A proposta do Governo sobre alterações ao Código do Trabalho, que prevê medidas como a redução da duração máxima dos contratos a termo ou o alargamento do período experimental, é discutida hoje no parlamento.
As medidas apresentadas pelo Governo mereceram o acordo das quatro confederações patronais - CIP, CCP, CAP e CTP - e da UGT na Concertação Social e a reprovação da CGTP. Já no parlamento, os partidos da esquerda, que também vão avançar com várias propostas no plenário de hoje, contestam algumas medidas do executivo, como o alargamento do período experimental.
Ao mesmo tempo que se discutem as propostas dos vários partidos no parlamento, a CGTP realiza uma concentração frente à Assembleia da República contra a proposta do Governo, por considerar que a mesma “põe em causa a segurança no emprego, perpetua a precariedade, ataca a contratação coletiva e reduz direitos e rendimentos dos trabalhadores.
A concentração vai decorrer durante a manhã, enquanto os deputados estiverem a discutir a revisão legislativa no plenário da Assembleia da República. "Contamos ter junto à Assembleia cinco ou seis mil pessoas, entre dirigentes e ativistas sindicais e trabalhadores em luta", disse João Torres, da direção nacional da Intersindical, à agência Lusa.
Segundo o sindicalista, a maioria dos manifestantes deverão ser dos distritos de Lisboa e Setúbal, mas "também está prevista a vinda de vários autocarros do norte e centro do país". "Queremos reafirmar a nossa posição relativamente à proposta legislativa do Governo, porque consideramos que, ao nível da precariedade e da contratação coletiva, fica tudo na mesma ou pior", disse.
A CGTP defende a rejeição da proposta de lei do Governo e promete tudo fazer nesse sentido.
João Torres prevê que a proposta legislativa do Governo não seja votada hoje e, como está a fazer uma ronda de encontros com os grupos parlamentares, espera conseguir sensibilizá-los para a necessidade de rejeitar o diploma.
Para a central sindical, o acordo acentua desequilíbrios na repartição da riqueza, põe em causa a segurança no emprego, perpetua a precariedade, ataca a contratação coletiva e reduz direitos e rendimentos dos trabalhadores.
A discussão do diploma pelos deputados vai ser acompanhada pela UGT, cujo secretário-geral, Carlos Silva, vai estar nas galerias da Assembleia da República, acompanhado por cerca de 40 dirigentes sindicais.
A manifestação da Intersindical será encerrada com uma intervenção do seu secretário-geral, Arménio Carlos.
19 diplomas com alterações à lei laboral em discussão
A Assembleia da República debate hoje 19 diplomas com alterações ao Código do Trabalho, entre os quais a proposta do Governo que reflete o acordo de Concertação Social, mas só alguns, do BE e PCP, serão votados pelo plenário.
Apesar de o líder parlamentar socialista, Carlos César, ter lançado na quinta-feira o repto para que todos os diplomas baixassem à comissão especializada sem votação, bloquistas e comunistas optaram por levar alguns dos seus projetos de lei a votos.
Os bloquistas contam com sete projetos de lei sobre a matéria, mas decidiram adiar a votação de quatro deles, permanecendo no guião da Assembleia da República aqueles que incidem sobre redução das indemnizações por despedimento, limitação da contratação a termo e despedimento por extinção de posto ou inadaptação.
"Os restantes quatro diplomas irão esperar que termine o prazo de apreciação pública, ainda em curso", disse à Lusa o líder parlamentar bloquista, Pedro Filipe Soares. O mesmo já tinha acontecido com uma das seis iniciativas apresentadas pelo PCP, sobre trabalho temporário, precisamente porque também ainda corre o período legal de consulta pública.
O PCP vai levar a votos hoje cinco das suas seis iniciativas sobre legislação laboral, enquanto "Os Verdes" vão aguardar o prazo legal da discussão pública das suas três propostas, confirmaram hoje à Lusa fontes parlamentares.
"Os Verdes" optaram igualmente por não forçar a votação das suas três iniciativas pelo mesmo motivo, tal como sucedeu com a proposta de lei do Governo. O PS, com a anuência do executivo socialista, requereu na quinta-feira a baixa à comissão parlamentar do Trabalho, sem votação, do diploma governamental, que dá corpo ao acordo em concertação social, até final do prazo de discussão pública.
Fonte oficial do PAN, que apresentou duas iniciativas, disse à Lusa ter como "posição oficial" a de "não se opor, em caso de acordo maioritário, à baixa das iniciativas à discussão na especialidade sem votação".
O líder parlamentar do PS, Carlos César, defendeu que todos os diplomas deveriam ser diretamente viabilizados para apreciação na especialidade, sem votação na fase de generalidade, tendo, mais tarde, o presidente do PSD, Rui Rio, declarado ser-lhe indiferente se a proposta de lei do Governo é ou não votada, mas que a mesma deve ser viabilizada para debate na especialidade.
Também no caso da proposta do executivo falta ainda completar o mês estipulado para consulta e discussão pública, podendo apenas ser votada na próxima sessão plenária da Assembleia da República, agendada para 13 de julho.
Eis as principais alterações ao Código do Trabalho propostas pelo Governo
— Duração máxima dos contratos a termo reduzida para dois anos:
Segundo a proposta do Governo, a duração máxima dos contratos a prazo, atualmente de três anos com a possibilidade de três renovações, vai passar a ser de dois anos. Já o número de renovações mantém-se, mas não poderão ser superiores à duração do primeiro contrato.
Também a duração máxima dos contratos a termo incerto será reduzida dos atuais seis anos para quatro anos.
— Motivos para contratar a termo sofrem alterações:
Tal como constava do Programa do Governo, a lei laboral deixa de prever a possibilidade de contratar a prazo jovens à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração. Porém, admite-se a contratação a prazo de desempregados de muito longa duração, ou seja, sem emprego há mais de dois anos.
Passa ainda a ser permitida a contratação a prazo para as novas empresas e estabelecimentos que tenham até 250 trabalhadores, em vez dos atuais 750.
Fica ainda afastada a possibilidade de as convenções coletivas alterarem o regime legal da contratação a termo.
— Limites ao número de renovações nos contratos temporários:
Os contratos de trabalho temporário terão um limite de seis renovações (atualmente inexistente na lei), exceto quando o contrato seja celebrado para substituição de trabalhador ausente ou temporariamente impedido de trabalhar.
As empresas passam a ser obrigadas a informar o trabalhador temporário sobre o motivo subjacente à celebração do contrato entre a empresa utilizadora e a empresa de trabalho temporário. Se as regras não forem cumpridas, a empresa utilizadora fica obrigada a integrar o trabalhador com contrato sem termo.
— Período experimental alargado para 180 dias:
O Governo propõe alargar o período experimental dos contratos sem termo celebrados com trabalhador à procura de primeiro emprego ou em situação de desemprego de longa duração para 180 dias.
Atualmente, o Código do Trabalho estabelece que a duração do período experimental é de 90 dias para a generalidade dos trabalhadores, limitando o prazo de 180 dias apenas a cargos de complexidade técnica ou de elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação, bem como os que desempenhem funções de confiança.
O período de estágio profissional anterior à celebração do contrato vai contar para efeitos de período experimental.
Esta não é a primeira vez que Vieira da Silva propõe alargar o período experimental, mas a medida proposta na altura durante o Governo de José Sócrates, com Vieira da Silva à frente do Ministério do Trabalho, foi ‘chumbada’ pelo Tribunal Constitucional e acabou por cair.
— Contratos de muito curta duração serão alargados:
A duração máxima dos contratos de muito curta duração será alargada de 15 dias para 35 dias e este tipo de contratação passa a ser possível nos setores com atividade sazonal ou cujo ciclo anual de atividade apresente irregularidades de natureza estrutural ou de mercado.
Ou seja, os contratos de muito curta duração passam a ser possíveis sempre que haja um “acréscimo excecional e substancial da atividade da empresa” em vários setores, nomeadamente no agrícola ou no turismo, ficando preservada a duração máxima anual de 70 dias com o mesmo empregador.
— Banco de horas individual acaba, mas avançam os de grupo:
A proposta do Governo prevê a eliminação do banco de horas individual, mas estabelece que os bancos de horas já instituídos por esta via mantêm-se durante um ano após a entrada em vigor das novas regras, permitindo assim um período de adaptação às empresas.
Os bancos de horas ficam reservados para a negociação coletiva ou para acordos de grupo.
O novo regime de banco de horas através de acordos de grupo será aplicado caso haja aprovação de 65% dos trabalhadores após consulta por voto secreto. Será possível através desta modalidade aumentar o período normal de trabalho até duas horas diárias com um limite de 50 horas semanais e 150 horas por ano.
Caso o número de trabalhadores seja inferior a 10, e na ausência de representante dos trabalhadores, será previsto um regime especial de consulta sob supervisão da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).
— Horas extra só podem ser alteradas para melhor:
O princípio do tratamento mais favorável será alargado, passando a incluir o trabalho suplementar. Ou seja, o núcleo de matérias do Código do Trabalho que podem ser afastadas por instrumento de regulamentação coletiva desde que mais favoráveis para o trabalhador passa a integrar o pagamento do trabalho extraordinário.
A proposta alarga ainda o núcleo de matérias que se mantêm em vigor em caso de caducidade da convenção coletiva, através da inclusão dos regimes de parentalidade e segurança e saúde no trabalho.
— Denúncias das convenções coletivas têm de ser fundamentadas:
No âmbito da negociação coletiva, a proposta estabelece ainda que as denúncias das convenções devem ser acompanhadas de fundamentação quando em causa estão motivos de ordem económica, estrutural ou desajustamentos do regime da convenção denunciada.
Passa ainda a poder ser requerida por qualquer umas das partes a um tribunal arbitral, que funcionará no Conselho Económico e Social (CES), a suspensão temporária do prazo de sobrevigência da convenção (o prazo que vai da denúncia até à extinção do contrato), até um máximo de quatro meses.
O Governo optou, assim, por manter a norma da caducidade das convenções coletivas, ao contrário do que exigiam a CGTP, o PCP e o Bloco de Esquerda.
— Taxa de rotatividade até 2% sobre empresas:
A proposta do Governo prevê a aplicação de uma taxa anual até 2% para a Segurança Social sobre as empresas que abusem dos contratos a termo.
A taxa será aplicada sobre a massa salarial dos trabalhadores com contratos a termo, sendo progressiva até 2% e terá em conta a média dos contratos a prazo em cada setor de atividade.
A taxa será aplicada quando as empresas ultrapassarem a média de contratos a termo prevista em cada setor, prevendo-se o primeiro pagamento da nova taxa no final de 2019.
As médias setoriais que servem de base para calcular a taxa sobre os contratos a prazo são ajustadas anualmente e será reavaliada a necessidade de manter ou não a taxa. Além disso, não contam para a média as contratações a prazo que não sejam da responsabilidade do empregador, como é o caso de substituições de baixa por doença ou licença parental, por exemplo.
Até lá, será dado um estímulo às empresas para converterem contratos a termo em contratos sem termo, estando previsto um reforço “transitório” durante um determinado período do apoio financeiro já previsto atualmente nas políticas ativas de emprego.
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