A guerra “tornou-se não apenas uma tragédia para os sírios, mas uma grande ameaça para a estabilidade da região e uma ameaça à segurança de toda a gente, em todo o lado”, disse ao canal francês, no sábado à noite. “É do interesse de todos que nos juntemos para pôr fim a esta guerra”, acrescentou.
Guterres, que substitui Ban Ki-moon em janeiro, disse estar ciente dos desafios que as Nações Unidas enfrentam nesta matéria, mas sublinhou que não se vai a tornar “o líder do mundo” e que o cargo que vai assumir requer uma abordagem “humilde”.
O secretário-geral da ONU, disse, “deve trabalhar como um congregador, um facilitador, um mediador, um construtor de pontes, um intermediário honesto e tentar unir as pessoas”, disse à France24.
Alertando para a “multiplicação de novos conflitos” com “ligações ao terrorismo global”, o antigo primeiro-ministro português disse que o seu desejo é promover uma “onda de diplomacia para a paz”.
A prevenção de guerras foi, aliás, em termos gerais, o motivo que apresentou como motivador da sua candidatura ao cargo. O trabalho como Alto-comissário para os Refugiados foi “fantástico”, mas causou-lhe “enorme frustração” já que “muito mais importante que proteger refugiados é evitar vagas de refugiados, é garantir que a prevenção prevalece”.
“Isto, claro, requer uma dimensão política e como Alto-comissário para os Refugiados eu tinha de ser estritamente não político. Foi aí que senti que tinha a obrigação de pôr todas as experiências que tive na vida ao serviço daqueles que tentam evitar os trágicos níveis de sofrimento que estamos a verificar no mundo de hoje”, explicou.
Questionado sobre a candidatura de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, Guterres preferiu não comentar o caso em concreto, mas alertou para o perigo do “populismo político, que joga com o medo, com a insegurança das pessoas, que tenta criar uma rejeição de tudo o que é diferente, do estrangeiro, do refugiado, do migrante”.
Guterres sublinhou a importância de combater esta “tendência muito perigosa” em todo mundo, frisando que o seu mandato será fortemente centrado nessa “batalha por valores”.
“Acredito que combater a xenofobia, o populismo, promover a ideia de que a diversidade é uma riqueza e não uma ameaça, entender que todas as sociedades vão ser inevitavelmente multiétnicas, multirreligiosas, multiculturais, requer um enorme investimento. Este é o tipo de batalha ideológica que uma organização como a ONU tem de liderar. Esta batalha por valores vai ser central no meu mandato”, afirmou.
Sobre as expectativas criadas em torno da possibilidade de uma mulher assumir a liderança da ONU, o português disse reconhecer “totalmente o valor simbólico” desse cenário e comprometeu-se a, durante o seu mandato, promover os direitos das mulheres no mundo.
“Não há nada que possa fazer em relação a isso, não sou mulher, sou um homem. O que eu posso fazer, como secretário-geral, é assumir um forte compromisso (…) Em primeiro lugar, garantir que a proteção e empoderamento das mulheres e meninas é uma prioridade nas áreas de ação da ONU, em diferentes conflitos no mundo, e em segundo lugar ter um programa claro para atingir paridade na estrutura da ONU”, afirmou.
Em relação a escândalos em que a organização se viu envolvida, nomeadamente em que membros de missões de paz se envolveram em crimes, o socialista sublinhou que o seu “maior interesse é garantir que a ONU tem o mais elevado grau de integridade em tudo o que faz”, propondo a criação de “mecanismos eficazes de responsabilização” através de “formas independentes de avaliação” que sejam públicas.
“É essencial que [aqueles que estão a manter a paz] não se tornem violadores de direitos humanos”, frisou.
Guterres foi ainda questionado sobre a sua fé e posição em questões como o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Sobre religião, o antigo primeiro-ministro português não se alongou, dizendo apenas que “em todas as religiões há um forte compromisso com a solidariedade” e que “a ONU precisa” desse forte compromisso.
Quanto à segunda questão, Guterres respondeu que “o mundo evoluiu muito” e é necessário uma “abordagem aberta e tolerante a estes desenvolvimentos”.
“A minha intenção, nas áreas onde a ONU pode ser chamada a intervir, é garantir que temos uma abordagem aos direitos humanos completa e progressista”, concluiu.
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