Tenho um misto de sentimentos relativamente a Portugal. Por um lado, é um país bonito com gente simpática, por outro, faz-me mal à saúde. Passo a explicar: estou desde quarta-feira na estrada a fazer ‘stand-up comedy’ por várias cidades e, até agora, estou magoado com Aveiro, Viseu, Santa Maria da Feira e Lousã. Não me apanham lá outra vez, especialmente em vésperas de Verão onde é preciso ter corpo para ficar bem no biquíni. Come-se demasiado bem em Portugal e quando digo Portugal é mesmo o Portugal real e não Lisboa. O resto do país resiste à gourmerização da comida e come-se pelo prazer de comer e não pela “experiência” que nos tentam vender como forma de cobrar preços mais altos.

Nestes quatro dias engordei ao ponto de sentir que tenho uma bolsa marsupial com um hipopótamo bebé a dormir a sesta lá dentro; bem tento conter-me e mentalizar-me que na próxima refeição vou só comer sopa, mas depois chego a um restaurante de Viseu e o senhor Tito decide que nos deve fornecer comida suficiente para acabar com a fome em África. “Querem mais alguma coisa?”, pergunta-nos, dizemos que não com a mão pousada na barriga que é o sinal universal de “Já estamos a abarrotar”. Ele acena com a cabeça, em tom de desdém, como quem diz “Estes meninos de Lisboa não sabem comer à homem” e desaparece para minutos depois voltar com mais uma travessa de enchidos e torresmos. Insistimos que já estamos bem e ele decide então que é altura da sobremesa que dissemos que não queríamos, mas que ele trouxe na mesma. Resultado: dois quilogramas ganhos no espaço de uma hora. No dia seguinte, em Santa Maria da Feira, disse que ia tentar comer menos e mais saudável, mas além de nos terem servido toda a ementa de petiscos disponível, ainda decidiram trazer-nos um metro de cerveja, uma nova unidade de medida de alcoolismo, como se não bastava o pão ensopado no molho da bochecha de porco a fazer-me crescer barriga.

Portugal é um país tramado para tentar fazer dieta. Come-se bem em quase qualquer esquina e esperemos que com um país cada vez mais cosmopolita, as terras mais pequenas resistam e não se multipliquem por lá os restaurantes ditos gourmets, quais cogumelos recheados com queijo roquefort. A maioria deles são maus e caros, mas o pior de tudo é que estão a ameaçar a sobrevivência da espécie típica portuguesa que é a tasca. Sim, há tascas gourmets, mas isso era o mesmo que haver prostitutas de luxo à beira da estrada. Não faz sentido. Onde está o chão a colar, que se levamos uns ténis um número acima, corremos o risco de ficarmos sem eles, quais cinderelas badalhocas? Onde está o dono da tasca, que nos trata por "meu cabrão", enquanto coça a genitália e em seguida lambe o dedo para virar a folha do bloco de notas onde vai apontar o nosso pedido? Onde está o jarro de vinho, já lascado em sete sítios e cujo conteúdo se assemelha a vinagre para temperar a salada? Onde estão os empregados que chegam ao pé de nós e perguntam "Então, estava tudo bom ou quê, cara**o?!", enquanto trazem a panela e nos despejam para o prato mais "um bocadinho", que muitas vezes é mais que a dose inicial? Onde estão as contas feitas de cabeça que vão sempre dar um número abaixo do que esperávamos? Onde é que agora se pode sair cheio, satisfeito, bêbedo e a cheirar a fritos, tudo por menos de 7€? Em quase lado nenhum, pelo menos em Lisboa. Não me interpretem mal, há restaurantes gourmets bons, em que o rácio qualidade-preço é aceitável, são é raros e eu prefiro uma boa tasca genuína do que um desses estabelecimentos snobs. Se calhar é porque não tenho dinheiro para andar a comer fora em restaurantes caros. Se calhar é isso.

Sinto que esta crónica ficou pequena e com fraca qualidade, por isso pensem nela como uma crónica gourmet. Até tem a folha de rúcula e o vinagre balsâmico na imagem.

Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:

Stand up comedy no Coliseu do Porto dia 15 de Junho.
Filme: El secreto de sus ojos

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