“O PAN, enquanto partido político, é ainda uma criança que está em crescimento e, por isso, cometemos alguns erros de vez em quando, e assumimos, e estamos a fazer correções”, disse André Silva.

Em entrevista à agência Lusa no âmbito das eleições legislativas de 06 de outubro, o líder do Pessoas-Animais-Natureza salientou que “este não é o momento de o PAN estar no Governo”.

“O futuro dirá, mas este não é o momento”, reforçou, advogando que “o PAN, para influenciar as políticas governativas, não precisa de estar no Governo, não precisa de ter qualquer pasta”.

Mostrando-se convicto de que o partido vai conseguir aumentar a representação atual na Assembleia da República (André Silva é deputado único), e formar um grupo parlamentar, o porta-voz salientou que “o PAN vai contribuir para o partido socialista não ter maioria absoluta”.

“Independentemente de o Partido Socialista e outros partidos terem agora na sua narrativa objetivos muito nobres relativamente a algumas matérias, as pessoas sabem, os portugueses sabem, que elas só avançam com um PAN forte, mais reforçado. Isso eu estou convencido que vai acontecer e que o Partido Socialista não terá maioria absoluta”, assinalou.

O também cabeça de lista pelo círculo de Lisboa alertou que uma maioria absoluta acarta “um afunilamento democrático”, uma vez que “os partidos deixam de ouvir e há uma arrogância governativa” e, por isso, considerou ser “fundamental que o Partido Socialista não tenha maioria absoluta”.

Apesar de não “correr o risco superficial” de transpor o resultado das eleições europeias – nas quais elegeu o primeiro eurodeputado – para as legislativas, o deputado disse que o resultado de maio dá “o alento de perceber” que o partido pode “não chegar aos dois, mas chegar eventualmente aos três ou aos quatro deputados, ter um grupo parlamentar mais alargado”.

Apesar de recusar participar num executivo, o porta-voz do PAN não deixa de lado uma negociação com vista a encontrar uma solução governativa como a dos últimos quatro anos.

“Em função dos resultados, o PAN estará à altura das suas responsabilidades e, se os portugueses entenderem que o Partido Socialista não deve governar sozinho, ou que outro partido não deve governar sozinho, e que poderá depender do apoio, ou não, do PAN, estaremos sempre disponíveis, para já, apenas para nos sentarmos e para falarmos”, adiantou à Lusa.

Ainda assim, e apesar das “cedências e convergências” que possam acontecer, André Silva antevê “difíceis negociações que possam vir a ocorrer” devido à “narrativa de António Costa”.

“Aquilo que posso dizer é que, relativamente ao Partido Socialista, não vejo neste momento, face aquilo que são as suas grandes opções para a economia, grandes cedências ao programa do PAN, naquilo que são as respostas que temos de dar à crise climática e à emergência ambiental”, explicou, ressalvando que “tudo pode mudar em sede de negociação”.

Questionado sobre as condições que o PAN levará para essa eventual negociação, o deputado único afirmou que “há uma série de setores económicos que têm que, de facto, ser repensados de uma forma adulta e responsável, de uma vez por todas”.

“Eu acho que é fundamental era percebermos em sede de negociação se, setorialmente, em cada um dos pilares da economia que tem que ser, de facto, bastante intervencionado, com vista, a descarbonização, à neutralidade carbónica, se há ou não há disponibilidade de convergência, de cedência por parte do Partido Socialista em antecipar metas”, indicou.

Ainda assim, o PAN tem “uma visão do mundo e da sociedade” que, “neste momento, não se compagina com nenhum dos outros partidos”.

Da última legislatura, o partido faz um “balanço extremamente positivo” da sua atuação na Assembleia da República e assinala que houve “uma série de questões em termos de matérias ambientais que, até o momento, não tinham sido debatidas”.

“Quando entrei, em 2015, nem eu nem as pessoas sabiam o que é que nos esperava” do ponto de vista “da burocracia, da forma como se trabalhava na Assembleia da República”, recordou.

“Mais do que a quantidade, o importante para nós foi, no fundo, a qualidade das iniciativas que apresentámos e a variedade dos temas e a introdução de novos temas, temas que ninguém tinha trazido ou que não havia coragem para os trazer. Acho que isso é o mais significativo, o mais importante”, vincou André Silva.

André Silva tem dúvidas do empenhamento ambiental do PS e critica Costa sobre Amazónia

O porta-voz do PAN, André Silva, expressa “sérias dúvidas” quanto ao comprometimento do PS com a descarbonização da economia e critica a posição do primeiro-ministro sobre a Amazónia, considerando “desolador” que tenha agido ao arrepio dos principais líderes europeus.

O deputado único do PAN (Pessoas-Animais-Natureza) pede uma “posição firme relativamente a Bolsonaro”, considerando o Presidente do Brasil “uma pessoa absolutamente inconsciente e impreparada para estar no lugar onde está” e considerou “extremamente positivos” os sinais dados pela “maior parte dos líder europeus” a propósito da crise ambiental na Amazónia.

André Silva aponta, em contraste, o “sinal extremamente negativo” do primeiro-ministro e secretário-geral do PS sobre esta matéria: “Um sinal eu diria até, um pouco desolador, por parte de António Costa, que vem, uma vez mais privilegiar a extração de recursos, o crescimento económico em detrimento daquilo que é um ecossistema absolutamente importantíssimo e fundamental”.

Para o porta-voz do PAN, no momento em que “os principais líderes eleitos democraticamente na Europa” assumem “uma posição mais assertiva relativamente ao Brasil”, o primeiro ministro português assume “o discurso de sempre de que, atenção, é preciso privilegiar e ter atenção à economia, e às relações económicas e não ter uma política de isolamento relativamente ao Brasil”.

“Isto é a continuação da mesma conversa, da mesma narrativa, de colocar os interesses económicos acima dos interesses ambientais de uma região que não é do Brasil, é uma região que é do planeta”, sublinha.

António Costa defendeu na semana passada que o Brasil precisa de solidariedade e não se sanções, argumentando que não deve ser confundido o drama que se vive na Amazónia com o acordo com o Mercosul, que considerou “muito importante para a economia portuguesa e não deve ser utilizado pelos países que sempre se opuseram à sua assinatura”, como a França.

As dúvidas do PAN face o comprometimento dos socialistas com o ambiente são mais vastas: “Querem aumentar o tráfego aéreo no nosso país, com a construção de um novo aeroporto para reforçar a Portela, num sítio de reserva natural, onde passam cerca de três milhões de aves por ano. Não há uma única palavra sobre agricultura biológica no programa do Partido Socialista, com a continuidade das políticas agrícolas de expansionistas relativamente à agricultura intensiva. Estamos a transformar e a destruir o nosso o Alentejo, num olival intensivo. Não há regras para estufas na Costa Vicentina. O Partido Socialista quer explorar hidrocarbonetos ao largo da nossa costa, quer fazer mineração profunda nos oceanos. Falando de turismo, quer aumentar o número de navios de cruzeiro nos portos de Lisboa, e nos principais portos, quando os navios de cruzeiros que passam ao largo da costa portuguesa emitem oitenta e seis vezes mais emissões de gases de efeito estufa do que todos os transportes do nosso país”.

“Por isso eu digo que tenho sérias dúvidas relativamente a estas intenções que não passam de intenções. Por um lado, dizem querer descarbonizar a economia, mas, por outro lado, as ações e as opções para a economia são sempre no suposto desenvolvimento económico com base naquele mito, naquela ilusão matemática, em que nos fazem viver do crescimento ilimitado”, sustenta.

Alargando a crítica a todo o espetro político, André Silva considera que desde a entrada do PAN no parlamento há mais atenção dos partidos aos temas ambientais, falando mesmo de uma “revolução de consciências” iniciada por aquele partido, mas volta a desconfiar das consequências práticas das intenções expressas.

“Há uma narrativa que está completamente dissonante das práticas e da economia real”, aponta.

“Quando vemos constantemente as imagens de televisão dos partidos em campanha, aquilo que se vê em cima da mesa são copos plásticos, garrafas de plástico e carne dentro do prato”, ilustra.

Em contrapartida, o PAN promete uma “campanha de baixo carbono”, apesar do esforço visitar todos os distritos, com os candidatos a deslocar-se de transportes públicos e num carro híbrido.

“Não é possível em Portugal, ainda, conseguirmos fazer a deslocação através de um automóvel elétrico causa dos postos de carregamento em determinados locais. Fizemos esse estudo, não é possível”, sustenta.

O porta-voz disse também que não será aumentada a rede de cartazes nas ruas, e não serão produzidos “quaisquer tipo de brindes”.

Os candidatos vão distribuir ‘flyers’, mas feitos de papel reciclado e tintas ecológicas, e as refeições não vão incluir “nenhum produto de origem animal” porque “a produção animal tem impactos enormes ao nível ambiental”.

A campanha vai incluir momentos de perguntas que a população queira colocar, e às quais o PAN dará resposta, e os candidatos vão realizar “algumas visitas” que o partido entenda importantes.

“Faremos também ações de limpeza em todo o país para compensar a nossa pegada ecológica e a pegada ecológica também dos outros partidos”, adiantou André Silva.

PAN vai abrir congressos aos jornalistas

O porta-voz do PAN atribui a “alguma ingenuidade” do partido na relação com a comunicação social a decisão de realizar os trabalhos do último congresso do partido à porta fechada e garante que passarão a ser abertos.

André Silva referiu-se ao último congresso do partido, que aconteceu no final de março, e no qual os trabalhos decorreram à porta fechada e a comunicação social foi convocada apenas para o encerramento.

O porta-voz do PAN começou por lembrar que em 2017, quando o partido já tinha representação na Assembleia da República, os jornalistas foram convidados “a estar presente mas nenhum órgão de comunicação social compareceu”.

“Quando convidámos para estar presente, não aparecem, quando convidamos para aparecer no final, acusam-nos de ser um partido fechado”, apontou, salientou que “não há, nem nunca houve, rigorosamente nada a esconder”.

Por isso, “a partir de agora todos os congressos serão à porta aberta, com a presença da comunicação social”, anunciou o porta-voz.

“Trata-se também de uma relação com a comunicação social que durante estes anos aprendemos a fazer”, afirmou o também cabeça de lista pelo círculo de Lisboa, admitindo “alguma ingenuidade” e uma aprendizagem que ainda decorre.

“Há toda uma aprendizagem em vários níveis, nomeadamente no relacionamento com a comunicação social”, acrescentou, notando que os fundadores do partido vieram “da sociedade civil” e não tinham “experiência político-partidária”.

Sobre aqueles que acusam o partido de se focar apenas nas questões ambientais e do bem-estar animal, deixando as pessoas para segundo plano, André Silva recusou as acusações e salientou que é uma “crítica injusta, infundada e algumas vezes propositadamente deturpada”.

O PAN foi “muito mais além do que o campo ambiental e o campo da proteção dos animais” na última legislatura e, com apenas um deputado, o saldo do trabalho desenvolvido e da abrangência das medidas propostas “é extremamente positivo”.

Em entrevista à Lusa, o porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza salientou também que a eventual ligação da dirigente e cabeça de lista por Setúbal, Cristina Rodrigues, ao grupo Intervenção e Resgate (IRA) “nunca foi investigada”.

No final do ano passado uma reportagem da TVI dava conta de que Cristina Rodrigues, membro da Comissão Política Nacional, estaria ligada ao IRA, mas o partido rejeitou ter “qualquer ligação ou relação com esta entidade que seja diferente de todas as outras”.

“Aquilo que foi veiculado nessa altura não corresponde à verdade”, reforçou o porta-voz, vincando que “não há qualquer envolvimento com nenhuma associação que opere de forma ilegal” e “não houve nenhuma investigação de nenhum órgão de polícia criminal à Cristina Rodrigues”.

Ainda assim, este episódio “teve consequências reputacionais para o PAN”, admitiu.

No que toca ao seu futuro à frente do PAN, André Silva considerou natural que, “tendo assumido iniciar este projeto, que o tenha que acompanhar e queira estar envolvido durante mais algum tempo”.

“Seria imprudente que o fizesse de outra forma”, apontou, descartando um limite temporal para passar a pasta a outro.

* Ana Clotilde Correia e Francisca Matos (texto), Miguel A. Lopes (fotos)