Tudo aconteceu no final de dezembro, na semana de estreia do drama épico Gladiador II. Numa entrevista filmada para a Paramount Pictures, Christopher Nolan, cineasta americano, questiona Ridley Scott sobre as filmagens em Malta e Marrocos, destinos onde já tinha estado nas filmagens do primeiro filme, que inspirou a sequela. Entre provocações, Ridley Scott diz não aconselhar Malta como um destino para viajar. “Não está cá ninguém de Malta, pois não? Eu não voltava lá de férias”, insiste. 

O vídeo da entrevista é partilhado nas redes sociais por Johann Grech, chefe executivo da Malta Film Studios, com edições que ocultam as críticas de Ridley Scott. No excerto divulgado, o produtor britânico refere apenas que já filmou nestes destinos três vezes, e que considera Malta “um tesouro de arquitetura”, que viaja desde a época medieval ao período renascentista, entre outros elogios. 

A tentativa de Johann Grech de corrigir a intervenção foi fortemente criticada pelo Partido Nacionalista (PN), que defendeu que o diretor deveria abdicar do cargo de responsável pela indústria de cinema de Malta. Segundo a deputada do PN, Julie Zahra, o país deve servir o interesse dos profissionais malteses e apoiar as suas iniciativas, “e não o ego do CEO”. Na mesma linha, o Partido Trabalhista condenou a posição do diretor, reforçando que “qualquer comentário que difame o país é condenável”. 

Numa declaração enviada ao Times of Malta, Ridley Scott admite que o comentário foi “uma tentativa de humor que correu mal”. Ao contrário do que proferiu, considera o país uma “jóia no Mediterrâneo” e um espaço de inspiração. Explica também que o comentário problemático surgiu numa alusão aos anos de filmagem passados em Malta, que não justificam o seu retorno. 

Ridley Scott refere ainda que alguns dos seus “melhores trabalhos” feitos em Malta foram responsáveis pela canalização de “recursos e oportunidades significativas para o país”. Sobre a relação com Johann Grech, tece apenas considerações positivas e diz ansiar por colaborações futuras.

Nas contestações do PN estão principalmente em causa os benefícios fiscais concedidos à produção americana: de acordo com o jornal Times of Malta, o filme Gladiador II recebeu cerca de “47 milhões de euros em dinheiro dos contribuintes”. Este foi o maior incentivo financeiro a produções cinematográficas registado na União Europeia, na forma de reembolso em dinheiro de 40% das receitas do filme. Do outro lado, a economia de Malta cresce com as receitas da promoção turística. 

A discussão sobre os incentivos fiscais à indústria cinematográfica não é novidade. Em agosto de 2023, o diretor da Malta Film Studios publicou um vídeo nas redes sociais a posicionar-se a favor dos descontos de apoio às produções internacionais filmadas em Malta. Cinco meses depois, Julie Zhara, em representação do partido da oposição, acusa Johann Grech de estar agora a “ser atacado pela pessoa [Ridley Scott] que mais beneficiou desses descontos”. 

O Ministro da Cultura de Malta, Owen Bonnici, ainda não se pronunciou sobre o assunto. 

*Artigo escrito pela jornalista estagiária Ana Filipa Paz e editado pela jornalista Ana Maria Pimentel