O eSports consiste em jogos eletrónicos submetidos a um formato de competição. Se noutros tempos a prática estava confinada aos encontros entre amigos, agora é capaz de encher estádios, como se se tratasse de clássicos de futebol.

Por cá, o “maior evento jamais realizado em gaming”, nas palavras de Alexandre Fonseca, CEO da Altice Portugal, acontece este verão, nos dias 9 e 10 de junho na Altice Arena. Vão estar presentes vários jogadores nacionais e internacionais, distribuídos por vários campeonatos, como CS:GO, League of Legends, Clash Royale e FIFA. Além disso, os próprios visitantes vão ter um espaço para jogar.

É na apresentação oficial do evento que se sublinham pormenores importantes: são esperadas 20 mil pessoas e o prize money é de 100 mil euros — muito atrativo para a participação de equipas internacionais.

Ricardo “Fox” Pacheco, de 31 anos, é o melhor jogador português de CS:GO (Counter-Strike) e presença obrigatória nos maiores festivais internacionais de eSports, tendo jogado duas vezes nas meias-finais da League Major. Durante apresentação oficial do evento em Lisboa, confessa que a comparação do eSports com o futebol faz cada vez mais sentido. “Tal como no futebol, nós damos conferências de imprensa, temos conversas com psicólogos, temos massagistas, temos reuniões com treinadores”.

Ao SAPO24, aprofunda esta questão: “As equipas têm estruturas hierárquicas bem definidas e organizadas. Há treinadores, managers, CEO’s. Damos imensas entrevistas antes e depois dos jogos. Há sempre aquele conceito parecido ao de flash interview, que existe no desporto profissional”.

Para Fox, uma das muitas presenças desejadas no Moche XL, a aventura no mundo dos jogos começou longe de qualquer ambição profissional.“Comecei a jogar com os meus amigos numa loja em Guimarães. Depois tivemos a oportunidade de jogar num torneio nacional, vencemos e começámos a jogar como equipa. Passado pouco tempo éramos uma de duas melhores equipas do país”, conta.

Ainda que tenha passado 7 anos a jogar em regime “semi-profissional”, balanceando entre os jogos e o emprego estável de segurança privado, Fox conseguia destacar-se em competições, tendo passado por várias equipas nacionais. “Tive em várias equipas, até que depois cheguei ao K1ck, one me fixei durante mais tempo”, acrescenta.

“Acho que quando comecei a receber ordenado no K1ck apercebi-me que seria possível [viver só do CS:GO]. Mas não tinha a certeza. Não era fácil conjugar o CS:GO com outro trabalho, o que com o ordenado do K1ck era obrigatório ter. Mas quando dei o salto lá para fora, comecei a receber valores de outro patamar e foi aí que tive a certeza”. Para termos uma ideia, os membros das 20 melhores equipas mundiais podem receber, mensalmente, entre 5 mil e 15 mil euros.

Em 2015 é quando acontece o “salto lá para fora”, em que começa a jogar na equipa estrangeira Team Kinguin. Foi neste momento que percebeu que existia uma diferença colossal na forma como se vivia o eSports em Portugal e no resto do mundo. “A nível nacional, acho que ainda estamos estagnados. Precisamos de novas ideias e mais apoio para tentarmos aproveitar a evolução que os eSports têm tido a nível mundial”.

Um passo nesta direção é o XL Moche ESports: “Espero um torneio grande, com boas equipas, excelentes condições e boa organização. Se tivermos mais torneios deste género ao longo dos próximos tempos, poderemos ver melhorias na situação dos eSports em Portugal”.

Daniel Rodrigues, da RTP Arena, media partner do Moche XL eSports, avança que “o mercado português está a ganhar dimensão e a aproximar-se ao que existe lá fora”. Nos dias do evento, o Moche XL eSports tem um objetivo: “tornar a maior sala de espetáculos de Lisboa na maior sala de jogos em Lisboa”. Para isto, vão existir dois palcos de competição de League of Legends e CS:GO, um para o jogo Clash Royale e outro para o FIFA’18.

YouTube: a mão amiga do eSports

Além de a comunidade poder assistir aos jogos, poderá ouvir também os youtubers e streamers nacionais e internacionais. Na apresentação oficial — não no palco mas nas primeiras filas — está Ric Fazeres, youtuber de gaming.

Ao SAPO24, Ric Fazeres conta que se lançou há sete anos nas lides do YouTube, onde partilhava as suas jogadas do Call of Duty para provar que tinha efetivamente ganhado o jogo. Embora encontre enorme diversão e prazer em jogar, percebeu que o futuro não passaria pela competição mas sim pela partilha. “Da mesma forma que as pessoas acompanham os episódios da Casa de Papel, as pessoas acompanham um jogo comigo. Eu conto uma história. Além de jogar, eu comento, acompanho o jogo, rio quando tenho de rir, choro quando tenho de chorar. Partilho a experiência do jogo”.

Os vídeos funcionam efetivamente como uma série: são cerca de 25 ou 30 episódios — com cerca de 30 minutos — para cada jogo, como por exemplo: Far Cry, Sea of Thieves, Call of Duty. Tal como acontecia com o jogador Fox, também Ric Fazeres passou muitos anos tentar conciliar o ritmo leonino do YouTube com o emprego de oito horas diárias no Metropolitano de Lisboa.

Com o sucesso que se começava a registar — em média 200 mil visualizações diárias e 6 milhões de visualizações mensais —, Ric Fazeres acaba por pedir uma licença sem vencimento. “Se eu tivesse 22 anos despedia-me logo mas com a minha idade [39] nunca se sabe, o YouTube também é muito de tendências, nada é fixo”.

Nada é fixo, mas uma coisa é certa: o gaming, para Ric Fazeres, é “um escape” onde pode “divertir as pessoas, entreter as pessoas e produzir conteúdo”. Tal como Ricardo, existem várias youtubers que alimentam, da mesma forma, a visibilidade do eSports. Os próprios jogadores profissionais acabam por criar contas para partilharem as melhores jogadas. É um ecossistema.

Os novos heróis e as nossas profissões

“Nós somos os novos super-heróis. Antigamente, os meus super-heróis estavam na televisão, hoje em dia estão na Internet”, conta Ric Fazeres ao SAPO24. Na apresentação oficial do Moche XL eSports, foram várias as crianças que pediram autógrafos e tiraram fotografias com Ric Fazeres e Ricardo Fox.

Para Ric Fazeres, a Internet traz vários benefícios à sociedade, se o consumo for feito “com peso e medida”. No caso das crianças, tem de existir uma regulação por parte do pais, contudo, os Youtubers também tem de assumir a responsabilidade.

“Nós, youtubers, temos uma responsabilidade enorme, principalmente junto dos mais novos. E penso que temos de ter mais cuidado na forma como falamos. É possível entreter sem dizer asneiras. O YouTube é uma página livre mas temos de ter limites funcionais para a sociedade”, alerta Ric Fazeres.

Ricardo Fox salienta que o eSports tem uma importância extraordinária para a sociedade. “Aqui há espaço para tudo. Isso é importante para a sociedade. As pessoas que não se sentem confortáveis noutros lados, que sentem não existir espaço para eles na sociedade porque não se conformam com as normais sociais habituais, sabem que aqui há sempre espaço para elas”.

Relativamente ao futuro, este “só pode ser brilhante”, diz Fox. “Quando vemos o crescimento incrível que o setor teve nos últimos anos, entendemos que isto caminha para ser uma profissão tão 'normal' ou 'socialmente aceite' como trabalhar na área da televisão/entretenimento ou ser atleta profissional de alta competição”. Goste-se ou não, o eSports vai fazer parte do futuro. Ric Fazeres e Ricardo Fox estão cá para nos mostrar isso.

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