Habitualmente, os treinadores e os jogadores do Benfica não correspondem à ambição desmedida dos seus adeptos. No jogo em Haifa, em que o Benfica humilhou a equipa da casa ao ponto do incidente diplomático, admitamos que foram os adeptos do Benfica que não estiveram à altura da ambição desmedida do treinador e dos jogadores do Benfica. Sejamos sérios: à meia hora de jogo, alguém que estivesse a ver o jogo acreditava que o Benfica ia passar em primeiro no grupo do PSG em virtude dos golos fora, depois de marcar 5 na segunda parte? Ninguém. Provavelmente, até a personagem do sketch dos "quinze-a-zero" estaria à espera de uma segunda parte já a pensar no próximo jogo da Liga, gerindo o jogo a passo. Não foi isso que aconteceu - naqueles 45 minutos, Roger Schmidt teve mais ambição do que nós todos. Em larga medida, porque estamos traumatizados por décadas em que o clube foi relegado para a divisão do futebol europeu em que "passar aos oitavos" é um título.

Confesso que não conhecia a regra que catapultou o Benfica para primeiro lugar do grupo, a dos golos fora. Roger Schmidt, para além de competente treinador, mostrou ser um dos maiores especialistas em regulamentos da UEFA. Os adeptos, os comentadores do jogo, até os responsáveis de um pobre clube francês financiado por frugais cataris, todos à nora. "É a regra dos cartões amarelos? É pelo histórico dos últimos 5 anos? É por moeda ao ar?". Ninguém sabia muito bem qual o critério para atribuir o primeiro lugar. Ninguém? Não diria tanto. Um jurisconsulto alemão nascido na Renânia-do-Norte-Vestfália que, partindo da tradição jurídica germânica do Rechtsstaat, desmontou a linguagem encriptada dos burocratas de Nyon e, com toda a justiça, defendeu o direito do Benfica regressar à elite europeia.

Em julho de 2021, quando viu o seu presidente em exercício a ser detido pela PJ, o Benfica bateu no fundo. Hoje, volta à tona pela mão de um treinador que, curiosamente, está sempre a dizer "I sink". Ele quer dizer "eu penso", diz "eu afundo", mas a verdade é que há muito tempo que não se respirava tão bem na Luz. Os jogadores do Benfica parecem, como diria o notável adepto Paulo Parreira, "peixes debaixo de água" - os tempos da apneia já lá vão. Mário Wilson disse que qualquer treinador se arrisca a ser campeão pelo Benfica, mas Roger Schmidt está a correr riscos ainda maiores: fazer disparar expectativas reprimidas dos benfiquistas. Alguém não lhe entregou o memorando de que um Benfica grandioso é coisa do passado e agora o homem vai ter de lidar com isso. Enfim, quem tramou Roger Schmidt?