"Há 7,5 mil milhões de pessoas no mundo. Dessas 1,5 mil milhões fala inglês e desses 360 milhões são nativos ou têm o inglês como primeira língua. Este número representa apenas 5% da população mundial e ainda assim a grande maioria do conteúdo internacional é produzido num sítio e numa só língua: Hollywood e em inglês. Hollywood tem fantásticos storytellers, mas isto é uma enorme falha e é nessa falha que se vive uma oportunidade, porque as grandes histórias devem vir de qualquer lado", expôs Greg Peters, 'Chief Product Officer' da Netflix.

Os números acima citados mostravam uma possibilidade difícil de contestar estatisticamente, mas que ainda não tinha sido albergada por um exemplo concreto. Pelo menos não na Netflix.

Foi uma questão de tempo até o facto de mais de metade dos 139 milhões de subscritores do serviço de streaming fora dos Estados Unidos se fizessem ouvir. Primeiro, nas legendas e dobragens, depois no conteúdo produzido fora de Hollywood.

créditos: Web Summit/DR

A primeira aposta de um original Netflix foi "House of Cards". Trata-se de uma série que percorre as teias de Frank e Claire Underwood pelo poder político nos Estados Unidos, mas que serviu para mostrar um mundo muito para além do mercado norte-americano com a necessidade de fazer mais legendas, em 26 idiomas diferentes e 10 dobragens.

Mas o verdadeiro terramoto aconteceu com a série brasileira "3%", uma distopia em que a elite da sociedade vive numa ilha paradisíaca afastada dos bairros de lata sobrelotados. A série teve uma aceitação brutal, com mais de metade das visualizações a virem de fora do Brasil.

A partir daí a Netflix continuou. A série alemã "Dark", por exemplo, "não foi apenas uma das séries da Netflix mais vistas de sempre na Alemanha". "Por cada hora que a série era vista na Alemanha era vista durante nove horas lá fora. 90% das visualizações da série vinham fora da Alemanha. Um mês depois de ter sido lançada integrava o top-10 em 136 países", revela Peters.

Este ano o conteúdo original Netflix, fora de Hollywood, atingiu o boom com a série espanhola "La Casa de Papel". Um caso curioso, uma vez que já tinha sido transmitida na Antena 3, mas que ao ser lançada para o mercado global pela Netflix tornou-se na série — numa língua que não o inglês — mais vista de sempre da plataforma.

"As pessoas querem histórias autênticas, querem a perspetiva de um criador apaixonado que está envolvido na realidade local, na cultura local. E isso traz ao de cima os traços universais das histórias. Não importa onde vives, que língua falas, o que interessa é saber contar bem as histórias", afirmou Greg Peters.

O executivo da Netflix explica que isto faz parte de um ciclo. "Os criadores podem contar a sua história de uma forma mais cativante, [e] nós podemos abrir o mundo para contarmos novas histórias de várias perspetivas. Nunca houve um melhor momento para se ser um consumidor ou criador de filmes e programas de televisão", conta.

Até os Estados Unidos — um país que, segundo Greg Peters, se mostrou muito cético em relação a filmes e séries que não fossem em inglês — se rendeu quando ficaram disponíveis séries "bem dobradas e com bons subtítulos em inglês; os números dispararam".

"Temos agora as ferramentas para fazer isso de uma forma que nunca foi feita. [Mas] quão grande é? Acredito que daqui a um futuro não muito distante haverá mais originais internacionais que originais de Hollywood. Não vejo razão para que tal não aconteça", salientou Greg Peters.

Aliás, o 'Chief Product Officer' da plataforma de séries em 'streaming' aproveitou a sessão na Web Summit para anunciar duas novas séries: uma em espanhol e outra em norueguês. A primeira chama-se "Alma" e é sobre uma jovem que perde a memória num acidente de autocarro e tem de desvendar o mistério por trás da sua perda de identidade. Já a produção norueguesa, "Ragnarok", centra-se num conto mitológico de um deus que reencarna numa jovem de 17 anos.

Portugal ainda à espera, com um grande exemplo do outro lado da fronteira

Se a aposta tem sido a descentralização de Hollywood, Portugal ainda continua à espera. Num país onde a novela ainda é rainha, e a produção nacional de séries é alavancada e desenvolvida na RTP, o canal público, a Netflix ainda não deu o primeiro passo.

"No geral, estamos abertos a séries oriundas de toda a parte, estamos constantemente à procura de uma grande história de Portugal e de outros territórios. [No entanto], nada a anunciar neste momento. Assim que encontrarmos aquele perfeito ['the perfect one'] iremos anunciar", acrescentou.

Sobre a aposta que a empresa fez em Madrid, Greg Peters disse que a produção na capital espanhola é "um investimento a longo prazo", adiantando que a Netflix vai aumentar o número de programas que está a produzir em Espanha.

Por enquanto, nesta fase, a aposta será a produção de programas espanhóis, "mas haverá oportunidades para outras produções europeias lá", acrescentou.

Relativamente a Portugal, a Netflix não vê porque razão o país não poderá ter "o mesmo sucesso com o tempo".

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