A normalização da violência – e da indignidade a que se sujeita um povo – faz com que a Palestina seja encarada por muitos como um país pobre, cujo opressor não lhe dá tréguas. Essa percepção mudou radicalmente, mesmo com a contabilidade feita quanto aos gestos israelitas que obrigaram os palestinianos a cumprir com uma vida pobre, num determinado território.
A supremacia israelita ficou com as calças na mão – literalmente, algumas imagens de soldados israelitas mostram isso mesmo – e o Hamas mostrou que têm dinheiro para armamento, estratégia militar de assalto e a vontade inequívoca de optar pela violência. Além dos mortos, o Hamas também raptou israelitas. O Hamas reclamou a sua vitória. Celebrou-a. E mandou dizer que, se Israel responder, os reféns terão morte certa. Entre os desaparecidos estavam duas judias sefarditas com nacionalidade portuguesa, ambas encontradas mortas.
A guerra é sempre o inverso da paz e no Médio Oriente a ideia de uma vida e coexistência pacífica nunca existiu. Uma das perguntas perante este cenário é: se a Mossad é um dos melhores serviços secretos do mundo, como é que não deu por nada? Outra pergunta: como pode um povo empoderar o Hamas? Como ficam as pessoas inocentes que querem só viver a sua vida? Num conflito que não termina. Não tem forma de terminar.
O ataque a Israel assusta por várias razões, uma delas é o Irão e o seu braço armado, mas também a Síria. O ataque a Israel assusta por se saber que estar em guerra é, para o povo judeu, quase uma condição. Assusta porque, mais uma vez, o povo palestiniano é massacrado. Assusta por ter uma origem: o pensamento terrorista. Os mortos de um lado não são mais nem são menos do que os mortos do outro lado. São homens, mulheres, crianças, velhos.
A desumanidade a que se assiste na Europa, com a guerra na Ucrânia, surpreendeu nos primeiros meses. Agora banalizou-se. O conflito no Médio Oriente é permanente, portanto também se banalizou. Somos muito pobres como sociedade global, para não entender que a violência não se normaliza, elimina-se, construindo pontes, diálogos. A coexistência é fundamental, até porque, entre outras coisas, as alterações climáticas provam que necessitamos uns dos outros.
Amos Oz, escritor israelita, escreveu:
“Um homem perseguido, quer porque ele próprio fez dos outros perseguidores, quer porque a sua miserável imaginação inventa legiões de inimigos cheios de más intenções, num caso como no outro um homem destes tem, além da infelicidade, uma falha moral: porque existe uma desonestidade básica na mania da perseguição seja ela qual for. A propósito, é óbvio que o sofrimento, a solidão, os acidentes e a doença atingem mais um homem destes do que outros, ou seja – todos nós. Pela sua própria natureza, o homem desconfiado é mais propício à desgraça. A desconfiança, como o ácido, consome quem a contém e devora o próprio desconfiado: proteger-se noite e dia do género humano, passar a vida a engendrar esquemas a fim de evitar tramóias e intrigas, e que truques usar a fim de farejar de longe a rede estendida aos pés – tudo isto é causa de danos irreparáveis. E são estas coisas que afastam o homem do mundo.” (excerto do livro Judas)
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