Ai está! 2-0 ao Uruguai. Embrulhem, país bastante simpático que nos fornece picanha mais acessível do que a argentina e onde nasceu Eduardo Galeano, autor de obras que compramos na Feira do Livro e não chegamos a ler!
Chegou finalmente a vingança pelo desperdício de talento que foi a nossa campanha no Mundial 2018 do qual eles nos eliminaram e a vingança pelo desperdício de papel de jornal que foi a campanha pela vinda de Cavani para o Benfica em 2020.
Assim dá gosto, uma fase de grupos feita para os ex-alunos de Humanidades, em que não é preciso calculadora. Só não saímos da segunda jornada com o primeiro lugar porque houve um médio defensivo português que não fez o seu trabalho e até acabou expulso. E nem sequer jogou, na medida em que treina a Coreia. De resto, Portugal não ficou apurado, ficou apuradinho.
Esta seleção habituou-se a servir sempre o mesmo prato desenxabido, mas, desta vez, Fernando Santos não fez outra vez arroz. A receita, contudo, não foi propriamente tradicional. Como fazer oitavos à portuguesa? Ora, mete-se uma panela ao lume, sela-se um ombro de Ronaldo, reduz-se com o William, defendemo-nos com um tomate do Diogo Costa, deixa-se um Nuno Mendes cozer demais, põe-se um alho luso-francês aquecer, reserva-se a carne uruguaia previamente seca por Dias e Pepe e espera-se até o Bruno meter duas batatas. Duas batatas, claro, a confiar na FIFA que atribuiu o primeiro golo a Bruno Fernandes e não a Ronaldo. Neste momento, Ronaldo deverá estar a perguntar aos colegas se acham que ele penteou ou não a bola.
Aqui, importará sobretudo a opinião de Rúben Neves - maior especialista do grupo em penteados. Enfim, são 37 anos: um Ronaldo com outro cabelo teria marcado aquele golo. Parece-me óbvio que a CMTV contratará um especialista em densidade capilar para descortinar se o golo é de Ronaldo ou não; afinal de contas, o jornalismo desportivo adora discutir pentelhos. De qualquer forma, gostava de ver isto esclarecido. A FIFA não atribuiu o golo a Ronaldo, mas a FIFA atribuiu o Mundial ao Qatar. Não é que seja uma organização confiável no que toca a atribuições.
Num jogo que Portugal foi controlando, a exibição da seleção só foi perturbada pela incursão de um jovem que escapou à marcação e que acabou por fazer mossa. Sim, o activista que invadiu o campo. Sejamos sérios: o adepto que invadiu o campo criou mais problemas com a sua velocidade do que o Darwin. Acho mal que, depois desta exibição fulgurante, vá parar ao banco. Dos réus, claro.
Por outro lado, tem-se dito que o activista veio defender demasiadas causas — LGBT, mulheres iranianas e Ucrânia. Gabo a coragem deste polivalentão, mas senti falta de uma bandeira do principado da Pontinha, um cartaz a dizer “não matem os velhinhos” ou uma t-shirt a criticar o facto da Rua da Junqueira se ter tornado de um só sentido. E, atenção, não é propriamente coerente que seja um apoiante da causa ucraniana e depois faça uma invasão.
De qualquer forma, este ato político inspirou uma revolução e talvez uma mudança de regime: frente a uma equipa sólida, acabou a ditadura do empate. E isso — desculpem-me os inúmeros leitores uruguaios — foi Mujica para os meus ouvidos.
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