Comecemos pelo seguinte facto: ser nacionalista é um bocado palerma. Se, por um lado, dividir o mundo com linhas imaginárias nos permitiu organizar e evoluir, ter orgulho em ter nascido em determinadas coordenadas geográficas e temporais é bastante palerma. Devemos orgulhar-nos daquilo para o qual contribuímos, através do nosso esforço e trabalho, e ter orgulho em ser de determinado país é como alguém que nasceu no topo do Evereste dizer que tem orgulho em já o ter escalado.

Ser nacionalista é como ser vegan, com a diferença que os vegans têm alguma razão no que apregoam e os nacionalistas, por norma, são meio atrasados mentais. Quando digo que são parecidos, digo que quando algo resvala para o radicalismo, acaba por cair na incoerência. Tal como um vegan não deixa de pegar no carro e matar 200 mosquitos a caminho do Algarve para ir à praia, ou não deixa de tomar um medicamento cujo processo de investigação passou por testes em animais, também um nacionalista comete o pecado da incoerência. Vejamos o seguinte paradoxo nacionalista que acabei de inventar: um nacionalista radical português pode ou deve gostar de bacalhau? Por um lado, é o prato mais típico do nosso país, mas, por outro, é um peixe estrangeiro que não é pescado nas nossas águas. Ou seja, rejeitar o bacalhau é rejeitar a tradição portuguesa, mas comer bacalhau é dar dinheiro a pescadores estrangeiros e um nacionalista que se preze tem de ter como lema “Primeiro os nossos!” e isso só seria verdade se a corvina e outros peixes já estivessem extintos.

Há quem diga “Não sou nacionalista, sou patriota” como quem diz que gosta do seu país, mas se quer distanciar do racismo e xenofobia associados ao nacionalismo. Percebo, eu também fico emocionado quando oiço o hino na final do campeonato da Europa; também fico orgulhoso quando o Ronaldo ou outro português dá cartas lá fora, excepto se forem de Tarot, pois nesse caso fico com vergonha. É quase incontrolável este sentimento de orgulho que temos quando ouvimos um estrangeiro a dizer que se emocionou com o fado, mesmo que nós nunca sintonizemos a rádio Amália. Isto só acontece porque precisamos de validação na nossa vida e, como muitas vezes não a temos, sentimos que os feitos de alguém que partilha a mesma nacionalidade são nossos também, quase como se por osmose. Não acho mal termos orgulho nas nossas tradições e querermos mantê-las, pois, como adepto da mistura e multiculturalidade, mantendo-as estamos a preservá-las para que os outros também possam desfrutar delas. Claro que há perigos em integrar culturas diferentes, sempre houve, quando alguém de uma tribo distante encontrava outra, a coisa podia acabar à flechada, mas também podia acabar a trocar ouro por açafrão e a fumar um cachimbo da paz. São riscos que temos de correr se quisermos bom tempero na comida.

O nacionalismo tem estado a crescer, mas apenas se fala do nacionalismo associado aos movimentos de extrema-direita e nazis, no entanto é preciso salientar que também existe nacionalismo de esquerda e que também é perigoso. Os casos da China e da Coreia do Norte saltam à vista. Num mundo cada vez mais global e em constante comunicação, a mentalidade nacionalista parece presa ao passado, até porque os heróis dos nacionalistas continuam a ser os mesmos e esse é um dos problemas dessa gente: os nacionalistas pensam pela cabeça dos outros e regem-se por fronteiras que não foram traçadas por eles e para as quais nunca contribuíram. Percebo que D. Afonso Henriques fosse nacionalista, foi ele que fundou esta merda e que andou a expandir fronteiras. Agora um gajo que nasce no Cacém é nacionalista porquê? E porque é que não é só “regionalista” e apenas se identifica com a Linha de Sintra? Cacém e Gerês têm menos em comum do que Massamá e Moscovo.

Ser nacionalista é como só fazer sexo com a própria mãe. É alguém que, como nasceu da vagina da mãe, repudia todas as outras. É contra a livre circulação em vaginas e contra a multivaginalidade. O nacionalista de hoje é um hipócrita. Esconde o seu racismo e a sua xenofobia como esconde a suástica que tem tatuada no braço. O nacionalista de hoje tem telemóvel chinês, móveis suecos, carro francês, um pastor alemão, vai jantar sushi uma vez por semana e compra laranja espanhola porque é mais barata. Nas férias faz uso das fronteiras abertas para ir passear, a não ser que vá para o Algarve comer maminha e picanha inglesa. No fim disto tudo, de tão nacionalista que é, foge aos impostos sempre que pode como boa tradição portuguesa.

Depois, há os nacionalistas étnicos que é uma palavra pomposa para “nazis”. Defendem que a nação é composta pela raça e, por isso, só reconhecem os brancos como sendo portugueses. São os mesmos que apoiam os movimentos nazis na América, sem perceber que se fossem para lá não podiam fazer parte do clube dos supremacistas brancos, pois seriam considerados hispânicos. Burros. Há quem diga que seriam considerados europeus, mas isso seria se os americanos soubessem onde fica Portugal. Se o americano médio é capaz de já não saber muito de geografia, imaginem o americano supremacista branco. É engraçado ver muitos nacionalistas étnicos associados a claques de futebol e a gritar golo quando um africano com as cores do seu clube enfia a bola na baliza. Não sei se é hipocrisia ou o poder do futebol a quebrar preconceitos.

Sugiro a todos os nacionalistas que façam um teste de ADN e percebam a quantidade de etnias e nacionalidades que se misturaram até chegar a eles. Quer dizer, isso também seria um paradoxo, pois provaria que a mistura pode resultar em cocó. Há nacionalistas que são boas pessoas? Há, mas são as que acabam enganadas e elegem gajos como o Hitler.

Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:

Para rir: Rir Ajuda, no Coliseu do Porto, dia 3 de Outubro. Bilhetes aqui.

Para ir: Festival Sol da Caparica, em Almada (estou lá sábado, no Palco Comédia, pelas 19h)

Para ver: Room

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