O arguido em causa é um empresário de nacionalidade chinesa, detentor de visto “gold”, que constituiu em Portugal a firma unipessoal Alvorada, responsável por vários negócios, incluindo a compra do prédio do Porto, na Rua Alexandre Braga, número 100.

“A sede da empresa era em minha em casa. Não é normal, mas ele, na altura, ainda não tinha casa em Portugal. Pediu-me e eu acedi”, contou o economista, que trabalha para uma firma de Boticas, distrito de Vila Real, e que nessa qualidade assessorava os negócios da Alvorada.

Ainda segundo a testemunha, o alegado mandante dos dois fogos postos transferiu para contas particulares, já depois de preso, 600 mil euros dos cofres da sociedade unipessoal detentora do imóvel.

O economista disse que a transferência foi feita em tranches de 50 mil euros.

“Depois dessa transferência, deixei de ter acesso à conta”, afirmou o economista, que associou esses movimentos bancários ao ressarcimento de dinheiro que o arguido injetara (os chamados suprimentos) na Alvorada.

No processo está em causa também o crime de branqueamento de capitais, já que o banco Millennium BCP comunicou às autoridades que recebera ordens do empresário e da sua mulher para transferir para contas para a China duas tranches num total de, precisamente, 600 mil euros.

O julgamento deste caso foi iniciado em 02 de setembro, e a sessão de hoje, a 11.ª, foi marcada por frequentes quezílias envolvendo praticamente todos os sujeitos processuais.

Segundo o Ministério Público (MP), o processo decorre da determinação do empresário de revender, sem inquilinos e com grande lucro, um prédio que comprara, através da Alvorada, na Rua Alexandre Braga, do número 100, junto ao Mercado do Bolhão, no Porto.

Na tese do MP, secundada em despacho de pronúncia, o agente económico chinês nunca conseguiu acordar a saída dos únicos locatários que ali restavam (uma octogenária e três filhos, no terceiro piso), pelo que mandou atear dois incêndios no prédio, o segundo dos quais resultou na morte de um dos inquilinos.

De acordo com o despacho de acusação, em 23 de fevereiro de 2019, “na execução do planeado” pelo empresário e os seus contratados, foi ateado o primeiro fogo ao prédio, que “teve uma fraca evolução (…) por motivos alheios à vontade dos arguidos”.

Em 02 de março seguinte, o empresário chinês mandou “atear outro fogo ao edifício e matar os seus ocupantes”.

Os bombeiros resgataram três dos ofendidos, incluindo a octogenária, mas um outro foi encontrado um dia depois, carbonizado, nas águas-furtadas do prédio

O empresário chinês já negou, em anteriores sessões de julgamento, qualquer envolvimento direto ou indireto naquilo que é o objeto principal do processo: os incêndios e as consequências que deles resultaram.

Segundo o Ministério Público (MP), o empresário chegou a oferecer 10 mil, 15 mil e até 40 mil euros à família da octogenária que se matinha no prédio há 50 anos e que pagava uma renda mensal de 53,28 euros.

Contas feitas pelo MP, o homem teria “um prejuízo de pelo menos 320 mil euros, tendo em conta o valor do sinal”, se não libertasse o imóvel de pessoas e bens até 31 de maio de 2019. Mas lucraria 555 mil euros se consumasse, como conseguiu, o negócio em tempo útil.

O negócio de venda do prédio foi consumado mesmo após os dois incêndios e a morte associada a um deles e já depois da prisão do empresário. Formalizou-o a sua mulher, mandatada para o efeito e em representação da firma de ambos.

O processo reporta-se a um total de seis alegados crimes de homicídio qualificado (um consumado e cinco tentados), dois de incêndio (um consumado e outro tentado), um de extorsão tentada e outro de branqueamento de capitais.