O início da vida adulta é marcado pelo desenvolvimento da intimidade, o estabelecimento de relações significativas, sejam elas amorosas, de amizade, trabalho, consoante os seus próprios interesses, gostos, valores. Porém, nem sempre isso acontece e o isolamento, bem como sentimentos de solidão nos jovens adultos é um dos principais motivos que os leva a procurar ajuda entre os profissionais de saúde mental. 

Uma das grandes aventuras da nossa vida prende-se com aqueles com quem nos cruzamos. Existimos na e pela relação e o contacto social é fundamental, uma vez que nos fornece uma rede de suporte, significado e orientação, que podem impactar, a longo prazo, a nossa saúde e bem-estar.

Podemos verificar não só à nossa volta, bem como em nós mesmos, nas nossas referências pessoais, experiências de solidão, sentimentos de não pertença e o medo da não aceitação. Muitos de nós, em certa altura da sua vida, não se sentiu amado o suficiente, ou sentiu-se rejeitado, abandonado, agredido (física e/ou emocionalmente), humilhado nas suas relações significativas. Isso pode conduzir a um sofrimento tal que se cresce a evitar estabelecer ligações com outros; um medo profundo de se relacionar, ou a vivência de relacionamentos pautados por padrões nocivos que reforçam crenças de desvalor e desamor. 

Os nossos relacionamentos de vida adulta, são muito influenciados pelas primeiras relações de vida. É através dos nossos pais, ou cuidadores que cumpram esse papel, que obtemos o primeiro olhar sobre nós mesmos, o mundo, os valores, as relações, o amor. A partir dos seus olhos, contacto, experiências e expetativas, moldamos a nossa identidade, a imagem que fazemos de nós mesmos, bem como a que fazemos dos outros, pela vida fora. Assim, se o outro tiver sido responsivo e tiver correspondido às nossas necessidades, isso permite-nos mais tarde confiar na nossa própria competência em solicitar o olhar do outro, de nos percebermos como seres dignos de interesse, desenvolvendo assim o sentimento de segurança interior, independência e autonomia, necessárias à construção de relacionamentos harmoniosos. 

É pelos afetos, as emoções e sentimentos que nos ligamos. Contudo, a dor do desamparo vivido outrora, faz muitas vezes “congelar” a capacidade de se deixar afetar, de sentir, de se vulnerabilizar. E se essa estratégia ajudou aquela criança a sobreviver, na entrada da idade adulta a pessoa depara-se com o desespero de não se conseguir ligar aos outros, nem a si mesmo. É a partir do que sentimos que compreendemos o que precisamos, queremos, gostamos ou não gostamos. Por isso, não nos conectamos sendo só fortes, apesar de muitos se convencerem disso. É necessário deixar-se vulnerabilizar para se conseguir conectar. 

A confiança é a necessidade mais fundamental e primitiva de todas e é a confiança no outro, que vai possibilitar desenvolver a confiança no eu, nas suas próprias emoções, sensações, perceções, úteis nos relacionamentos. Nomeadamente a comunicação dos limites, que não só servem para nos proteger daquilo que não queremos ou não aceitamos do outro, como a fortalecer vínculos importantes para nós.

Independentemente do que nos aconteceu no passado, importa refletir e assumir a responsabilidade de aprofundar e estreitar a relação connosco; correr de novo o risco de confiar em outrem, confiar-lhe o que se pensa, sente, deseja, para que se possa construir um sentimento interno mais coeso, que devolva a confiança em si mesmo e no outro. Não será qualquer pessoa que vai saber acolher a nossa vulnerabilidade, mas existem pessoas que irão saber fazê-lo.

Todo medo esconde um desejo. Só podemos sentir medo ou fracasso em relação a algo em que desejaríamos muito obter sucesso. O medo e o desejo caminham lado a lado. Amar alguém, ou ter um determinado objetivo que nos entusiasma, traz-nos naturalmente medo. Medo da perda, da incapacidade, de ficar sem o objeto de desejo. E ainda que seja o desejo que normalmente nos motiva a ação e nos dá força para sair de lugares confortáveis, o medo deve continuar cá para cuidar de nós. Quero com isto dizer que o medo, além do desejo, também pode ser um lugar importante no nosso crescimento pessoal (e relacional). Pode ajudar-nos a esperar pelo momento certo, ao invés de agir por impulso, com base no desejo desenfreado e que por vezes acaba por nos colocar em perigo, ou destruir aquilo que amávamos ou preservávamos.

Para terminar, acredito então, que entre o medo e o desejo está a coragem, o compromisso, a força e vulnerabilidade, a criatividade que nos faz redescobrir de quantas habilidades somos feitos (pessoais e relacionais), confiando mais e melhor na nossa utilidade no mundo.