O cachorro chegou esta semana à capital angolana, pela mão de Rui Elvas, presidente daquela associação, ele próprio instrutor de Lia, e já se adaptou à nova família em Luanda, depois de uma longa viagem desde Portugal.
"Está a correr muito bem, a criança está já a interagir com o cão. Estamos muito satisfeitos com a evolução da Lia", começa por adiantar Rui Elvas, em conversa com a Lusa, em Luanda.
Especificamente para o autismo, a Associação Portuguesa de Cães de Assistência (APCA) já conta com dois cães certificados em Portugal e tem mais 12 em treino. No estrangeiro já entregou três, distribuídos pela Dinamarca, Alemanha e Luxemburgo, aos quais se junta a Lia, em Angola, ainda em treino, até à certificação final, dentro de um ano e meio.
"O que nós procuramos neste caso é um cão tranquilo, com uma boa ligação familiar, com uma boa interação com crianças. No fundo é aquilo que se pretende que o cão que vai fazer esta função tenha como caraterísticas: acima de tudo uma grande tranquilidade e uma grande interação com as crianças", diz Rui Elvas.
A escolha da raça, um cão de água português, não é por acaso, e explica-se, desde logo, pela esperança média de vida, que chega aos 15 anos, trabalhando "com a capacidade total" durante esse período. Além disso, sublinha o instrutor, o tipo de pelo é também uma vantagem, no contacto com as crianças.
"Estes cães têm cabelo, não têm propriamente pelo, as crianças não sentem aquele sintoma normal de alergia. Mas são cães muito mais calmos e amadurecem muito mais depressa", aponta.
O autismo é um distúrbio neurológico caraterizado por comprometimento da interação social, comunicação verbal e não-verbal e comportamento restrito e repetitivo. Caraterísticas que levam muitos pais, como revelou anteriormente a Associação Angolana de Apoio a Pessoa Autista e Portadora de Transtornos Globais de Desenvolvimento (APEGADA), a manter as crianças amarradas, em casa, com o receio que se percam.
"A criança portadora de autismo tem sempre uma dificuldade muito grande de conexão, em interagir com o meio que a rodeia. Obviamente que um cão destes permite que a criança se foque nele, ao invés de se focar no ambiente à sua volta. Isso faz com que depois, no fundo, tenha alguma tranquilidade transmitida pelo próprio animal, que a acompanha permanentemente em todos os locais, e lhe dá essa segurança acrescida", explica ainda o instrutor português.
Este projeto da APCA, segundo Rui Elvas, é pioneiro em África, mas os custos, de 5.000 euros por animal, acrescido do transporte, superior a 2.000 euros, dificultam o alargamento deste tipo de terapia.
"Não há conhecimento de nenhum outro cão em África, em Angola. Podemos imaginar que será o primeiro de muitos, porque infelizmente percebemos que existem muitas crianças com esta patologia e que não há nenhum tipo de resposta, sem ser esta que estamos a dar", enfatiza.
A associação estuda, com parceiros locais, deslocalizar para Angola uma parte da atividade de criação e treino destes animais, baixando os custos e facilitando a disponibilização deste tipo de apoio.
"Há já uma ideia de desenvolvermos um projeto para criar estes animais em Angola, para que seja um processo mais rápido, fará todo o sentido, a médio e curto prazo (…) Não é qualquer pessoa que pode ter um cão destes, mas vamos arranjar maneira de, com patrocínios e colaboração com outras entidades, tornar este processo mais acessível e a mais pessoas", garante o presidente da APCA.
A ideia é ter um "projeto sustentável", com treinadores a trabalhar em Angola.
Já Rui Elvas regressa esta semana a Portugal, com a esperança que Lia faça a diferença na vida desta criança angolana: "Neste momento já está a fazê-lo, de uma forma instintiva ainda, não é por treino. Mas o objetivo é melhor substancialmente a sua qualidade vida e a forma como se relaciona com o mundo que a rodeia", remata.
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