A “Marcha pela Escola Pública”, convocada pelo Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (STOP), encerra duas semanas de greve por tempo indeterminado, iniciado em 09 de dezembro e deverá prolongar-se, pelo menos, até ao final de janeiro.
Enquanto isso, o STOP e o Ministério da Educação parecem ter duas versões da mesma história e o ministro João Costa viu-se obrigado a fazer vários esclarecimentos em resposta àquilo que descreveu como uma "estratégia de desinformação e uma campanha de manipulação da opinião dos professores", chegando mesmo acusar o coordenador nacional, André Pestana, de mentir, mas não tem convencido os docentes, que exigem propostas concretas.
Para perceber aquilo que levou os professores a várias semanas de greve e que os vai fazer sair à rua no sábado, eis algumas perguntas e respostas sobre as suas reivindicações:
Quais têm sido as formas de contestação dos professores e com que impacto?
Além das manifestações, estão a decorrer, atualmente, diferentes greves, em simultâneo, convocadas por três organizações sindicais: uma greve ao sobretrabalho e às horas extraordinárias da Federação Nacional de Professores (Fenprof), uma greve por tempo indeterminado, desde 09 de dezembro, do STOP e uma greve parcial do Sindicato Independente dos Professores e Educadores (SIPE).
O STOP foi o primeiro a partir para a greve, anunciada ainda em novembro.
Alguns dias depois, oito organizações sindicais, incluindo a Fenprof e o SIPE, anunciaram uma manifestação, inicialmente marcada para março, e, na altura, consideraram que não era o momento adequado para uma greve, que acabaram por convocar após a primeira semana de greve do STOP.
Apesar de não existir uma contabilização objetiva da adesão dos docentes, as paralisações têm implicado o encerramento pontual de escolas em todo o país, ainda que, por vezes, apenas ao primeiro tempo de aulas, reabrindo depois.
Na terça-feira, a Confederação Nacional das Associações de Pais manifestou-se preocupada com os impactos da greve e defendeu que fossem decretados serviços mínimos, de forma a assegurar que as crianças e jovens possam permanecer na escola, pedindo também que os encarregados de educação de alunos até aos 12 anos tenham faltas justificadas ao trabalho sempre que a escola esteja fechada.
O que está a ser negociado entre o Ministério e os sindicatos?
O Ministério da Educação iniciou, em setembro, um processo negocial com as organizações sindicais do setor para discutir a revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente.
Na segunda reunião negocial, em 08 de novembro, a tutela apresentou um conjunto de propostas, algumas das quais mereceram forte contestação por parte dos sindicatos, e remeteu para o mês de janeiro a reunião seguinte, justificando que, até lá, o Governo iria fazer o levantamento das necessidades do sistema educativo para desenhar propostas concretas.
Na altura, os sindicatos não criticaram o adiamento, mas têm pressionado a tutela para agendar o novo encontro rapidamente, acusando o Ministério de ter suspendido a negociação. A terceira ronda foi, entretanto, marcada esta segunda-feira, para os dias 18 e 20 de janeiro.
O Ministério da Educação vai passar a contratação de docentes para entidades locais?
A ideia de que a contratação de professores poderia passar para entidades locais surgiu após a segunda reunião negocial, em que o Ministério da Educação propôs a substituição dos atuais quadros de zona pedagógica por mapas docentes interconcelhios, que corresponderiam às 23 comunidades intermunicipais, bem como a criação de conselhos locais de diretores.
Perante a contestação imediata dos sindicatos, o Governo esclareceu que esses órgãos decidiriam apenas sobre a alocação às escolas dos docentes que já estivessem integrados em cada mapa interconcelhio, e não sobre a sua contratação.
Mais tarde, o coordenador nacional do STOP, André Pestana, alegou que uma resolução do Conselho de Ministros publicada entretanto, no âmbito da descentralização, transferia para as comissões de coordenação e desenvolvimento regional competências de contratação.
O ministro da Educação também desmentiu essa informação e explicou que nenhuma das competências transferidas, que pertenciam à Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares está relacionada com o recrutamento de professores, assegurando que um modelo desse tipo nunca "estará em cima da mesa".
Apesar dos esclarecimentos do governante, o dirigente do STOP continuou a afirmar que as propostas do Ministério vão no sentido da municipalização da contratação de professores, levando o próprio primeiro-ministro a comentar o tema, afirmando ser “absolutamente falso” que os municípios vão passar a contratar professores.
A graduação profissional vai deixar de ser o único critério dos concursos?
Atualmente, a contratação de professores, bem como os concursos para a vinculação ou mobilidade, obedecem a um único critério: a graduação profissional, que resulta da soma do tempo de serviço à classificação final obtida no curso.
Apesar de os sindicatos reconhecerem que há falhas no atual modelo, a graduação profissional é, para os professores, intocável. Por isso, quando o ministro da Educação sugeriu, em entrevista à Lusa no início do ano letivo, que os diretores escolares pudessem selecionar 30% dos seus professores tendo em conta o seu perfil e os projetos escolares, as reações negativas foram imediatas.
A ideia ainda foi partilhada com as organizações sindicais na primeira reunião negocial, mas o Ministério não chegou a concretizar uma proposta e na semana passada anunciou que deixaria cair essa possibilidade perante a contestação dos docentes.
Da parte dos professores, os sindicatos consideram que a graduação profissional é o único critério objetivo que permite evitar ultrapassagens, mas o ministro João Costa também já disse que não tenciona alterar os critérios da contratação e da vinculação.
Que tempo de serviço é que os professores exigem recuperar?
A carreira dos professores esteve congelada em dois períodos entre 2005 e 2017 durante nove anos, quatro meses e dois dias. Em 2019, o Governo aceitou recuperar algum desse tempo, mas apenas quase três anos.
Na altura, as reivindicações dos sindicatos não vingaram no resultado das negociações e, por isso, a recuperação total do tempo de serviço continuou a ser uma das principais exigências dos docentes, incluindo nas greves em curso e manifestações recentes.
Sobre este tema, João Costa disse à Lusa, em setembro, que era escusado “empatar tempo” com negociações sobre recuperação do tempo de serviço congelado, assegurando apenas que não haveria mais congelamentos.
Por que motivo os sindicatos contestam as vagas de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira?
O fim das vagas de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente é outra das reivindicações antigas dos professores, isto porque, independentemente de cumprirem os restantes critérios, para subir a esses escalões é preciso que abram vagas.
Uma vez que há sempre mais candidatos do que lugares disponíveis, muitos professores acabam por não conseguir a progressão na carreira, uma situação que, por vezes, se repete ao longo de vários anos.
No final de novembro, o Governo propôs a possibilidade de dispensar os docentes doutorados do requisito de obtenção de vaga, mas essa exceção foi rejeitada pelos sindicatos, que exigem o fim das vagas de acesso para todos, e, por isso, o ministro admitiu que iria repensar a medida.
Que outras reivindicações motivam os protestos dos professores?
Além do tempo de serviço e das vagas de acesso a dois escalões da carreira, os professores têm outras bandeiras antigas que têm levado, sucessivamente, para as suas ações de protesto ao longo dos últimos anos, como a eliminação da precariedade, a criação de um regime especial de aposentação, e soluções para o excesso de burocracia.
Recentemente, têm exigido também aumentos salariais, de forma a compensar os impactos da inflação.
Comentários