Lisboa: Alunos a deambular pelos recreios é o cenário em muitas escolas
Numa ronda por várias escolas do distrito de Lisboa, a Lusa confirmou a realidade relatada por Filinto Lima, diretor do Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), no dia em que são esperados milhares de professores em frente ao parlamento, durante o debate da proposta de Orçamento do Estado na especialidade, que prevê a não contabilização de cerca de nove anos de serviço dos docentes.
Segundo Filinto Lima, os casos mais problemáticos são as escolas de 1.º ciclo, onde “há uma grande razia, o que tem uma repercussão para os pais, uma vez que os alunos não podem ali ficar”.
Nas restantes escolas, as famílias deverão estar a ser menos afetadas, uma vez que os portões estão abertos apesar de muitos alunos não terem aulas, como a Lusa constatou em escolas dos bairros lisboetas de Benfica e Olivais, assim como em Linda-a-Velha e Setúbal.
“Na Escolas Básicas de 2.º e 3.º ciclos há muitos miúdos a deambular pelos recreios e cria a sensação de que estão no intervalo, porque a maior parte dos professores está a faltar às aulas”, disse à Lusa Filinto Lima, que acredita que a greve de hoje “será a maior dos últimos anos”.
O responsável disse ainda conhecer casos de “muitos professores que não vão a Lisboa à concentração, mas estão em greve”.
Filinto Lima estima que no agrupamento de escolas Dr. Costa Matos, em Gaia, no Porto, que dirige, a adesão à greve ronde os 90%.
Às 09:30, Filinto Lima tinha a informação de que faltavam dois terços dos professores na escola-sede, frequentada por alunos entre o 5.º e o 9.º ano, não tendo ainda dados sobre o pré-escolar e o primeiro ciclo.
Na Escola Básica Quinta de Marrocos, em Benfica, Lisboa, os portões abriram à hora marcada e os alunos entraram sem saber se iam ter aulas, enquanto um funcionário dizia à Lusa que a greve está a ter “bastante adesão”.
Poucos minutos depois muitos alunos voltaram para o recreio e informaram os pais, que ficaram à porta, que não iam ter a primeira aula.
Em declarações à Lusa, Rita Silva, mãe de uma aluna do 5.º ano naquela escola, contou que já tinha ido deixar o outro filho na casa da avó porque a professora do primeiro ciclo da Escola Professor José Salvado, em Benfica, tinha faltado.
“A greve causa muito transtorno”, disse Rita Silva, confessando que se não fosse a sogra tinha de faltar ao trabalho.
Telma Pinto também aguardava à porta da Escola Básica Pedro de Santarém, em Benfica, notícias da filha, que frequenta o 5.º ano, para saber se podia ir trabalhar.
“Os professores têm direito à greve, estão a lutar pelos seus direitos, mas deviam avisar os pais que iriam faltar para podermos reorganizar a vida”, disse à Lusa Telma Pinto, confessando que nem pode levar a filha para o trabalho porque trabalha num restaurante no Mercado da Ribeira.
Na Escola Secundária José Gomes Ferreira, também em Benfica, dezenas de alunos encontravam-se à porta do estabelecimento de ensino porque não tiveram a primeira aula.
“A escola está a funcionar e muitos alunos estão a ter aulas. Nós vamos aguardar pela próxima hora”, disse à Lusa Teresa Santos, aluna do 10.º ano.
O mesmo cenário foi encontrado pela Lusa na Escola Sebastião da Gama, em Setúbal, na Escola Secundária Professor José Augusto Lucas, em Linda-a-Velha, e na Escola EB2,3 Fernando Pessoa, nos Olivais, e na Escola Básica 2,3 Professor Delfim Santos, em Benfica.
Vila Real: Alunos gritam de contentamento por um dia sem aulas em Vila Real
No Centro Escolar das Árvores, em Vila Real, após o toque de entrada das 09:00, os alunos correram para o recreio da escola a gritar “greve, greve, greve” depois de perceberem que os professores faltaram às aulas hoje.
Os meninos ficaram contentes por não terem aulas, ao contrário dos pais e encarregados de educação que se mostraram mais preocupados e tiveram que procurar alternativas para os deixar durante o dia.
Em Vila Real, os efeitos da greve foram mais visíveis nas escolas básicas do primeiro ciclo do que nos estabelecimentos de ensino do secundário e dos 2.º e 3.º ciclos.
Paulo Azevedo e o filho de sete anos cumpriram a rotina diária na escola das Árvores e antes das 09:00 estavam no estabelecimento. Só que hoje Paulo teve que esperar pelo toque de entrada, percebendo depois que o professor aderiu à greve nacional convocada para hoje.
O filho não conseguiu esconder a alegria de passar um dia sem aulas e disse que ia passar o dia a jogar em casa da avó. O pai ainda aconselhou que também era preciso estudar.
Alberto Cruz levou a neta de oito anos à escola e esperou também à porta até ter a certeza de que não havia aulas.
"Tem a sorte de poder ficar com os avôs”, disse aos jornalistas.
Sílvia Ferreira já contava com a greve e até disse que concorda com ela. No seu caso, não provocou transtornos porque pode ficar em casa com o filho.
“Até calhou bem porque ele fez anos ontem e hoje pode ficar a brincar com os presentes”, referiu.
Vera Mónica, mãe de dois meninos de 10 e quatro anos, teve de levar os meninos para casa, onde hoje iam ficar com o pai. “Estou ao lado dos professores, eles têm toda a razão em lutar pelos seus direitos”, salientou.
Carla Santos regressou à escola para ir buscar o filho de seis anos e “fez o jeito” a outros país levando consigo mais dois meninos.
À porta da Escola Diogo Cão EB 2,3 o movimento esta manhã era igual ao de todos os dias. Muitos carros e muitos pais a deixarem os meninos.
Alguns professores faltaram, mas os alunos tiveram que ficar dentro do recinto escolar.
A pequena Laura, do sétimo ano, disse que o professor da primeira aula aderiu à greve e que ia ficar na escola à espera para ver se os outros docentes também iam faltar ou não e que só depois ligava à mãe para a ir buscar.
Braga: "Estamos a ver quem teve sorte e quem teve azar para vermos quantos estamos para fazer um torneio de futebol"
A greve dos professores marcada para hoje fez duas das maiores escolas de Braga "arrancar pela metade", com alunos a ter aulas "com toda a normalidade" e outros a festejar o "feriado a meio da semana".
Em declarações à Lusa, fonte do agrupamento Carlos Amarante, Hortense Santos, explicou que há aulas a decorrer, mas que cerca de metade das salas estão vazias por falta do professor e à porta da escola os alunos fazem a contabilidade de quem "teve sorte ou azar".
Na Escola Secundária D. Maria II, o cenário é idêntico, segundo disse à Lusa fonte naquele estabelecimento de ensino, "faltaram alguns professores," mas há aulas a decorrer normalmente.
"Arrancou pela metade. Ainda estamos a contar, a escola é grande, mas para já está meio/meio", afirmou a fonte na Carlos Amarante.
Na D. Maria II "há aulas a decorrer com toda a normalidade" embora "alguns professores tenham aderido à greve, ainda não dá para adiantar números porque ainda é cedo para essa contabilização".
À porta da Carlos Amarante fazem-se também outras contas: "Quantos há para o torneio?", é a questão lançada por um grupo de alunos que vai aproveitar a falta de aulas para se dedicar a jogos de consola. "Estamos a ver quem teve sorte e quem teve azar para vermos quantos estamos para fazer um torneio de futebol", explicou prontamente um dos estudantes.
"Isto de ter feriados a meio da semana é fixe, serve para descansar. O pior é que depois os ‘profs' vão querer dar a manteria a correr porque já é o segundo furo por greves este período", lembrou outra aluna.
Mas se a greve dos professores parece não incomodar muito os alunos, os encarregados de educação começam a "não achar piada à brincadeira", embora entendam os motivos.
"Eu até entendo porque fazem greve, além de que é um direito que os trabalhadores têm. Mas já começo a não achar piada à brincadeira de não ter onde deixar os miúdos", explicou Sónia Campos, mãe de duas alunas de 13 e 12 anos.
Algarve: "O meu filho entrava às 08:30, mas vai ter que ficar na escola quase o dia todo, até às 15:00, para ter uma aula de Ciências
Muitos alunos ficaram hoje sem aulas na região do Algarve devido à greve dos professores, uma situação que é transversal aos vários níveis de ensino, disse à Lusa Ana Simões, da Fenprof.
"A noção que temos é a de que há muitos professores a faltar e muitos alunos sem aulas", disse a dirigente sindical, observando que, apesar de ainda não terem sido apurados dados concretos, a adesão à greve "está a ser elevada" e é "transversal" aos vários níveis de ensino.
Na escola EB 2,3 Joaquim Magalhães, em Faro, boa parte dos alunos ficaram hoje sem aulas na maioria das disciplinas, contudo, estão a ser informados de que não podem sair da escola, a não ser que os encarregados de educação os vão buscar, disse à Lusa a mãe de um aluno do 6º ano.
"O meu filho entrava às 08:30, mas vai ter que ficar na escola quase o dia todo, até às 15:00, para ter uma aula de Ciências, que é a única disciplina em que o professor não faltou", contou Lisa Orvalho.
De acordo com aquela mãe, "mais de 50% dos professores" deverão ter faltado hoje naquela escola, o que foi visível sobretudo nos primeiros tempos, a partir das 08:30, com muitos alunos a ficarem sem aulas.
Já na Escola Básica de S. Luís, situada também no centro da cidade e que pertence ao mesmo agrupamento, a adesão à greve não causou grandes perturbações, com boa parte dos alunos a terem um dia normal de aulas.
Na cidade de Portimão, a totalidade dos estabelecimentos de ensino estão a funcionar, embora a greve tenha algum impacto nas escolas Manuel Teixeira Gomes, Poeta António Aleixo e da Bemposta, onde dezenas de alunos ficaram sem aulas.
Protesto dá frutos
A secretária de Estado Adjunta e da Educação prometeu hoje no parlamento que vai ser feita “uma contagem do tempo de serviço” dos professores de forma faseada, que será negociada com os sindicatos.
“Vai haver uma forma de a contagem da carreira docente ser, de alguma forma, recuperada. Veremos com os sindicatos com que faseamento”, confirmou a secretária de Estado Alexandra Leitão, durante a audição que está a decorrer no parlamento no âmbito do debate da proposta de Orçamento do Estado de 2018 na especialidade.
O primeiro-ministro afirmou na terça-feira que o cronómetro da carreira dos professores vai voltar a contar para efeitos de progressão, lembrando, no entanto, que a reposição imediata e total dos anos de congelamento custaria 650 milhões de euros.
Hoje, no parlamento, Alexandra Leitão reafirmou essa decisão em resposta à deputada do PSD Nilza de Sena, que tinha criticado a decisão de não contabilizar os nove anos de serviço em que a progressão de carreira esteve congelada, dizendo que “não é assim que se fazem as coisas”.
(Notícia atualizada às 11h12)
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