“Caro Pedro,

Não nos conhecemos e, talvez por isso, achei que podia desabafar consigo. É como na psicoterapia: terminada a sessão, esqueço-me do terapeuta e ele esquece-se de mim e passa ao seguinte. Tome o meu desabafo assim, apenas como o testemunho de um eleitor comum, cidadão comum, perante um jornalista.

Para vos dizer, e tomo o Pedro como mensageiro para a sua classe, que vocês, jornalistas, não têm feito um bom trabalho. Falo por mim. Quando a pré-campanha começou eu não sabia em quem votar, nem tinha a certeza de ir votar. O voto em branco era o mais provável. Passei as passas do Algarve nos últimos quatro anos, mas ainda não me esqueci do PS nos anos anteriores. Esta memória bastaria para o tal voto em branco.

Mas é pior. Não me revejo nos grandes partidos, que sistematicamente me enganam desde 1975. Não me revejo nos pequenos, por não lhes dar crédito ou não terem tempo de antena suficiente para me convencer. O sistema está montado para funcionar neste vácuo… Nunca os pequenos serão grandes, nunca os grandes deixarão de o ser. Vocês, jornalistas, contribuem para que este estado se perpetue… Uma vez mais, nesta campanha, seguiram a lógica do grande espectáculo e do pequeno soundbyte.

Porém, acrescentaram-lhe um pequeno/grande elemento, que fez toda a diferença: as sondagens diárias, em várias frentes, e com resultados nem sempre semelhantes. Esta inovação da “corrida diária” ía dando comigo em doido: por ver a coligação governamental subir, ponderava um voto útil; por ver o PS subir, ponderava o voto em branco; por ver os pequenos partidos ganharem alguma dimensão, ponderava escolher um deles. Os meus dias transformaram-se num inferno de duvidas, num mar de interrogações, acima de tudo numa insanável certeza de que qualquer voto é, na verdade, um voto no escuro.

E é assim que chego a esta quinta-feira. No escuro. Sem saber de quem desconfio menos, sem saber quem me vai enganar melhor, sem saber que raio de valor tem o meu voto (até podem mais votos e menos deputados dar um governo diferente…).

Caro Pedro: eu sei que é mais fácil e tentador matar o mensageiro do que procurar a origem da mensagem. Há séculos que assim é. Mas sem querer ser injusto, deixe-me que lhe diga: na próxima segunda-feira, além dos berbicachos que o Prof. Cavaco Silva vai ter de resolver, talvez vocês, jornalistas, devessem obrigar-se a um trabalho de casa. Olhar para o trabalho feito e pensar um pouco sobre ele. Perceber até que ponto se deixam enredar nestas teias que os partidos tecem para se manterem à tona da água.

Só para acabar: eu até acho que o nosso jornalismo é livre e tem um razoável módico de independência. Mas não deixo de sentir que, por falta de dinheiro ou vontade, alinha mais vezes do que devia na tal “espuma dos dias” que nos deixa assim, às escuras, nos momentos cruciais."

Pronto. Imaginem que recebi um mail assim.

Coisas que me deixaram a pensar esta semana…

As eleições na Catalunha: gosto de ler as reportagens e análises da revista The Atlantic.

Ainda que seja um leitor da original norte-americana, não deixo de sugerir que leiam a Esquire espanhola - um bom exemplo de uma revista que não cede à tentação dos modismos actuais. De qualquer forma, a chegada ao numero 1000 da revista mãe merece a nossa atenção. E uma saúde!

Os jornais espanhóis não param de experimentar mudanças, tentar conquistar leitores, não desistir da “guerra” do papel. Agora foi a vez do El Mundo, que desde há poucas semanas renovou a sua oferta editorial de domingo com dois novos suplementos (“Zen”, cujo nome diz tudo; e “Papel”, dedicado à reportagem), e a renovação de mais um (A economia no “Mercados”). Resultados a ver nos próximos meses…