Sob a coordenação do engenheiro eletrotécnico João Campos Rodrigues, o mentor do Electrogás, com quem a Lusa falou, a equipa de investigadores instalou-se há já alguns meses num dos laboratórios de química do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL), onde já desenvolveu um projeto piloto de produção de gás natural sintético de cinco quilowatt (kW) de potência, capaz de abastecer várias vivendas.
“O que estamos aqui a fazer é novo e é novo a uma escala mundial, não é a uma escala nacional. […] Estamos em zonas de fronteira da tecnologia”, disse à Lusa João Campos Rodrigues.
O projeto, esclareceu, consiste em produzir gás natural sintético a partir da energia elétrica, através de um processo de eletrólise que tem como principal diferença das eletrólises tradicionais o facto de usar no processo uma matéria carbonada, a grafite, que permite obter diretamente o gás metano (conhecido como gás natural).
“Este processo traz uma vantagem do ponto de vista das renováveis, que tem a ver com o facto de a energia renovável ter uma característica de não ser ‘despachável’, o que quer dizer que eu só tenho energia elétrica, por exemplo neste caso a fotovoltaica, quando há sol. Se não precisar daquela energia elétrica, essa energia é desperdiçada, não a consigo armazenar”, explicou o investigador.
A energia proveniente de fontes renováveis que não é armazenada, pode, através deste processo, ser transformada em metano e, a partir desse gás, é possível mais tarde voltar a produzir energia elétrica, através de uma pilha de combustível, que é uma célula eletroquímica que converte energia potencial de um combustível em eletricidade através de uma reação eletroquímica.
O processo de produção de metano a partir de biomassa não é novo, mas, segundo Campos Rodrigues, é feito normalmente a temperaturas de 400 graus e a elevadas pressões, usualmente entre 20 a 40 bars.
“O que nós fazemos aqui é algo diferente, porque estamos a trabalhar utilizando energia elétrica, portanto estamos a falar de um processo eletroquímico, e trabalhamos a temperaturas de 100 graus e a pressões de quatro ou cinco bars. Estamos em condições operacionais muito mais favoráveis do que é a tecnologia tradicional tal como ela neste momento existe”, acrescentou o investigador.
Este tipo de tecnologia “torna-se particularmente importante” nos locais isolados, garantiu, onde há uma maior necessidade de armazenamento de energia renovável nas alturas em que se está a produzir, mas não se está a utilizar a energia.
“Preciso de armazenar, para depois, quando tiver necessidade de energia e não tiver energia renovável, eu vou à minha energia armazenada, vou ao ‘banco de energia’, e transformo novamente essa energia que está armazenada sob uma forma química, numa energia elétrica”, explicou Campos Rodrigues.
As ilhas, por exemplo o arquipélago dos Açores onde têm sido feitas apostas em energia eólica, são zonas onde este tipo de tecnologia tem uma aplicação “grande”, sublinhou.
“Na ilha Terceira eles têm um parque eólico, se não estou em erro de 14 megawatt, que desligam à noite porque não há condições de utilização da energia produzida”, disse aquele investigador.
Neste momento, o projeto encontra-se numa primeira fase de ‘scale-up’, ou seja, na passagem da unidade experimental para outra de uma dimensão 10 vezes superior, que vai permitir uma produção estimada de 200 litros de metano por hora.
Atingido esse patamar, esta tecnologia, que já recebeu apoio da comunidade europeia para um estudo de viabilidade técnico-económica, tendo-lhe sido também atribuído um prémio de excelência pelas suas “características únicas”, está pronta para aplicações comerciais concretas, mas tem de conseguir o financiamento de cerca de um milhão de euros necessários para passar a essa fase, por exemplo, através de fundos comunitários e investimento empresarial.
* Por Maria João Pereira (texto) e Rui Pereira (vídeo) da agência Lusa
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