O relógio batia as 22:15 quando o vice-almirante entrou pela porta principal do Pavilhão Multiusos de Odivelas, onde estão a ser vacinados jovens de 16 e 17 anos contra a covid-19, por entre protestos do movimento anti-vacinação, cujas palavras de ordem eram bem audíveis mesmo com as portas fechadas.

Questionado pelos jornalistas sobre o que é que os manifestantes lhe tinham dito quando entrou, o vice-almirante afirmou: "Olhe, o que estão a dizer agora, genocídio e assassínio, chamam-me assassino, o que quer que eu lhe diga?".

O responsável da 'task-force' salientou que a "única coisa" que tinha a dizer aos manifestantes era que "o obscurantismo no século XXI continua, há ondas de obscurantismo".

É claro, disse, que as pessoas "têm direito às suas opiniões", mas "não têm é o direito a impor a sua opinião aos outros".

E, quando essa "opinião é imposta já de forma violenta, deixa de ser democracia, portanto têm direito à sua opinião, têm direito a falar uns com os outros, não têm direito a empurrar, não têm direito a condicionar as pessoas e, por isso, é que eu entrei ali pela porta principal", sublinhou.

Os manifestantes anti-vacinação tinham começado a reunir-se em frente à porta principal do Centro de Vacinação de Odivelas cerca das 21:00. Alguns mascarados com fatos brancos e outros sem máscara e sem cumprirem o distanciamento social, exibiam uma longa faixa que dizia: "As crianças não são cobaias".

À chegada, o vice-almirante Gouveia e Melo disse que tinham sido vacinados "até agora" - cerca das 22:00 de sábado - "mais de 102 mil jovens", o que considerou ser um "balanço muito positivo".

Para domingo, "apelo aos jovens para voltar a comparecer ao processo de vacinação porque a vacina é o elemento mais seguro para passarmos esta fase pandémica", disse.

O responsável da 'task-force' visitou o Centro de Vacinação e falou com alguns jovens.

Já na área de recobro, confessou que ver jovens a furar a manifestação "para se virem vacinar" era "dos momentos mais inspiradores" que tinha neste processo de vacinação.

"Ter conversado com jovens que disseram: 'aqueles senhores andaram a encher-me a cabeça e eu passei pela fila e vim vacinar-me' enche-me o peito de esperança porque o nosso povo, afinal de contas, tem muito mais sabedoria do que a gente possa pensar", enfatizou o vice-almirante, enquanto passava "Simply the best" [simplesmente o melhor] de Tina Turner, uma escolha do DJ Jigar Govinde.

Quando Gouveia e Melo foi cumprimentar o DJ, este afirmou: "Esta música é dedicada a si", arrancado sorrisos ao vice-almirante.

Agradecendo o gesto, o responsável da 'task-force' ripostou: "Dedique esta música não a mim, mas a todo este grupo que anda aqui a vacinar-se".

À saída, o vice-almirante saiu por onde entrou, pela porta principal, por entre gritos de manifestantes a chamarem-no de assassino repetidamente, ladeado pela Polícia de Segurança Pública (PSP).

Ainda antes da chegada do vice-almirante, uma das organizadoras do protesto, Ana Desirat, bancária de profissão e politóloga de formação, explicou à Lusa a razão da sua presença no local.

Ana Desirat teceu críticas à comunicação social, à semelhança do que outros elementos presentes já tinham feito, apontando que esta "não tem sido transparente com esta situação toda que se está a passar".

Os mortos devido à covid-19 "que têm sido apregoados", disse, não são os verdadeiros, mas "meramente especulativos".

"Houve um grupo de cidadãos que exigiu uma série de respostas" ao Ministério da Saúde e à Direção-Geral de Saúde, ao qual não foi dada resposta e foi "necessário intervir em termos de tribunal para que" tivessem sido obtidas respostas, relatou.

Questionada porque estavam no Centro de Vacinação de Odivelas, explicou a presença porque a autarquia "vergonhosamente fez uma coisa que se chama crime de coação sobre a juventude" do concelho, que passa pelo facto de ter sido publicado nas redes sociais um 'post' em que dizia: "Venham tomar um 'shot'".

Este 'shot', salientou, "é uma injeção carregada de grafeno que é utilizado só em doenças muito graves e terminais", o que na sua opinião é errado e induz os jovens em erro, criticando ainda o recurso ao DJ.

"Vamos ficar aqui a protestar até que seja necessário, nem que seja até à uma da manhã", assegurou Ana Desirat.

"Hoje de manhã fizemos uma ação na Cidade Universitária em que, por acaso, conseguimos que pelo menos seis jovens tenham arrepiado caminho" e não tenham tomado a vacina, contou.

Questionada sobre se já tinham convencido algum jovem em Odivelas a não vacinar-se, cerca das 21:30, a resposta foi perentória: "Aqui não porque chegámos agora, mas temos esperança de conseguir convencer alguém".

Até cerca das 22:00 de sábado tinham sido vacinadas, na totalidade do Agrupamento de Centros de Saúde de Loures e Odivelas, "cerca de 3.000 pessoas", afirmou o diretor executivo, António Alexandre.

Já no que respeita a Odivelas, os números andavam "por volta dos 1.600".

Durante o tempo que a Lusa esteve no Centro de Vacinação, a afluência não era muita.

"Tivemos uma quebra, a partir das 18:00, penso que provavelmente por causa dos jogos de futebol" que estavam a decorrer, considerou o diretor executivo do Agrupamento de Centros de Saúde de Loures e Odivelas.

"Penso que isso poderá ter tido alguma influência, mas estamos à espera, já começámos a ter algum movimento, estamos expectantes que isto possa recuperar até à 01:00", afirmou.

A Casa Aberta, para vacinação sem marcação, começou às 22:00.

"O balanço é sempre positivo, estamos a entrar naquela fase que é luta homem a homem, nesta altura todas as vacinas contam como em qualquer processo democrático em que todos os votos contam, nesta altura todas as vacinas contam", rematou António Alexandre.

"Naturalmente que a nossa expectativa era vacinar quatro mil, cinco mil pessoas, se não chegarmos a isso, depois amanhã [domingo] também é dia", concluiu.