"TV Fest – de casa dos artistas para a sua televisão". É este o mote do festival que tem um orçamento de um milhão de euros, saídos das contas do Ministério da Cultura.

Serão quatro atuações por dia, durante pelo menos 30 dias, transmitidas na RTP Play e no canal 444, em todas as operadoras nacionais (NOS, MEO, Vodafone e Nowo).

Em declarações ao Jornal de Notícias, a Ministra da Cultura, Graça Fonseca explica que "a música foi das primeiras áreas ter de parar, ainda antes do estado de emergência". "E foram os músicos que iniciaram uma dinâmica de entrar em nossas casas, através do online e das redes sociais", acrescentou.

À publicação a ministra salientou ainda dois objetivos que o TV Fest terá de cumprir: "as escolhas têm de refletir a diversidade da música portuguesa e o pagamento tem de incluir os técnicos". Cada músico será encorajado a identificá-los publicamente na ficha técnica do programa em que participa, salienta o artigo do Jornal de Notícias.

"Para muitas pessoas que se viram obrigadas a ficar em casa, a televisão e a Internet são a única forma de se manterem informadas, mas também de terem acesso à cultura. E nunca vivemos um momento em que tivéssemos tanto acesso à cultura a partir do nosso ecrã”, realçou a ministra, agora em declarações ao Público.

Estão previstos 120 concertos, que serão conteúdos inéditos filmados nas casas dos próprios artistas, numa operação cujas gravações já iniciaram há uma semana.

No primeiro dia de festival, esta quinta-feira, atuarão a partir das 22h00, Fernando Tordo, Marisa Liz, Rita Guerra e Ricardo Ribeiro.

Ao SAPO24, o fadista salienta a importância do evento. "É uma grande ajuda para os artistas, neste momento muito difícil", diz fazendo questão de agradecer ao Ministério da Cultura pela iniciativa.

Ricardo Ribeiro sublinha ainda a importância da remuneração e diz que "os artistas têm o dever moral e ético de a repartir com as suas equipas, quer músicos quer técnicos". Sobre o que podemos esperar da sua atuação, fica prometida uma surpresa. "Nestes dias compus uma música para uns versos de Teixeira de Pascoaes, grande poeta e que muito admiro", revela.

Júlio Isidro apadrinha o festival

O 'senhor televisão' será o padrinho da iniciativa e lançará o projeto na sua estreia. Depois, será apenas "mais um espetador".

O convite chegou na voz da própria ministra, disse Júlio Isidro ao SAPO24. "Nós não queremos escolher os artistas, e como o Júlio tem alguns anos nestas coisas...", reproduziu.

Para além de apadrinhar o festival, Júlio Isidro foi incumbido de convidar os primeiros quatro artistas a subir ao palco virtual do TV Fest. No critério de seleção esteve a "preocupação de escolher dois homens e duas mulheres" e, ao mesmo tempo, garantir "uma certa diversidade nos estilos musicais".

A partir daí, são os próprios artistas que indicam os nomes que lhes vão suceder. "É um processo muito democrático, mas já se sabe que nunca há unanimidade", diz.

Os músicos têm, de acordo com o apresentador, apenas uma obrigação: "escolherem artistas que sejam inspiradores para eles e, sobretudo que não sejam da mesma área". E se ficou com curiosidade sobre o que vamos ouvir nos dias seguintes, Júlio Isidro avança com alguns nomes: Héber Marques, Magano, Tiago Bettencourt, Lena D'Água, Rita Red Shoes, Tomás Wallenstein, Ricardo Toscano ou Bruno Santos.

"Estes concertos só podem ser feitos por músicos autosuficientes, o que limita um bocadinho. Mas o Governo não podia estar a aconselhar as pessoas a ficarem em casa e depois juntar um grupo de músicos numa casa, porque obviamente não vivem uns com os outros", brinca.

Para o apresentador do "Inesquecível", na RTP Memória, este é um bom programa de fim de noite e poderá inverter a "tendência, que começou a surgir há alguns anos, de que a música não faz audiências".

Iniciativa não agrada a todos e já há uma petição a pedir o cancelamento

Iniciativa não agrada a toda a classe artística. Também esta quarta-feira foi criada uma petição, que já conta com mais de oito mil assinaturas, a pedir o cancelamento "imediato" deste festival.

"Pedimos o cancelamento imediato do TV Fest, e o cancelamento de qualquer medida que fomente disparidades, competição e desigualdade no acesso. A classe artística necessita de um reforço claro e objetivo à linha de apoio a artistas e entidades, de um mecanismo que reforce a sua proteção social perante o estado e legisle a sua contribuição à sociedade através do reconhecimento do seu estatuto de intermitência".

Segundo o manifesto, as premissas do festival "anulam o trabalho invisível de mediação, pensamento e criação de experiência entre públicos e artistas, retirando-lhes a possibilidade de efetuar o seu trabalho e elegendo beneficiários ativos".

A petição exige ainda "imparcialidade, justiça e transparência absoluta sobre todos os critérios de atribuição e distribuição de oportunidades e fundos públicos".

Nas redes sociais, são já vários os músicos a criticar o evento.

"Preocupa-me (...) que não haja um critério maior, nenhum, a não ser o da escolha pessoal de cada artista que é convidado a participar, na forma como se irá distribuir um milhão de euros por 120 estruturas num setor tão afetado quanto o da música. Não seria melhor distribuir esta verba por 500 estruturas ou mais? E ter a certeza que os mais fragilizados eram incluídos?" escreveu Paulo Furtado (Legendary Tigerman) na sua conta pessoal de Facebook.

A preocupação com o critério é partilhada por Valter Lobo, que diz "serem escolhidos e convidados músicos exclusivamente da área de Lisboa por razões logísticas e técnicas". "O dinheiro público, sob forma de apoio não tem alvo geral e abstrato. Tem um objetivo bem particular e concreto, centralizado e em que se esquece todos os artistas de um país que tem Norte, Centro e Sul. Interior e Litoral. Ricos, remediados e necessitados", acrescenta.

Alex Cortez, ex-Rádio Macau, também critica a iniciativa e diz que não o faria se fosse promovida por outra entidade que não o Ministério da Cultura. "Aproveito ainda para dizer que, se isto fosse uma iniciativa da EDP, da NOS ou do Continente, tirava-lhes o chapéu... e que não tenho nada contra os artistas que venham a participar, mas saúdo aqueles que já se mostraram indisponíveis para participar nesta palhaçada", escreveu.