Esta é uma das conclusões do livro "Jazz, Golf e American Dream", da investigadora e docente universitária Tânia Santos, lançado na quinta-feira.
Natural da freguesia da Agualva, na ilha Terceira, Tânia Santos é doutorada em História Insular e Atlântica pela Universidade dos Açores e transformou em livro a sua tese de doutoramento, denominada “O impacto social da presença norte-americana na ilha Terceira, Açores, durante o período do Estado Novo (1933-1974)”.
Em entrevista à agência Lusa, a historiadora começou por dizer que a presença norte-americana na base das Lajes, que se oficializou em 1946, “foi um fenómeno arquipelágico”.
Segundo a investigadora, durante aquele período assistiu-se aos “anos dourados da presença estrangeira", quando ocorreram “as maiores transformações” na ilha.
“Chegam as forças estrangeiras a uma ilha, fechada sobre si, desconhecendo-se para além das fronteiras marítimas e, de repente, temos o sonho americano na ilha Terceira, que acaba por impulsionar um conjunto de transformações nas mais variadas áreas, desde as económicas às sociais, cultuais e até mesmo linguísticas”, refere.
Tânia Santos constata que, “principalmente quem trabalhava na base das Lajes, acabou por ter acesso ao ‘american way of life’ e a todas as transformações com impacto mais direto”.
Os primeiros trabalhadores portugueses na base das Lajes após a presença norte-americana “pertenciam às franjas mais vulneráveis” da população, assegurando “trabalhos duros”, mas passaram a ter acesso a uma “maior prosperidade e qualidade de vida”, afirmou.
A docente universitária aborda ainda no seu livro a questão das adoções de crianças da ilha Terceira por famílias norte-americanas, que ainda hoje “levanta muitas questões em termos éticos e morais, e também em termos legais”.
Na sua leitura, estes “fenómenos foram impulsionados pela ânsia de fuga à pobreza e pela estratégia migratória resultante dessa presença”.
Tânia Santos salvaguarda que não se pode falar “exatamente de adoções ilegais, uma vez que as primeiras leis da adoção são de 1966”, sendo que, até àquela data, “foi preciso criar mecanismos que, de alguma forma, legalizassem essas saídas”, como os “termos de consentimento e responsabilidade”, que eram reconhecidos em conservatória.
De acordo com a investigadora, "muitas crianças saíram da ilha completamente indocumentadas, mas como filhos biológicos norte-americanos, desconhecendo-se completamente o seu processo de adoção”, e eram retiradas da Terceira por via dos aviões militares estacionadas na base das Lajes.
A presença norte-americana potenciou também o casamento de jovens da ilha com militares norte-americanos “devido ao fascínio da farda” e ao “casamento com um bom partido”, além de esta ser uma forma de se emigrar para os Estados Unidos, uma vez que a noiva "entrava completamente legal”.
Mais tarde, estas noivas ficavam em condições legais de chamar para os Estados Unidos as suas famílias, uma vez que na altura “estava associado à América (e ainda hoje) qualidade de vida e prosperidade”.
A investigadora faz um balanço positivo da presença norte-americana, uma vez que os açorianos tiveram acesso, naquela altura, a “uma certa modernidade, prosperidade e abundância que os americanos partilhavam na comunidade”, além do acesso privilegiado a cuidados de saúde de primeira instância, por exemplo.
“Era quase como uma ‘litlle America, o que nos tínhamos”, conclui a investigadora, que ressalva ter tido o “privilégio de viver o sonho americano na própria ilha”.
O livro "Jazz, Golf e American Dream" foi lançado na quinta-feira, em Angra do Heroísmo, na ilha Terceira.
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