possa medir o seu impacto, avaliar os progressos conseguidos e assim informar e orientar o sentido das políticas públicas”.

Pessoas com deficiência são as que apesentam maior risco de pobreza

As pessoas com deficiência que vivem em agregados com baixa intensidade laboral e menores rendimentos são as que apresentam maior risco de pobreza, revela o relatório.

“O maior risco de pobreza é identificado entre as pessoas com deficiência que residem em agregados com baixa intensidade laboral (23,1%) ou baixo rendimento (24,8%)”, refere o relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal – Indicadores de Direitos Humanos 2017”.

Segundo o documento, o risco de pobreza e exclusão é experienciado sobretudo em agregados com pessoas com deficiências graves (36,5%) não havendo diferenças expressivas entre homens e mulheres.

A nível nacional, o risco acrescido de pobreza poderá ser explicado por fatores como os menores níveis de educação, menores taxas de emprego, menores rendimentos de trabalho e despesas com cuidados de saúde mais elevadas das pessoas com de­ficiência em comparação com as pessoas sem deficiência, adianta.

O relatório, apresentado no II Encontro do ODDH – Deficiência, Cidadania e Inovação Social, que decorre em Lisboa, destaca ainda o aumento de 58%, entre 2005 e 2016, do número de beneficiários da bonificação do abono de família, “o que pode ser visto como um indicador de empobrecimento destas famílias”.

Na área da discriminação, o documento refere que houve um aumento de queixas por práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência entre 2012 e 2015, mas que baixou em 2016.

No ano passado, foram realizadas 284 queixas de discriminação com base na deficiência, das quais 199 foram recebidas pela Provedoria de Justiça, 14 pelo Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) e 71 por outras entidades.

De acordo com o relatório do Observatório, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP-ULisboa), a maior parte dos processos foi arquivado por resolução (92), falta de indícios de prática discriminatória (58), desistência (dois2) e inadmissibilidade legal do procedimento (dois).

A acessibilidade foi a área que motivou o maior número de queixas, com uma média de 48 reclamações entre 2011 e 2016, seguida da educação (34) e da saúde (25), adianta, sublinhando que a deficiência é o segundo motivo mais apontado para a discriminação em Portugal e é aquele onde se regista a maior diferença em relação à média da União Europeia.

O relatório analisa ainda a disponibilidade das respostas sociais no âmbito da deficiência, revelando que as residências autónomas permanecem uma resposta residual, mesmo nos grandes centros urbanos face à capacidade instalada de lares residenciais, apesar de constituírem a resposta mais congruente com um paradigma de direitos humanos.

Segundo dados do Censos 2011, a prevalência da população residente com cinco ou mais anos com algum tipo de deficiência ou incapacidade se situa nos 18%.

O relatório, divulgado na data em que se assinala o 11.º aniversário da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, pretendeu sistematizar informação sobre a situação das pessoas com deficiência em Portugal a partir de fontes secundárias, nacionais e internacionais, e extrair indicadores através dos quais se possa aferir o progresso alcançado na realização dos direitos humanos das pessoas com deficiência em Portugal.

Relatório realça progressos da escola inclusiva, mas quer mais apoio técnico para alunos

O relatório do Observatório da Deficiência destaca os progressos alcançados na promoção da escola inclusiva, que possibilitaram a integração de 99% dos estudantes com deficiência no ensino regular, mas alerta para a necessidade de mais apoio técnico aos alunos.

“Portugal tem dado alguns passos importantes para a concretização do paradigma da escola inclusiva no decurso da escolaridade obrigatória”, que permitiram que 86% destes alunos frequentem a escola pública, refere o documento.

O observatório aponta o aumento do número de alunos que frequentam o terceiro ciclo e o ensino secundário, mas chama a atenção para “a limitação de recursos atribuídos à concretização destas políticas, nomeadamente no que diz respeito ao número de horas de apoio técnico disponibilizado aos alunos”.

“Enquanto o número de horas de acompanhamento por parte dos profissionais afetos às escolas se manteve relativamente estável, o número de horas mensais de apoio terapêutico prestado pelos CRI [Centros de Recursos para a Inclusão] sofreu um corte acentuado, passando quase para metade a partir do ano letivo 2015-2016”, sublinha o relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal – Indicadores de Direitos Humanos 2017”.

Por outro lado, o rácio do número de estudantes com necessidades educativas especiais por cada docente de educação especial” tem “sofrido uma ligeira diminuição desde o ano letivo 2014-2015, tendo passado de 12 para 11 alunos por docente em 2016-2017”, adianta o documento que sistematiza informação, atualmente dispersa, sobre a situação das pessoas com deficiência em Portugal, a partir de fontes secundárias, nacionais e internacionais.

A legislação determina que os alunos com necessidades especiais de educação possam beneficiar de uma redução do tamanho das turmas (12), desde que aí passem pelo menos 60% do tempo letivo.

Contudo, os dados relativos à percentagem de tempo que estudantes com Currículo Específico Individual ou que frequentam uma Unidade Especializada passam com a turma revelam que “a maioria destes alunos continua a não beneficiar de uma educação verdadeiramente inclusiva, dado que mais de metade (57%) passa menos de 40% do tempo letivo com a turma e quase 30% passam menos de 20%”.

Segundo o documento, persiste “uma grande disparidade” entre o número de alunas (38%) e de alunos (62%) com necessidades educativas especiais.

“Mesmo considerando que nestas faixas etárias existe na população em geral um maior número de rapazes do que de raparigas e que essa diferença é superior no caso de rapazes e raparigas com deficiência, essas diferenças não são suficientes para explicar esta assimetria de género”, sublinha.

O observatório aponta que este desfasamento poderá estar relacionado com o subdiagnóstico da deficiência na população feminina, uma tendência evidenciada por estudos recentes realizados por exemplo na população com autismo.