O poema de “Grândola, Vila Morena” foi escrito por José Afonso, em maio de 1964, depois de um espetáculo que encheu o salão da Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense (SMFOG), sob olhar atento da Polícia de Segurança Pública.

“Foi uma noite histórica. Tínhamos a polícia à porta”, o que era normal “quando era a altura dos espetáculos”, lembrou à agência Lusa Pedro Costa, ex-presidente da sociedade musical.

O antigo dirigente recorda que, nessa noite, José Afonso teve direito a “casa cheia” e que o poema, enviado dias depois da atuação, foi visto como “um elogio, dedicado à coletividade e às gentes de Grândola”.

“Depois é que a gente foi copiar os poemas e cantava-se [por] aí, não com este cante [atual], mas com o tipo de canção alentejana”, explicou Pedro Costa.

A canção foi incluída no álbum “Cantigas do Maio”, gravado em 1971, com arranjos e direção musical de José Mário Branco, e foi cantada pela primeira vez em público, em Santiago de Compostela, em 10 de maio de 1972, faz agora 50 anos.

“Foi com muito orgulho e com muita satisfação das pessoas de Grândola, da direção [da SMFOG], dos músicos, que José Afonso aqui esteve e que também cantou e se encantou pelo espírito e por toda a vivência que encontrou na sociedade e também em Grândola, onde foi muito bem recebido”, sublinhou Luís Vital, atual presidente da coletividade, conhecida como “Música Velha”.

O orgulho da população reflete-se nas múltiplas homenagens ao cantor de intervenção, como o memorial da revolução, à entrada da vila alentejana, onde estão impressas as notas musicais da canção, que se tornou no hino da liberdade.

“Não somos nada sem a nossa história e, portanto, temos o maior orgulho que, na altura, a direção tenha convidado José Afonso para cá vir tocar” e que o cantautor “se tenha inspirado para escrever o ‘Grândola’, naquela versão original”, reforçou Luís Vital.

Do poema original “cai uma estrofe”, com a referência “capital da cortesia” e, com o passar dos tempos, serão várias as versões até à canção final, gravada, em 1971, em França, explicou José Miguel Abreu, representante da Câmara de Grândola no Observatório da Canção de Protesto (OCP).

“O poema atravessa várias versões. Fica só com duas estrofes, depois, é acoplada a última estrofe e José Mário Branco sugere a José Afonso que transformem as estrofes finais em seis. E essa é a versão da canção”, realçou.

É no futuro Observatório da Canção de Protesto, cuja sede vai ficar instalada no antigo edifício da Câmara de Grândola, que vão estar reunidos vários testemunhos relacionados com a música de José Afonso.

Entre eles, uma “narrativa” que aponta para o regresso do artista à vila alentejana, em 15 de abril de 1972, onde terá cantado o “Grândola, Vila Morena”, semanas antes da atuação em Santiago de Compostela.

“Esse espetáculo é em 10 de maio de 1972 na Faculdade de Ciências Económicas de Santiago de Compostela. Porém, José Afonso regressa à SMFOG, em 15 de abril de 1972, para participar na inauguração de uma exposição dedicada a Alves Redol”, realçou.

Na sessão, José Afonso, “segundo António Mota Redol, que é um dos organizadores, terá cantado a canção e é verosímil que assim seja, porque, sendo dedicada à coletividade e vindo José Afonso a Grândola já com a canção fonograficamente registada, é verosímil que a tenha cantado".

Para o responsável, a canção tem “muito valor” para Grândola, assim como para “todos os movimentos de contestação”. Além de ser “uma das canções com mais versões gravadas em todo o mundo” e da sua “importância fonográfica”, é “utilizada noutros meios espontâneos”.

“Não há manifestação que se faça em Portugal onde não se oiça a ‘Grândola’, ou seja, é um pouco a voz dos desfavorecidos, dos oprimidos, dos silenciados. Acaba por ter este desempenho e, é por isso, que há um Observatório da Canção de Protesto”, concluiu.

O OCP resulta da parceria entre o município de Grândola, entidade promotora, a Associação José Afonso, a SMFOG, e os institutos da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa - Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical, Instituto de Etnomusicologia - Centro de Estudos em Música e Dança e Instituto de História Contemporânea.

Os seus objetivos são o estudo, a salvaguarda e a divulgação do património musical tangível e intangível da canção de protesto produzido durante os séculos XX e XXI, através da realização de iniciativas culturais diversas.

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