Os habitantes da Terra não terão todos prestado atenção a este acontecimento (quantos são exactamente, é um número que aumenta à cadência de dois ou três por segundo...), mas certamente que serão todos eles afectados, mais ou menos, pelo que estas figuras acordaram e discordaram.

E quem são eles? Bem, sabê-lo não é nada tranquilizador; quer tenham chegado à cimeira convencendo os eleitores, quer tenham sido escolhidos por interesses vários, ou tenham imposto o seu poder à força, não são pessoas que gostaríamos de ter na família, para dizer o mínimo.

Aqui está a lista dos países presentes: França, Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Japão, Itália, Canadá e União Europeia (que constituem outro clube ainda mais fechado, o G7), mais Argentina, Austrália, Brasil, China, Índia, Indonésia, México, Coreia do Sul, Rússia, Arábia Saudita, África do Sul e Turquia.

Inicialmente, isto é, em 1999, o grupo incluía os ministros das finanças e os governadores dos bancos centrais de cada país, para discutir questões de comércio e finanças mundiais; mas a partir de 2008 foi alargado aos dirigentes (presidentes, reis, primeiros ministros, secretários gerais ou generalíssimos, conforme o que vigora nos respectivos países), e aos ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, além de dirigentes de foros internacionais, como as Nações Unidas e o Fundo Monetário (FMI).

Imagine-se esta gente toda junta durante alguns dias, numa espécie de festarola num clube privado, em que não faltam oportunidades para estarem todos à volta duma mesa e ainda terem conversas privadas bilaterais, trilaterais e circulares. Sendo todos umas feras, o número de permutas de intrigas, insinuações, indirectas, promessas falsas e palmadas nas costas com uma faca na manga é praticamente infinito. Todos adoram estar presentes e cada um quer brilhar mais do que os outros, em incontáveis oportunidades fotográficas e videográficas, cheias de significados que nem o mais arguto observador consegue desvendar.

Mas há um ponto a ter em consideração: apesar do palco ser mundial, a preocupação dos líderes é sobretudo doméstica. Ficar bem na fotografia nos seus países, mostrando aos governados que estão bem representados e que o país é importante no palco internacional. Os líderes de países democráticos têm sempre eleições à vista; os menos democráticos precisam de mostrar que a sua situação privilegiada se justifica.

Dito isto, havia, evidentemente, uma agenda oficial: o que estava no convite era que se ia discutir o estado da economia mundial e, este ano em particular, as alterações climáticas. Quanto ao estado da economia mundial, é o habitual choque de perspectivas, conforme as ideologias presentes, apimentado há um ano pela disputa colossal entre os Estados Unidos e a China; quanto às alterações climáticas, há quem se preocupe com elas e quem as ache um disparate, portanto logo à partida este tema estava destinado a morrer na praia. Donald Trump, o Presidente do país mais poluidor, já tinha dito que não quer ia ouvir falar nesse engano (“hoax”). Outros há que falaram, mas não podem fazer grande coisa; e ainda outros para quem se trata mais dum mantra do que dum fenómeno.

Os direitos humanos, outro tema recorrente, nem sequer chegou à praia. Um dos presentes era o representante da Arábia Saudita, país membro da Comissão dos Direitos Humanos da ONU (verdade!) e seria desagradável falar desse assunto em público – como o seria também para os presidentes da China e da Turquia, que são muito sensíveis. Aliás Trump, em mais uma das suas atitudes surpreendentes, fez questão em elogiar a Mohammed bin Salman: “Muito obrigado, em nome de muita gente, tem feito um grande trabalho", disse. Qual será esse trabalho, fica ao critério de cada um. Em compensação Theresa May mostrou alguma decência ao confrontar o príncipe com o assassinato de Jamal Khashoggi e a sinistra guerra no Iémen. Também teve o atrevimento de confrontar Putin com o caso Skripal, o espião assassinado pelos russos em território de Sua Majestade, numa reunião longa e embaraçosa.

Aliás, Mrs. May, cuja saída tem data marcada, estava naquela posição da mulher que vai a uma festa da família do marido depois de ter anunciado o divórcio. Se o peso do Reino Unido já é bastante discutível a nível internacional, o peso de Theresa May é mais relativo ainda. O que ela achava na semana passada, não valerá nada daqui a um mês.

O primeiro ponto da agenda oficial era então a presente alteração do comércio mundial, que passou do globalismo hipócrita ao nacionalismo agressivo. Embora a guerra comercial seja entre os Estados Unidos e a China, todos estão envolvidos e cada um tem os seus interesses a proteger. O que se disse e/ou não se disse foi, por vezes, evidente e outras muito subtil. Por exemplo, Donald Trump, que entra sempre na sala aos encontrões, declarou à chegada que esperava que as reuniões dessem resultados, mas, se não obtivesse o que queria, estava pronto a sair porta fora. No extremo oposto, isto é, na linha da subtileza, o primeiro-ministro nipónico, Shinzo Abe, deu-lhe de presente um mapa dos Estados Unidos onde estão marcadas as cidades americanas onde os japoneses têm investido, com a criação de milhares de postos de trabalho.

Esperavam-se conversas à porta fechada – menos para a foto-oportunidade do aperto de mão inicial. A mais importante, entre Xi Jinping e Donald Trump, acabou por decorrer cordialmente. Mais uma vez, o presidente norte-americano deu uma contravolta, ao levantar algumas restrições aos negócios da Huawei, a troco de uma trégua nas hostilidades. (O que levaria a perguntar se realmente a empresa chinesa representa um perigo real ou é apenas um peão no xadrez dos interesses económicos.)

Outra situação, cuja importância nunca se saberá, foi a reunião entre Putin e o presidente norte-americano, que insistem em encontrar-se ao abrigo de olhares estranhos. Trump elogiou Putin, como costuma fazer; e Putin resolveu esclarecer a sua posição ideológica, afirmando numa entrevista ao “Finantial Times” que o liberalismo está desactualizado. Nesse ponto, pelo menos, estão os dois de acordo.

Provavelmente António Guterres, o homem menos poderoso do mundo, deu uma palavrinha suave a Mohammed bin Salman sobre o affair Jamal Khashoggi, que as autoridades turcas, famosas pelas suas preocupações com os direitos humanos, têm vindo a revelar aos bocadinhos (literalmente...). Já o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, não deixou escapar a ocasião para dizer mais um dos seus famosos disparates: a Alemanha tem muito a aprender com o Brasil nas questões ambientais.

Sobre a conversa entre Xi e Donald, o Ministro das Finanças americano, Steven Mnuchin, adiantou à CNBC que as coisas estão “90% resolvidas”. (O que levou Teresa Hanafin, do “Boston Globe”, a dizer mordazmente que os 10% que faltam têm a ver com quanto Xi está disposto a pagar para jogar golfe em Mar-a-Lago, o resort de Trump na Flórida. Os jornalistas são mesmo retorcidos...)

Na verdade, nada se resolveu, apenas se decretou uma “trégua”. Os interesses norte-americanos e chineses estão de tal maneira interligados que só pode haver um empate técnico. O que assistimos em Osaka foi apenas mais um acto duma novela sem fim à vista.

Além das conversas sabidas e dos encontros escondidos, houve evidentemente a declaração final, assinada por todos, com um texto semelhante ao das reuniões anteriores, em Buenos Aires e Hamburgo. Dezanove concordaram que o Acordo de Paris é para manter, e o vigésimo, os Estados Unidos, concordou que não é.

Macron criticou abertamente Trump, mas Angela Merkel, sempre optimista, afirmou que as decisões previstas no Acordo são irreversíveis.

Resumindo, o espectáculo decorreu como previsto; os actores deram as deixas que se esperava que dessem, houve os sobressaltos que era preciso haver para justificar tanto estardalhaço, e o mundo continua na mesma.

Aguarda-se com grande expectativa o próximo episódio.

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