A sua coragem reflete-se nos direitos e liberdades que as mulheres de hoje usufruem. As mulheres de agora estão a fazer o mesmo para as que vierem a seguir. É uma missão contínua, embora com momentos de regressão em alguns lugares. Ainda assim, uma das principais lições do ano 2022 no que diz respeito aos direitos humanos - dos quais a proteção dos direitos das mulheres e raparigas é componente fundamental - é que há cada vez mais vozes que se juntam quando o acesso aos direitos fundamentais fica em risco.

O ano que passou foi marcado por uma onda crescente de violações de direitos humanos, particularmente sobre os grupos mais vulneráveis das populações. Os direitos das mulheres e raparigas continuaram a ser afetados de forma desproporcional, tornando-as alvos mais frequentes de discriminação, violência e marginalização. Convictas de que a mudança é um ato de coragem e resiliência, as mulheres saíram às ruas para reivindicar os seus direitos à liberdade de expressão e de reunião pacífica. Em vários países, as manifestações foram desmobilizadas e severamente repreendidas pelas autoridades. Mas as mulheres não pararam, nem mesmo sob a ameaça de detenção. Sabem que não podem parar.

A prevenção da violência contra as mulheres necessita de ser uma prioridade na agenda dos governos. O elevado número de mortes intencionais de mulheres e raparigas, em diversos países, mostra que ainda não o é. Em muitos casos, só após o falecimento das vítimas se verificou uma resposta das autoridades competentes.

Segundo as conclusões do relatório anual da Amnistia Internacional referente ao ano de 2022, 49 mulheres morreram em Espanha durante o ano passado, devido a ataques por parte dos seus companheiros ou ex-companheiros. No Brasil, os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública indicavam a ocorrência de 699 feminicídios em 2022, dos quais 62% das vítimas eram mulheres negras. No México, foram relatados 3.450 assassinatos de mulheres entre janeiro e novembro de 2022. Destes, 858 foram investigados como feminicídios, o equivalente a 2.5 por dia. Já em anos anteriores, as falhas nas investigações das autoridades mexicanas – como a examinação indevida do local do crime, a perda de provas e a falta de meios e de formação especializada – tinham contribuído para a perpetuação deste ciclo de violência e para que muitas famílias das vítimas assumissem a liderança das investigações com os seus próprios recursos.

Os defensores e defensoras de direitos humanos, ativistas e pessoas que integram organizações e movimentos feministas no país manifestaram-se pacificamente contra a violência baseada no género. Mas não só no México. Na Arábia Saudita, Egito, Iémen, Iraque e Irão, mulheres defensoras dos direitos humanos fizeram-se ver e ouvir em protestos pacíficos contra a violência sexual e a discriminação de género, enfrentando assédio, detenções e interrogatórios pelas forças de segurança. Enquanto a repressão sobre os manifestantes pacíficos, independentemente do seu género, se torna cada vez mais comum por todo o mundo, o certo é que as pessoas voltam às ruas para apelar ao respeito pelos direitos humanos. As mulheres não são exceção.

No Afeganistão, os talibãs prosseguiram com as violações dos direitos das mulheres e raparigas no âmbito da educação, trabalho e livre circulação. A proibição das raparigas continuarem os seus estudos secundários e ingressarem no ensino superior, a eliminação dos mecanismos e espaços de responsabilização e acesso à justiça e o impedimento de as mulheres frequentarem parques públicos, confinaram-nas aos espaços interiores das suas casas, como se não pudessem ter perspetivas fora daquelas paredes. Querem dificultar-lhes o futuro, sem saberem que nunca lhes apagarão os sonhos.

Cientes do perigo que enfrentam, mas sem opção que lhes reste, as mulheres afegãs continuaram a manifestar-se de forma pacífica, em resposta às constantes medidas de desrespeito absoluto pelos seus direitos que lhes foram sendo impostas. O assédio, as detenções e prisões arbitrárias, os desaparecimentos forçados, a tortura física e psicológica não tardaram a ser perpetrados contra as manifestantes pelos talibãs.

Mas as mulheres não pararam. Sabem que não podem parar. Têm a urgência de deixar o caminho mais justo para as gerações futuras.