Vários bairros, distritos e municípios de Luanda enfrentam a escassez de água potável e a alternativa, para muitos, tem sido percorrer longas distâncias com recipientes à cabeça em busca da água para a sua higienização ou confeção de alimentos.
Pela capital angolana, tem sido visível pelas ruas, adultos e crianças que “driblam” a distância e o distanciamento imposto pela covid-19 para conseguir o líquido para as suas residências, o que muitas vezes só conseguem através de “intensa discussão”.
Dezenas de moradoras do bairro São João, distrito urbano do Hoji-ya-Henda, município do Cazenga, um dos mais populosos de Luanda, acorrem a uma fonte, originada por uma tubagem por eles destruída para conseguir a água.
No meio de disputas e acesas discussões e mesmo expostos ao perigo de atropelamento, por a tubagem estar à berma da estrada Porto Santo, mulheres, homens e crianças dali não arredam pé até conseguirem a água para satisfazer as suas necessidades.
“Estamos há muitos anos sem água aqui no bairro, sou residente do bairro, cresci aqui e é complicado. Esta confusão vem porque não há colaboração”, contou à Lusa Ana Adriano, 40 anos.
A moradora do bairro São João lamenta a falta de água na circunscrição, que dura há semanas, e assumiu que os moradores “decidiram destruir a tubagem principal”, escavada a dois metros de profundidade, onde “brigam” pela posse de água.
“Não foi bem destruída, apenas vimos a água a subir e então como estamos a sofrer sem água todos nós invadimos e daqui estamos a tirar proveito, nem sempre sai água, porque daqui podemos esperar mais três ou quatro dias”, lamentou.
Ana Adriano, sabe das limitações e recomendações impostas pela covid-19, como a lavagem regular das mãos, admitindo ser “difícil o cumprimento das orientações das autoridades sanitárias com a constante falta de água”.
Populares naquele bairro do Cazenga socorrem-se igualmente da água abastecida por camiões cisternas, sendo que em período de escassez, podem gastar diariamente mais de 1.000 kwanzas (1,3 euros).
“Daí que pedimos ao Governo que coloque água cá no nosso bairro, porque está mesmo muito complicado”, atirou.
As dificuldades de acesso à água também foram descritas por Domigas Dala, 50 anos, que considera a situação como “penosa”, afirmando que o recurso tem sido muitas vezes a água da cacimba, sobretudo para a higiene da casa.
Queixou-se também de cobranças arbitrárias de até 300 kwanzas (0,3 euros) para ter acesso à fonte, exortando as autoridades a “terminarem com o sofrimento” que os habitantes enfrentam “semanas após semanas”.
A aglomeração de pessoas naquela fonte de água, traduzida em “palco de luta pela sobrevivência”, foi reprovada por Joaquim Manuel ‘Quim’, morador daquele bairro, temendo pela propagação da covid-19.
‘Quim’, como é conhecido na zona, recordou que há anos uma equipa de técnicos chineses instalou torneiras a nível dos quintais, mas estas “continuam inoperantes”, situação que concorreu para que os populares, “cansados de esperar, destruíssem a tubagem principal”.
“Então, é por meio dessa fonte que aproveitamos um bocadinho de água, a confusão neste buraco não acaba e quando estiver a sair água cada um faz o que bem entender”, disse à Lusa.
As dificuldades de acesso à água potável também são vividas pelos moradores do bairro da Estrada Nova, também no município do Cazenga, cujo cenário é marcado pelo movimento ininterrupto de pessoas.
Nem mesmo a covid-19 inibe pais ou encarregados de educação de mandarem os filhos à rua a procura de água e os poucos locais onde jorra o líquido é marcado por enchentes de pessoas e de dezenas de recipientes.
A nível dos nove municípios da capital angolana, com perto de oito milhões de habitantes, surgem relatos de falta de água que dura há semanas.
Segundo a imprensa angolana, a Empresa Pública de Águas de Luanda (EPAL) investiu 250 milhões de dólares (cerca de 210 milhões de euros), em 2012, para a implementação do “Projeto das 700.000 Ligações” visando aumentar a distribuição de água na capital angolana.
Para aumentar a cobertura dos serviços de água nas cidades angolanas, o Banco Mundial (BM) está a financiar com 200 milhões de dólares (167 milhões de euros) um segundo projeto que teve início em 2017 e com término previsto para 2023.
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