“Eu fiquei um pouco surpreendido. Não contava que pudesse acontecer uma coisa assim tão drástica sem que houvesse avisos. É que estas coisas começam sempre com um deslizamento de terras, um buraco que se abre, agora uma coisa tão drástica não contava”, afirmou.
Contactado pela agência Lusa, o antigo autarca, que voltou a ser o cabeça-de-lista da CDU à Câmara de Borba, no distrito de Évora, nas eleições autárquicas de 2017, recordou que, nos seus mandatos, o que estava em causa com o ainda troço da Estrada Nacional (EN) 255, mais tarde municipal, era “um conflito entre os industriais” do mármore e “o trânsito civil”.
“Era lama na estrada, era água na estrada” e, enquanto “os industriais reclamavam que estavam a trabalhar”, já “os civis, que éramos todos nós, reclamávamos porque ficávamos com os carros cheios de lama e de água”, lembrou.
Esse “conflito”, na altura, foi “tratado com o Plano de Urbanização de Borba”, quando “foram tomadas todas as decisões para a desclassificação” da EN255 e para “a acessibilidade de Borba à variante da A6 para Vila Viçosa”, evocou.
O último lanço da A6, entre Estremoz (Évora) e Elvas (Portalegre), abriu em setembro de 1999, tendo o projeto incluído uma variante para Vila Viçosa, cujo objetivo, segundo João Proença, era funcionar “como alternativa” ao troço da 255 que colapsou, no passado dia 19, provocando, pelo menos, dois mortos e três desaparecidos.
O processo “da aceitação da estrada pela câmara e da desclassificação desse troço da estrada só ficou concluído anos mais tarde, já nos mandatos de Ângelo de Sá” (PS), que liderou a câmara entre 2001 e 2013, frisou o antigo autarca da CDU.
No seu tempo, assinalou, “nunca esteve em causa a segurança”, sendo outra a discussão: “Havia era o recurso, o mármore, que era preciso estar desonerado daquela circulação automóvel que havia ali, que era conflituosa”, pois, “as máquinas circulavam de um lado para o outro da estrada, as pedreiras estão dos dois lados”, e “era preciso não prejudicar a sua exploração”.
Essa “reclamação dos industriais era compreensível” porque a informação dos técnicos, a partir de prospeções efetuadas, “apontava para uma zona de mármore de alta qualidade” e “o recurso sobrepunha-se à circulação”, admitiu antigo autarca, insistindo ter sido isso que justificou “que se fizessem as variantes todas”.
Segundo João Proença, aquele troço da estrada 255, após a desclassificação, devia ter ficado “vocacionado para a exploração do mármore”, com a “circulação condicionada às pessoas que fossem trabalhar para as pedreiras” e, mesmo que houvesse outra circulação, “a prioridade devia ter sido definida para a exploração” daquele recurso e devia ter sido “colocada sinalética” a apontar nesse sentido.
Ainda assim, argumentando que o acidente do passado dia 19 teve “muito de natural”, João Proença defendeu que “a culpa não pode ser imputada aos autarcas”, que são “uns pobres diabos” que querem “facilitar tudo às vezes” e não conseguem “avaliar tudo”.
“Eu nem imaginava que houvesse terra. A gente olha e só vê pedra, não se vê tanta terra por baixo da estrada”, disse, defendendo que cabia à fiscalização e aos responsáveis técnicos das pedreiras irem “verificando se aquilo estava em condições”.
O deslizamento de um grande volume de terra na estrada 255 entre Borba e Vila Viçosa provocou a deslocação de uma quantidade significativa de rochas, de blocos de mármore e de terra para o interior de duas pedreiras contíguas no dia 19 deste mês, às 15:45.
O Ministério Público instaurou um inquérito para apurar as circunstâncias do acidente e o Governo pediu uma inspeção urgente ao licenciamento, exploração, fiscalização e suspensão de operação das pedreiras situadas na zona de Borba.
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