No relatório apresentado na segunda-feira, é sublinhada a “dificuldade que a Comissão teve de fazer passar, sobretudo junto de alguns media, mas talvez sobretudo dentro de muitos setores da própria Igreja, uma das suas mensagens repetidas à exaustão: o Estudo que realizava não era um estudo contra a Igreja Católica portuguesa, ou contra pessoas em particular, nomeadamente alegadamente abusadoras”.
A comissão liderada por Pedro Strecht faz questão de sublinhar que foi um estudo realizado a pedido da Igreja, “destinando-se a apurar o conhecimento e a caracterização de situações de abuso sexual decorridas no passado e até ao presente, de modo a preveni-las no futuro”.
“A Comissão sempre distinguiu o todo da parte, a árvore da floresta: as pessoas abusadoras, membros da Igreja Católica portuguesa ou seus colaboradores diretos, constituem uma franja reduzida de um grande universo em que a esmagadora maioria dos seus membros nunca praticou crimes desta ordem”, explica o relatório.
Segundo o documento, “o estigma negativo que pode atingir todos eles, membros saudáveis de uma estrutura de grande significado e implantação na sociedade portuguesa, como é a Igreja Católica, constitui, porém, um dano ético colateral sobre o qual existiu consciência crítica e que, através da intervenção pública”, a comissão procurou contrariar.
Entretanto, no final do mês, a comissão fará chegar à Conferência Episcopal Portuguesa e ao Ministério Púbico a relação de sacerdotes alegadamente “abusadores” e que ainda se encontram no ativo.
Em declarações à SIC Notícias, na noite de segunda-feira, o coordenador da Comissão Independente, Pedro Strecht, revelou que será mais de uma centena o número de padres suspeitos de abusos sexuais ainda no ativo. Neste número estarão muitos sacerdotes cujos casos que terão protagonizado terão já prescrito.
A decisão da Comissão Independente em fazer chegar a relação à CEP e à Justiça prende-se, segundo o relatório, e quanto aos padres com casos prescritos, com a necessidade de saber se, “sem crime a investigar, cabe ainda ao Ministério Público o poder de averiguar da eventual atividade criminosa de alguém sobre quem impende a suspeita de, no passado, ter infringido, apenas com o fundamento de que, a confirmar-se tal, será de prever o prosseguimento, no presente, de idênticas condutas”.
“Embora tudo aponte para que tal não seja possível, quer à luz das Leis Penal e Processual Penal, quer em face do próprio texto da Constituição da República Portuguesa, ainda assim poderá concluir-se que tal decisão sempre haverá de caber ao Ministério Público e não à Comissão Independente”, acrescenta o relatório.
A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja Católica em Portugal iniciou a recolha de testemunhos de vítimas em 11 de janeiro de 2022, tendo validado 512 denúncias das 564 recebidas, o que permitiu a extrapolação para a existência de um número mínimo de 4.815 vítimas nos últimos 72 anos.
A Conferência Episcopal Portuguesa vai tomar posição sobre o relatório, de quase 500 páginas, numa Assembleia Plenária agendada para 03 de março, em Fátima.
Comentários