Quando estreou em 2019, “Joker” foi uma enorme e inesperada surpresa. Inspirado em clássicos de Scorsese, como “O Rei da Comédia” e “Taxi Driver”, o filme arrecadou mais de mil milhões de dólares em bilheteiras a nível mundial, um recorde que se manteve entre os filmes para maiores de 18 até este ano, quando foi ultrapassado por “Deadpool & Wolverine”. Além disso, “Joker” conquistou 11 nomeações para os Óscares, ganhando dois: Melhor Ator para Joaquin Phoenix e Melhor Banda Sonora Original para a compositora islandesa Hildur Guðnadóttir.

A abordagem pouco ortodoxa de Todd Phillips, um realizador vindo da comédia (“A Ressaca”), na forma como detalhou as origens de um dos vilões mais infames da história do cinema, não deixou ninguém indiferente (se todos gostaram é outra história). Embora não fosse certo que Phoenix aceitasse participar numa sequela — até porque a ideia inicial era que Joker fosse um filme isolado e não uma saga — Phillips encontrou uma forma arrojada e inesperada de surpreender o público e de o chamar de volta: transformando o filme num musical. Assim, aqui estamos, prontos a entrar na “Loucura a Dois”.

No final do primeiro filme, vimos Arthur Fleck atingir o auge da sua insanidade ao cometer um homicídio em direto na televisão, deixando no ar a pergunta: “E agora?” Ora, agora, como explica a sinopse oficial, o comediante fracassado está internado em Arkham (o asilo de Gotham City), aguardando julgamento pelos seus crimes enquanto Joker. É no asilo, enquanto luta contra a sua dupla personalidade, que “não só encontra o amor verdadeiro, mas também a música que sempre esteve dentro dele”.

Os primeiros trailers sugeriram logo esta paixão, apresentando uma versão distorcida do clássico “boy meets girl”, em que o “rapaz” é um assassino em série e a “rapariga” enfrenta também os seus próprios demónios psicológicos. Nesta adaptação, contudo, há uma diferença em relação ao que sabíamos até aqui: o amor de Joker surge enquanto paciente no Arkham, e não como a Dra. Harleen Quinzel, psiquiatra que acaba por se apaixonar pelo Príncipe Palhaço do Crime. Esta mudança, aparentemente insignificante para o público em geral, levou Phillips a defender publicamente a sua decisão.

Para quem não está familiarizado, refira-se que Joker e Harley Quinn são um dos pares românticos mais famosos da DC Comics, e a sua relação tem assumido várias formas em outros filmes e nas bandas desenhadas. Mais recentemente, vimos Margot Robbie e Jared Leto a darem vida às personagens no filme “Esquadrão Suicida” (2016). Em “Loucura a Dois”, a narrativa retoma o amor tresloucado de Joker e Harley, mas leva-o para um patamar muito mais sombrio e profundo. E desta vez, em vez de Margot Robbie, é Lady Gaga quem assume o papel.

No Metacritic, “Joker: Loucura a Dois” tem uma média de 46 em 100 (baseada em 54 críticas) e uma pontuação de 5,1 em 10 atribuída pelo público. No Rotten Tomatoes, a situação é ainda mais desfavorável, com o filme a alcançar apenas 38% de aprovação entre os críticos e 36% junto do público.

O consenso parece ser de que a sequela não está à altura do antecessor, especialmente em termos narrativos, talvez devido ao abandono da “estrutura Scorsese”. Ainda assim, tanto Joaquin Phoenix como Lady Gaga merecem elogios — especialmente esta última.

O The Hollywood Reporter, por exemplo, diz que a vencedora de 13 Grammys “é uma presença convincente” e que os “seus números musicais, tanto duetos como solos, têm uma vitalidade de que o filme, muitas vezes sombrio, precisa desesperadamente”. Na mesma toada, a Time sugere que, embora o filme seja “uma experiência caótica e por vezes cansativa”, a interpretação de Lady Gaga consegue humanizar o legado de Harley Quinn. E nos momentos em que a vulnerabilidade da personagem é posta à prova, Gaga captura de forma convincente “o caráter destrutivo e terno de Harley”.

Por tudo isto (legado, contexto e talento envolvido), “Joker: Loucura a Dois”parece ser uma experiência diferente. Se é para ser uma experiência no cinema ou uma para ter no streaming daqui a uns meses, o tempo e o boca-a-boca das próximas semanas o dirão.

E embora alguns possam considerar este novo rumo como um afastamento radical em relação ao que funcionou no primeiro filme, para aqueles dispostos a explorar a fusão com musicalidade e insanidade, a sequela pode funcionar como uma interpretação ousada e refrescante da relação entre duas das personagens mais icónicas da DC.