Em 20 de fevereiro de 2014, Mark Zuckerberg deixou o setor tecnológico meio que em estado de choque ao anunciar a compra do WhatsApp, uma aplicação com cinco anos tida como uma alternativa às mensagens SMS, por 19 milhões de dólares (12 vezes mais do aquilo que foi a sua avaliação no ano anterior).

Não é difícil de explicar o porquê do choque: era muito dólar por uma aplicação que rendia pouco dinheiro e, apesar dos muitos milhões de utilizadores, a maioria era de fora dos EUA (assim como a Google tinha feito uma oferta um ano antes por mil milhões de dólares, um valor significativamente inferior). Não obstante, ainda é, atualmente, de longe, a aquisição mais cara de sempre da história da Meta (o Instagram, por exemplo, custou mil milhões de dólares).

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Há quase 10 anos, o fundador do Facebook descreveu o WhatsApp como um serviço "incrivelmente valioso" que estava a caminho de ligar mil milhões de pessoas em todo o mundo. Não se enganou. Se na altura do negócio o WhatsApp tinha uns reportados 450 milhões de utilizadores, hoje em dia o número é bem mais redondo: são mais de 2 mil milhões de pessoas a utilizar a aplicação para conversar com colegas de trabalho, amigos e familiares. Todavia, apesar de toda esta massificação, como realça um extenso artigo da CNBC que serve de mote a este texto, continua a não ser uma grande fonte de receitas.

  • Qual é o valor real no negócio? Para os analistas e investidores, o verdadeiro valor do WhatsApp para a Meta não é claro. É estimado que as receitas oscilem entre os 500 milhões e os mil milhões de dólares — o que, a ser verdade, equivale a menos de 1% das receitas (116 mil milhões) da Meta em 2022. A título de comparação, o Instagram, segundo o que é projetado, este ano, vai gerar receitas na ordem dos 40 mil milhões de dólares.

Vendo bem as coisas, é normal. Por defeito, o WhatsApp não tem anúncios. Nem tem muito que ver com matérias do metaverso ou com vídeos de curta duração (Reels) do Instagram. O que é particularmente chato quando o negócio da Meta é vender anúncios (coisa que os fundadores do WhatsApp sempre disseram que não fariam).

Mas quer isso dizer que Zuckerberg perdeu a esperança na plataforma de troca de mensagens? Não, de todo. Antes pelo contrário. Segundo ele, o WhatsApp representa o "próximo capítulo" para a Meta. Isto porque Zuck acredita que há muito espaço para crescer no mercado dos negócios e na área de contacto com o cliente. Por outras palavras, acredita que o WhatsApp Business, a versão profissional do WhatsApp (virado para as empresas e gestão de clientes), ainda só tocou na superfície daquilo que pode ser. De acordo com a Meta, já são 200 milhões de pessoas a utilizar a aplicação — e há muitos mais para conquistar.

O futuro é Business

Criada em 2018, esta aplicação é praticamente igual à original, mas com ferramentas orientadas para o negócio. Ou seja, o seu intuito é facilitar a forma como as empresas comunicam com os clientes através de contas profissionais verificadas. Existem vários serviços disponíveis e tudo depende do tamanho do negócio. As pequenas empresas, por exemplo, podem utilizar a aplicação gratuitamente ou, dependendo do país, pagar uma assinatura mensal para obter funcionalidades adicionais.

E pese embora as empresas não possam publicar anúncios como habitualmente o fazem nas outras redes sociais da Meta, estas podem pagar um substituto que vai assumir-se como fundamental para a estratégia de negócios do WhatsApp: o "click-to-message", que essencialmente leva os utilizadores do Instagram e do Facebook para o WhatsApp para iniciar uma conversa (a Meta explica como tudo funciona aqui).

Quando falamos de WhatsApp em Portugal, ainda não pensamos muito em termos empresariais. É mais na linha direta de comunicação com amigos e a família. Mas existem outros países, como a Índia e o Brasil (os dois com mais utilizadores a nível mundial), onde o WhatsApp é vulgarmente utilizado para fazer negócios. "Se formos à Índia ou ao Brasil e olharmos à nossa volta, vamos ver números de WhatsApp afixados nas montras de todas as lojas. É assim que as empresas querem interagir com os seus clientes", explicou Alice Newton-Rex, Diretora de Produto do WhatsApp, à CNBC.

Click-to-message e os Canais

Estes anúncios "click-to-message" geraram 9 mil milhões de dólares em receitas à Meta em 2022. A maioria vem do Messenger, que foi a primeira app da casa a oferecer este tipo de anúncio, mas Zuckerberg fez questão de frisar no relatório de contas que este tipo de anúncios no WhatsApp cresceram mais de 80%. Este ano, quando apresentou os resultados do primeiro trimestre, e fez saber que a taxa de execução das receitas dos anúncios "click-to-message" está na rota para gerar 10 mil milhões de dólares, não perdeu a oportunidade para salientar que "as mensagens pagas no WhatsApp cresceram 40%". (Mas tanto num caso como noutro não deu valores).

Pelo que dá a entender, o líder da Meta acredita que há potencial por explorar no WhatsApp. Os números concretos ainda não os revela, mas isso talvez seja tática do "playbook" da empresa, como revelou o próprio em entrevista: "Primeiro chegar a mil milhões, dois mil milhões, três mil milhões de pessoas"; pensar em monetização "só depois disso". Foi assim com Facebook e assim foi com o Instagram.

O que parece certo: além do WhatsApp Business, pensa-se em monetização com uma nova ferramenta já anunciada: os canais do WhatsApp. Por enquanto, a ferramenta só está disponível na Colômbia e em Singapura para fazer testes, mas a ambição passa por criar "o serviço de transmissão mais privado no mercado" — e lucrar com isso. Como, ainda não se sabe. "Talvez seja possível subscrever um canal e pagar uma fee para ter notícias de uma agência noticiosa ou de uma celebridade de quem gostamos", disse a Diretora de Produto do WhatsApp.

Em suma, a Meta parece querer ir atrás das grandes empresas para que quase uma década depois consiga finalmente transformar a aplicação de mensagens em algo que consiga gerar receitas e justifique o investimento. Se vai dar resultado ou não, só o tempo o dirá. Mas pelo menos já tem um plano e sabe quem quer conquistar e seduzir: os negócios.